Artes/cultura
28/09/2022 às 11:38•2 min de leitura
Na década de 1970, um psicólogo americano chamado Arthur Janov publicou uma obra chamada The Primal Scream. Primal Therapy: The Cure for Neurosis, em que descreve as suas experiências com a chamada terapia primal.
Trata-se de um tipo de psicoterapia que aponta a dor reprimida de traumas de infância como a causa de todas as neuroses. Estas dores poderiam ser acessadas a partir da recriação de episódios específicos da infância e a expressão do sofrimento vinculado a esse momento por meio do grito.
O desenvolvimento desta terapia primal tornou Janov rico e famoso, com adeptos célebres à sua teoria, como John Lennon e Yoko Ono. Mas será que realmente funciona? A ciência já se debruçou sobre este assunto. Vejamos o que foi descoberto.
(Fonte: BBC)
Os cientistas dizem que há pouca evidência de que este tipo de terapia radical realmente funcione como algo que traz melhorias à saúde mental. Esta é a opinião do professor Sascha Frühholz, do departamento de psicologia da Universidade de Zurique.
“Na minha opinião, não há evidências científicas de que a terapia do grito primal tenha algum efeito positivo no tratamento de transtornos mentais e psicológicos. Dado que a psicoterapia moderna é uma abordagem de tratamento baseada em evidências, nenhuma escola séria de psicoterapia usa nenhum elemento da terapia do grito primal hoje”, explicou ele ao The Guardian.
Segundo o professor, o erro da terapia primal é crer que os eventos traumáticos do início da vida estariam "presos" no corpo e na mente, e que só se seriam "libertados" por meio de gritos. “Não há evidências científicas para isso", completou Frühholz.
Por fim, ele crê que focar em gritos de raiva pode ser um método contraproducente para a terapia. “Já sabemos que essas expressões consistentes de raiva como método terapêutico não têm nenhum efeito ou até mesmo efeitos negativos no resultado terapêutico”, acrescentou. O psicólogo ainda argumenta que sua pesquisa já comprovou que a expressão de gritos "positivos", ligados à alegria e ao prazer, são muito mais efetivos para a saúde dos seres humanos.
(Fonte: Truly Experiences)
Mas quais seriam então os efeitos de gritar para a saúde mental? Existe algum benefício que pode ser tirado desta expressão extrema de sentimentos por meio das cordas vocais, ainda que isto não signifique um processo terapêutico?
Há discordâncias entre os pesquisadores. Rebecca Semmens-Wheeler, professora de psicologia na Birmingham City University, declara duvidar que haja benefícios a longo prazo. Ela ainda pontua que gritar ou ouvir gritos dos outros pode aumentar os níveis de adrenalina e cortisol no corpo, que são hormônios ligados ao estresse e ao medo.
“Isso é o oposto do que você está fazendo com coisas como meditação ou ioga, que geralmente ativam o sistema nervoso parassimpático que ajuda você a desacelerar, fazer um balanço, deixar o córtex pré-frontal obter glicose novamente. Tudo isso nos ajuda a tomar melhores decisões”, declarou ao The Guardian.
Mas há quem defenda o poder catártico do grito. "Liberar a emoção reprimida é libertador, como cuspir veneno da boca”, disse Ryan Howes, psicólogo na Califórnia, em declaração ao portal The Wellness.
Ainda assim, ele destaca que o grito, em si, não é capaz de acessar (e resolver) processos mais profundos. Ele menciona que só gritar é como "colocar um band-aid em uma ferida grave". Ou seja, o ideal é que o grito seja só uma ferramenta inicial para quem quiser fazer uma autoinvestigação produtiva por meio da terapia.