Estilo de vida
05/11/2019 às 02:00•3 min de leitura
Todo mundo que está lendo essa matéria já passou por aquela fase de trocar os dentes. Cai um, caem dois, de repente uma “janelinha” se forma, mas o resto continua ali, esperando sua vez. Para os seres humanos, a troca é gradativa e cada dente tem seu lugar nessa “fila”, mas uma espécie não tem assim tanta paciência e a substituição é menos suave.
Qual é o animal que troca todos os dentes de uma só vez? A piranha. Há alguns anos, os cientistas descobriram que esse peixe perde todos os dentes de um lado de boca ao mesmo tempo, o que torna mais rápida a substituição por novos e afiados dentes para roer as presas. Mas a descoberta estava só no campo da teoria, sem nenhum espécime para comprová-la e ainda nenhum documento apontando para uma piranha sem um bloco inteiro de dentes.
Mas a tecnologia está aqui para ajudar e foi graças a ela que os pesquisadores conseguiram provar a teoria e mostrar que a piranha – assim como os pacus – substitui todos os dentes de um mesmo lado de uma só vez e várias vezes ao longo da vida.
O autor sênior da pesquisa e professor de biologia e ciências da água e da pesca do Laboratório Friday Harbor da Universidade de Washington Adam Summers explica que os dentes formam um bloco sólido que se perde ao mesmo tempo em um lado do rosto do peixe. “Os dentes novos usam os antigos como ‘chapéus’ até que estejam prontos. Portanto, as piranhas nunca ficam desdentadas, embora estejam constantemente substituindo dentes sem brilho por novos e afiados”, diz.
A descoberta também ajudou os pesquisadores a entenderem por que os peixes empregam essa mesma tática. Utilizando uma técnica de imagem avançada, eles puderam ver os contornos e a topografia dos dentes de várias amostras de peixes e descobriram que os dentes de cada lado estavam interligados, formando dois blocos fortes.
O pesquisador Matthew Kolmann explica que com os dentes interligados, ao utilizar demais um apenas a ponto de desgastá-lo, é como se quebrasse uma linha de montagem. “Todos eles têm que trabalhar juntos de forma coordenada”, ressalta.
Os pesquisadores explicam que essa ligação entre os dentes permite que o estresse ao mastigar seja distribuído de maneira uniforme. “A piranha e o pacu possuem muita diversidade na maneira de união dos dentes e isso parece estar relacionado a como os dentes são usados”, explica o coautor Karly Cohen.
Para chegar às conclusões, os pesquisadores utilizaram técnicas de análise de ponta que possibilitou a análise detalhada tanto da estrutura dentária da piranha como do pacu. Foram digitalizados 93 exemplares de 40 espécies diferentes, com ossos e tecidos conjuntivos em 3D de alta resolução. Além disso, tecidos de peixes foram analisados para verificar o desenvolvimento dos dentes e incorporaram todas as informações hereditárias de cada uma das espécies para compreender as relações evolutivas entre elas.
As técnicas mostraram um padrão de substituição de dentes em quase todos e as imagens permitiram que os pesquisadores vissem fileiras de dentes “cutucando” a superfície abaixo dos dentes já existentes. “A motivação para este trabalho surgiu de um esforço para coletar essas coleções e criar novas maneiras de aprender sobre a biologia dos peixes”, ressalta Kolmann.
Os resultados da pesquisa foram publicados na revista Evolution & Development.