Secas históricas: o que acontece se os rios do Amazonas secarem?

15/10/2024 às 12:154 min de leituraAtualizado em 15/10/2024 às 12:15

Os rios da Amazônia estão entre os mais importantes do mundo. Eles impactam diretamente na população local, mas também em vários aspectos da vida no Brasil, trazendo também consequências para o mundo inteiro. Ocorre que, por conta das mudanças climáticas provocadas pela degradação ambiental, muitas áreas da floresta e dos rios têm sofrido impactos enormes

Segundo o Serviço Geológico do Brasil (SGB), os rios da bacia amazônica atingiram os menores níveis depois de um ano e meio de seca – situação que inclui afluentes importantes como os rios Madeira e Solimões. Mas o que isso acarreta, e o que pode acontecer se esses rios realmente secarem?

A Amazônia e a crise climática

A seca dos rios da Amazônia é uma preocupação global. (Fonte: GettyImages / Reprodução)
A seca dos rios da Amazônia é uma preocupação global. 

Diferentes regiões do mundo têm passado por mudanças climáticas por conta da destruição ambiental. A Amazônia, em específico, enfrenta questões relacionadas a várias crises, como o desmatamento, as queimadas e a seca extrema.

Isso tudo impacta nos rios, que tendem a enfrentar situações extremas. Em 2021, por exemplo, chuvas acima do normal levaram o rio Negro a atingir o nível mais alto em 120 anos, o que levou ao alagamento de cidades inteiras. Isso trouxe, claro, enormes consequências sociais e econômicas.

Agora, a região amazônica passa pelo fenômeno oposto, vivenciando uma seca extrema que reduziu a vazão dos rios. O rio Negro, por exemplo, atingiu no dia 16 de outubro o menor nível documentado desde 1902.

De acordo com Vera Lúcia da Costa Antunes, que é coordenadora pedagógica e professora do curso de Geografia e do colégio Objetivo, o aumento da temperatura média da Terra, em relação ao que ocorria na era pré-industrial, mostra o quanto o aquecimento global está maior. "A situação do aquecimento global está catastrófica, dentro de um nível que não é possível aceitar. Chuvas extremas, como as do Rio Grande do Sul, e as secas da Amazônia e do Pantanal mostram isso", afirma.

O que os especialistas ambientais observam é que a Amazônia sente os impactos da crise climática, concretizando um alerta que é dado há anos pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Cada vez mais, o clima apresenta eventos extremos, que vão das secas às inundações severas.

Isso tudo acaba desequilibrando esse bioma que tem importância planetária – afinal, não é por acaso que a Amazônia é sempre chamada de "pulmão do mundo". O temor agora é que a bacia amazônica atinja um ponto em que os rios, bem como a biodiversidade local, não consigam mais se recuperar.

O que acontece se os rios secarem?

A professora Vera Lúcia da Costa Antunes afirma que a crise hídrica na Amazônia enfrenta um de seus piores momentos. "A maior seca que tivemos na Amazônia até agora foi em 2023", afirma. 

O principal responsável por essa crise, conforme Antunes, é a própria ação do homem. "As mudanças climáticas causadas pela ação humana foram o principal fator para a seca da Amazônia. Quem mais sentiu essa situação, foram as populações mais pobres, como as ribeirinhas, as quilombolas, as que estão isoladas – pessoas que dependem dos rios para transporte, alimentação e renda, e que são vulneráveis".

Além da população, o sistema econômico também sente os impactos da seca. A paralisação temporária de hidrelétricas e da produção de bens em Manaus gera situações muito sérias. Conforme o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), nos últimos 50 anos, o período de seca já aumentou em pelo menos um mês no sul da Amazônia – e pode ficar pior.

Os rios da Amazônia são importantíssimos para a manutenção do bioma. (Fonte: GettyImages / Reprodução)
Os rios da Amazônia são importantíssimos para a manutenção do bioma.

O que já se observa é que rios importantes da região, como o Negro, Solimões, Purus, o Madeira e o Amazonas, já atingiram ou podem atingir os menores níveis da história. Isso os torna intransitáveis e conspira para que os moradores locais fiquem isolados, sofrendo com a falta de transporte de alimentos e remédios, além do abastecimento de água.

Entretanto, as consequências da seca vão além, e interferem também na ocorrência de incêndios, conforme tem se visto em regiões como o Pantanal. Isso é grave, pois o fogo libera partículas que, em situações normais, seriam "engolidas" pela própria atmosfera da floresta, favorecendo a formação de chuva. Como há pouco vapor de água no ar, a formação de nuvens é suprimida.

Mas há o que fazer para que não se chegue em uma crise maior, culminando na seca total dos rios. Segundo Vera Lúcia da Costa Antunes, ainda não há consenso científico sobre o ponto de não retorno; no entanto, isso não pode justificar que certas ações deixem de ser tomadas pelo país.

A professora destaca a presença de tecnologias importantes que, até pouco tempo, não existiam. "Hoje existe uma rede de tecnologia que ajuda a prever os eventos climáticos e analisar como eles são diferentes em relação ao que era no passado. No Brasil, temos o Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Cemaden, a própria Fapesp, além de redes internacionais de pesquisadores que estão investigando a Amazônia. Importante lembrar que os dados hidrológicos e atmosféricos dão uma nova noção do que está acontecendo no meio ambiente", explica.

Os dados científicos gerados por esses institutos e ferramentas precisam ser utilizados para o planejamento de projetos que enfrentem essa situação. "Em 2025, teremos a COP 30 em Belém do Pará, e o painel sobre mudança de clima alerta que temos até 2030 para enfrentar esse problema. Limitar o aumento da temperatura global em 1 grau e meio é importante para garantir o futuro do bioma. 

Há uma preocupação que, se essas situações continuarem, a Amazônia atinja um ponto de não retorno. Se esse ponto for ultrapassado, isso pode levar a um declínio rápido de toda a floresta, fazendo que a rica Amazônia se transforme em uma área de savana ou até de deserto. Isso resultaria em um aumento significativo de emissão de gás carbônico no planeta", conclui a professora.

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