Conheça o monstro gigante do mar que pode sobreviver quando cortado ao meio

07/03/2014 às 07:313 min de leitura

Um famoso cartão postal norte-americano com a foto acima conta a história de como um grupo de soldados estadunidenses, durante uma missão no rio Mekong, no país Laos, capturaram em 1973 a lendária “Rainha dos Naga”, uma serpente mitológica que agia como guardiã das águas da região. A realidade, no entanto, é bem menos fabulosa – embora não seja menos interessante.

De tudo que é descrito no cartão, que até hoje circula em países do sudeste asiático, parece que a única verdade é que o grupo é de soldados americanos. A criatura de sete metros de comprimento fotografada não é uma serpente mítica, mas sim um peixe-remo gigante (ou regaleco, para os íntimos). Além disso, ele foi capturado em 1996, nas proximidades da cidade de San Diego, na Califórnia.

O animal também é conhecido como “rei dos arenques”, graças às lendas do folclore escandinavo, que dizem que cardumes dos pequenos peixes obedientemente seguiam seu colossal líder por aí. O fato é que a tendência do grande bicho de encalhar em praias e subir à superfície quando está doente ou ferido vem dando origens a lendas de serpentes marinhas por milhares de anos pelo mundo afora.

Fonte da imagem: Reprodução/Wired

Pronto para o carnaval

Uma das mais enigmáticas criaturas conhecidas do oceano, o peixe-remo pode chegar a até 8,5 metros de comprimento e, como um lagarto, é capaz de autoamputar 75% do seu corpo para reduzir de tamanho – o que poderia muito bem ser sinal de que não são só as humanas que gostam de diminuir para caber em um biquíni.

Além disso, ele conta com tiras luminosas parecidas com LEDs que não apenas brilham no escuro, mas grudam na sua mão se esfregadas – o que facilitaria a vida de muita gente na época do carnaval. As luzes são geradas graças a uma camada de moléculas de guanina, cujo brilho ajuda muitos peixes do mar a confundir e escapar de predadores.

Em um dos poucos relatos de observações do animal saudável em seu habitat natural, o biólogo marinho Mark Benfield gravou o vídeo abaixo. Nele, podemos ver como o bicho flutua verticalmente, ondulando suas barbatanas dorsais para cima e para baixo de maneira hipnótica, antes de passar a um nado horizontal em que usa seu corpo inteiro, como uma enguia.

De boa nas profundezas

Segundo Benfield, os regaleco costuma flutuar verticalmente virado para cima por conta de seus hábitos alimentares, baseados em uma dieta de krill (pequenos crustáceos que fazem parte do zooplâncton). “Se você está procurando por esses seres dentro do mar, então olhar direto para cima vai permitir que você os veja contra a luz da superfície”, explica.

Embora o peixe-remo seja comumente descrito como uma criatura de mares profundos, o pesquisador suspeita que ele não esteja limitado a esse ambiente. Embora o animal costume passar os dias em profundidades em tornos dos 450 metros submarinos, ele sobe mais para perto da superfície de noite, provavelmente perseguindo o krill, que tem esse tipo de hábito migratório.

Se você achou que o animal no vídeo de Benfield parece um tanto... Abreviado em comparação com o da foto dos soldados, basta levar em conta que o bicho gravado não somente é um espécime mais novo, mas também parece já ter cortado sua cauda fora. Essa automutilação, mais formalmente chamada autotomia e presente em alguns lagartos, não serve só para livrar o bicho de predadores, mas também deixa para trás um rabo balançante como distração.

Gosto de cruz-credo

Anatomicamente falando, o peixe-remo consiste de uma cabeça e um abdômen, onde ficam todas suas entranhas, seguidos por sua enorme cauda (se ela ainda estiver lá, claro). Quando com seu comprimento máximo, a criatura pode ter 416 raios de barbatanas dorsais. De acordo com o ictiólogo Tyson R. Roberts, o animal quase não tem predadores naturais, já que seus restos não atraem tubarões e partes da espécie nunca foram encontradas em seus estômagos.

Além disso, a carne gelatinosa e flácida do regaleco aparentemente tem um gosto horrível, existindo relatos de 1798 que afirmam que “nem os cachorros a comeriam, seja crua ou fervida”. Até mesmo as gaivotas, que provavelmente seriam capazes de comer seu tubo de filtro solar se tivessem a chance, parecem evitar os cadáveres do gigante marinho.

Com esses detalhes em mente, Roberts considera que o peixe-remo provavelmente não se livra do rabo para escapar de predadores, mas sim para aumentar sua aptidão e capacidade de sobrevivência de forma geral, soltando uma parte grande do corpo que se torna inútil com o crescimento. “Isso pode representar uma economia considerável de energia e alimentos que seriam necessários para manter a cauda”, diz o pesquisador.

Fonte da imagem: Reprodução/Wired

Reviravoltas

Mesmo com todos esses indícios, uma descoberta recente em um regaleco morto encontrado na Califórnia coloca a imunidade da criatura aos tubarões novamente em questão. Dentro do espécime de aproximadamente 5,5 metros, pesquisadores da University of California encontraram larvas de parasitas no intestino do animal, o que possivelmente o coloca dentro de uma cadeia alimentícia maior.

Essa espécie de verme em particular costuma passar seus estágios larvais dentro de peixes como o regaleco e espera que seu hospedeiro seja comido por um tubarão para poder então completar seu ciclo de amadurecimento. O fato do parasita estar presente no cadáver encontrado sugere, portanto, que existe sim a possibilidade dele virar comida dos predadores marinhos cheios de dentes.

Ainda assim, se o peixe-remo de fato estiver sob ameaça de tubarões no mar, então ele certamente é um animal um tanto quanto relaxado, já que não se assustou nem um pouco com a proximidade dos mergulhadores que o filmaram. Então talvez seja verdade que essa lenda viva realmente seja tão destemida quanto faziam crer os mitos dos marinheiros de outrora, uma serpente marinha sem medo de nada – exceto de ficar grande demais para o projeto verão.

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