Estilo de vida
11/11/2024 às 21:00•3 min de leituraAtualizado em 11/11/2024 às 21:00
Quando pensamos em uma investigação criminal, é comum acreditarmos que o DNA encontrado na cena do crime é a prova mais forte que os peritos poderiam ter. Afinal, cada pessoa possui um código genético único, certo? No entanto, um novo estudo traz à tona um desafio preocupante: a análise forense de DNA, especialmente em casos envolvendo misturas genéticas, pode levar a falsas acusações, vinculando injustamente uma pessoa a um crime que ela jamais cometeu.
Esse problema surge principalmente na chamada "análise de mistura de DNA", uma técnica usada para interpretar amostras que contêm material genético de várias pessoas, como em uma maçaneta tocada por diversos indivíduos. Essa abordagem é especialmente complexa, pois ao tentar "desembaralhar" a contribuição de cada DNA, os programas de computador utilizados criam uma estimativa probabilística — e não uma resposta exata — sobre quem pode ter estado presente.
Quando levada ao tribunal, essa probabilidade é apresentada ao júri junto com outras provas, o que pode dar uma aparência de certeza científica que, na verdade, não é tão firme quanto parece.
O estudo, conduzido por pesquisadores da Universidade do Oregon, destaca que essa análise de misturas é ainda mais suscetível a erros para indivíduos de grupos com menor diversidade genética, como populações indígenas. Em simulações, a probabilidade de erro, isto é, de um DNA ser atribuído equivocadamente a alguém que não esteve no local do crime, aumentou significativamente quando o DNA pertencia a grupos com características genéticas similares entre si.
Esse risco de falso positivo piora ainda mais conforme aumenta o número de pessoas envolvidas na mistura de DNA, chegando a quase 1% de erro em casos com seis colaboradores de diversidade genética baixa. Parece pouco, mas em milhares de amostras, essa pequena taxa pode incriminar erroneamente uma pessoa.
Além das limitações técnicas da análise de misturas, a maior sensibilidade dos testes de DNA, que hoje conseguem identificar perfis genéticos até de minúsculos vestígios, acrescenta um novo dilema: o “DNA de toque”, ou seja, as pequenas partículas deixadas ao tocar objetos, ou até mesmo ao falar próximo a uma superfície.
Em um caso de invasão, por exemplo, a maçaneta de uma porta pode ter DNA de várias pessoas inocentes que estiveram no local dias antes do crime, complicando o cenário para os investigadores. Outro fator é a "transferência secundária", na qual o DNA de uma pessoa acaba em um objeto sem que ela sequer o tenha tocado. Imagine apertar a mão de alguém que depois toca em uma maçaneta. É possível que seu DNA acabe naquele objeto, o que pode ser desastroso se o local for parte de uma cena de crime.
Com a popularização dessas técnicas mais sensíveis, a ciência forense também lida com a necessidade de que peritos, juízes e até o júri entendam os limites dessas evidências. A presença de DNA no local do crime não diz quando ou como ele chegou lá, e, em muitos casos, sem uma interpretação cuidadosa e o apoio de outras provas, o risco de compreender erroneamente a relevância do DNA é grande.
Sheila Willis, pesquisadora do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (NIST, na sigla em inglês), ressalta a importância de considerar toda a gama de evidências ao invés de confiar apenas em um fragmento isolado de DNA.
Apesar dos desafios, os laboratórios não vão simplesmente parar de analisar essas misturas complexas. Embora sejam trabalhosas, essas amostras ainda podem fornecer evidências valiosas. O que está em jogo é a compreensão de que a análise de DNA forense não é infalível. Assim, a melhor abordagem é avaliar cuidadosamente cada caso, questionando a relevância e complexidade da amostra e buscando outras evidências para corroborar a análise genética.
Diante disso, fica claro que, embora a tecnologia de DNA seja revolucionária e tenha ajudado a resolver inúmeros crimes, é fundamental que todos — do laboratório ao tribunal — saibam que a interpretação de DNA não é uma ciência exata e que, quando mal interpretada, pode transformar a cena de um crime em um quebra-cabeça ainda mais difícil de solucionar.