30 anos de SUS: quais são os desafios para os próximos anos?

17/10/2018 às 04:304 min de leitura

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Lá fora, o Brasil é visto como um país de oportunidades, grandes belezas e um povo acolhedor. Aqui dentro, é possível notar e conviver com diversos problemas típicos de uma democracia recém-conquistada. Apesar de uma história secular, do redescobrimento em 1500 e da Proclamação da República em 1889, apenas em 1985 o país abriu as portas para a redemocratização, com a eleição de Tancredo Neves à presidência, pondo fim ao regime militar que perdurou durante décadas.

Tancredo não chegou a tomar posse, já que faleceu poucos dias antes de isso acontecer. Coube a seu vice, José Sarney, conduzir o país no processo que culminaria, em 1989, com as primeiras eleições gerais para toda a população – incluindo como votantes, pela primeira vez, até mesmo os analfabetos.

Nesse processo, foi promulgada, em 1988, a Constituição Federal que ficou conhecida como a “Constituição Cidadã”, já que colocava em primeiro plano todos os brasileiros. Junto com ela, foi implementado o Sistema Único de Saúde, o SUS, como forma de atender a uma proposição firmada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que estipulava que a saúde deveria ser algo para todos até o ano 2000.

Antes do SUS

Antes do SUS, a saúde pública passara por maus momentos: o período militar criou o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) e, posteriormente, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS). O acesso a ambos era bem restrito, já que apenas contribuintes poderiam ser atendidos por esses serviços.

Médico com tablet(Shutterstock)

Ainda assim, os que conseguiam agendamento médico precisavam lidar com uma medicina voltada apenas para a cura, e não necessariamente para o tratamento – e, é importante lembrar, nem todas as enfermidades são curáveis. Naquela época, o Ministério da Saúde se preocupava mais em ampliar o saneamento e incentivar as campanhas de vacinação, fazendo com que a saúde se tornasse cada vez mais sucateada.

Os governos militares investiram em obras grandiosas, como a Usina de Itaipu, a ponte Rio-Niterói e a Transamazônica – esta última, apesar de ser a terceira maior rodovia do país, conta com diversos trechos sem nem sequer uma pavimentação ou com diversos problemas estruturais.

A criação do SUS

Em 1986, a 8ª Conferência Nacional de Saúde entrou para a história por delinear as bases do que viria a ser o SUS: um sistema universal (acessível a qualquer brasileiro), integral (que tratasse de prevenção, cura e reabilitação) e com equidade (prioridade para quem realmente precisa).

As propostas de um sistema único ainda passavam pela parte operacional, descentralizando do governo federal as iniciativas em prol da saúde: estados e municípios também eram responsáveis, através da criação de hospitais, postinhos e conselhos municipais que fossem capazes de atender a todas as demandas da população.

30 anos depois: problemas acumulados

Após 3 décadas de sua implementação, o SUS se tornou referência em alguns assuntos, como o tratamento de pacientes com HIV. Mesmo assim, o sistema apresenta falhas gritantes, que fazem com que 55% das pessoas considerem a saúde brasileira – tanto pública quanto privada – como péssima, segundo dados do Datafolha em pesquisa encomendada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).

Médicos durante cirurgia(Shutterstock)

É importante ressaltar que quando o SUS foi implementado, em 1988, a população brasileira era de 144 milhões de pessoas. Hoje em dia, já passamos de 207 milhões, o que significa uma necessidade cada vez maior de investimentos em diversas áreas. Mesmo assim, o país não consegue aumentar seu número de vagas em leitos de internação, por exemplo. Pior: nos últimos 8 anos, mais de 34 mil leitos deixaram de existir, afetando principalmente as áreas de psiquiatria, pediatria cirúrgica, obstetrícia e cirurgia geral.

Segundo dados do Tribunal de Contas da União (TCU), entre 2002 e 2015, mais de R$ 4,5 bilhões de recursos destinados ao SUS foram desviados em esquemas de corrupção – cerca de um terço do total de verbas desviadas em todas as esferas! Outro dado alarmante é que 93% dos municípios situados próximo às fronteiras do país não possuem leitos de UTI.

Outro detalhe é que o sistema não está precário apenas para seus usuários: a própria classe médica viu seus honorários caírem em até 1.300 %, dependendo do procedimento. Isso mostra que o sucateamento da infraestrutura necessária para realmente cumprir as metas propostas na ocasião da criação do SUS também é refletido na desvalorização da mão de obra que faz com que o sistema permaneça funcionando, agravando ainda mais a situação como um todo.

Qual é o futuro do SUS?

Por conta de tudo isso, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou um manifesto (leia completo neste link) expondo as fragilidades da saúde pública brasileira, ressaltando, por exemplo, a não implementação plena do SUS em nível nacional, a redução dos investimentos na área da saúde, a falta de uma infraestrutura mínima de atendimento, a falta de mecanismos de fiscalização, a abertura desenfreada de escolas médicas, equívocos na formação profissional, os abusos praticados pelos planos privados de saúde e por aí vai.

Médicos unidos(Shutterstock)

O CFM ainda elenca quais cuidados os candidatos deste ano deveriam ter com a saúde a partir de 2019. A interiorização da medicina é um deles, investindo em qualidade de atendimento nos pequenos municípios. A carreira de médico estatal também deve ser uma meta, para que os profissionais se sintam motivados a se tornarem fixos nos SUS.

Além disso, para ter médicos de qualidade é fundamental que o ensino da profissão no âmbito acadêmico seja aprimorado. As faculdades que não formam profissionais decentes deveriam ser reavaliadas para que apenas médicos competentes cheguem ao mercado de trabalho, diminuindo a reclamação dos pacientes dos sistemas público e privado.

O acesso a exames deve ser facilitado, principalmente àqueles que geram mais reclamações pela grande fila de espera, como a ressonância, a ecografia e a mamografia. Para isso, é preciso investir em uma infraestrutura adequada de hospitais e postinhos em todos os municípios.

A recomendação do CFM é que você conheça as propostas na área de saúde de seus candidatos para saber se elas atendem às necessidades emergenciais do Sistema Único de Saúde. E, após as eleições, é fundamental que a população cobre a implementação das propostas, para que o SUS não passe mais 4 anos respirando por aparelhos.

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