Artes/cultura
10/04/2014 às 09:59•2 min de leitura
Você já deve ter ouvido muita gente reclamando que o futebol não é mais o mesmo, argumentando que os clubes se transformaram em organizações totalmente comerciais e que os jogadores já não “vestem” mais as camisas dos times, jogando para quem oferecer mais dinheiro. Esse pessoal não deixa de ter certa razão, e houve um tempo em que o esporte era levado muito a sério, servindo inclusive como ferramenta política.
Talvez um dos exemplos mais emblemáticos do que estamos falando seja a “Partida da Morte”, celebrada na Ucrânia no dia 9 de agosto de 1942. O jogo ocorreu no Estádio Zenit localizado em Kiev, cidade então ocupada pelos nazistas. Os times que se enfrentaram naquele dia eram formados por prisioneiros de guerra soviéticos de um lado e por seus captores alemães de outro.
Cidade de Kiev durante a Segunda Guerra Mundial Fonte da imagem: Reprodução/Wikipédia
A equipe dos prisioneiros, batizada de FC Start, era formada principalmente por jogadores do famoso clube soviético Dynamo — e de outros times também, como o Lokomotiv. Na época, depois de golear vários times de países dominados pelos alemães, o FC Start ganhou destaque e suas vitórias começaram a causar desconforto entre os nazistas, que proibiram a realização de novas partidas para evitar que fossem desmoralizados perante a população de Kiev.
Assim surgiu a proposta do duelo, e a real intenção da Partida da Morte era a de provar ao mundo a superioridade alemã. Um total estimado em 2,5 mil espectadores, entre soldados e habitantes locais, assistiram ao jogo, e o time dos prisioneiros venceu o dos nazistas por 5 a 1.
Pôster anunciando a "Partida da Morte" Fonte da imagem: Reprodução/Wikipédia
Após a derrota ainda ocorreu uma revanche, na qual o FC Start venceu novamente por 5 a 3, mesmo depois de — supostamente — os jogadores terem sido ameaçados de morte durante o intervalo para que deixassem os alemães vencer o jogo.
A história que circulou após os duelos foi a de que os ucranianos foram executados enquanto ainda vestiam os uniformes do time, o que os transformou em espécies de mártires do regime comunista. Assim, em vez de o jogo ter servido de propaganda para os nazistas, quem acabou tirando proveito da situação foram os soviéticos, que usaram a ocasião para enaltecer o comunismo.
Entretanto, depois da queda da União Soviética, uma nova versão foi revelada por testemunhas e familiares dos jogadores do FC Start. Segundo Valentyn Shcherbachov, um historiador que investigou o evento, algumas informações referentes à partida e ao destino dos atletas foram manipuladas, e a coisa toda não aconteceu exatamente como muita gente pensa.
Fonte da imagem: Reprodução/BBC
Conforme descobriu, os alemães sabiam que o Dynamo fazia parte do NKVD — ou Comissariado do Povo para Assuntos Internos —, portanto, os jogadores foram interrogados pela Gestapo. Como os nazistas não conseguiram provar que os soviéticos estavam envolvidos em atividades obscuras, eles foram enviados a campos de concentração. E mais: apenas três integrantes do FC Start eram originalmente do Dynamo.
Além disso, em vez de o time inteiro ser preso, os nazistas capturaram nove jogadores e os dividiram em três grupos. Apenas os integrantes de um desses grupos foram executados — não que isso seja bom! —, e outros jogadores acabaram morrendo ao longo de vários meses depois da Partida da Morte, mas não por meio da famosa execução pós-jogo.
Aliás, durante um processo em Hamburgo, em 2005, foi declarado que não existem evidências suficientes que apoiem a versão de que os jogadores do FC Start teriam sido executados depois de golear os nazistas. Independente desse sangrento detalhe, o que importa é que as partidas realmente aconteceram e, apesar de ninguém saber ao certo se os soviéticos foram ou não ameaçados, os jogadores enfrentaram os nazistas mesmo correndo o risco de perder suas vidas.