Estilo de vida
07/11/2024 às 06:00•3 min de leituraAtualizado em 07/11/2024 às 06:00
No coração do deserto da Península Arábica, uma descoberta fascinante vem levantando a atenção sobre a transição de comunidades nômades para a vida urbana há milhares de anos. Arqueólogos descobriram al-Natah, uma cidade de 4 mil anos, escondida sob o Oásis de Khaybar, no noroeste da Arábia Saudita.
Este assentamento, que abrigou cerca de 500 pessoas entre 2400 a.C. e 1300 a.C., mostra que a urbanização nessa região seguiu um caminho diferente e mais lento em comparação com civilizações contemporâneas no Egito e na Mesopotâmia.
A pesquisa liderada pelo arqueólogo francês Guillaume Charloux, em parceria com colegas sauditas, revelou que al-Natah não era apenas um amontoado de casas, mas um exemplo de planejamento urbano primitivo. A cidade se estendia por 2,6 hectares e era cercada por muralhas de até cinco metros de altura, sinal de que uma autoridade local poderosa zelava pela proteção de seus habitantes.
Essas fortificações, que totalizavam impressionantes 14,5 quilômetros, ajudavam a proteger a cidade de ataques, uma ameaça constante em um território ainda povoado por grupos nômades pastoris.
O assentamento foi projetado com um distrito central administrativo e uma área residencial, conectados por vielas estreitas e sinuosas. Os vestígios de pelo menos 50 casas indicam que essas construções eram suficientemente robustas para abrigar famílias em edificações de um ou dois andares.
A cerâmica encontrada sugere que a sociedade de al-Natah era relativamente igualitária; as peças, apesar de belas, tinham design simples e funcional. Além disso, a descoberta de armas de metal e pedras preciosas como a ágata em uma necrópole próxima aponta para um nível de sofisticação e organização social notáveis.
A localização privilegiada do Oásis de Khaybar, uma rara porção fértil em meio à aridez do deserto, pode ter sido fundamental para o desenvolvimento dessa comunidade. Embora os arqueólogos tenham encontrado poucos vestígios de cereais, é provável que os habitantes praticassem agricultura em pequena escala, aproveitando a irrigação natural do oásis.
Essa autossuficiência relativa, junto com as muralhas protetoras, teria dado à cidade uma segurança que outros grupos nômades da época não possuíam.
O conceito de “urbanismo lento” descrito por Charloux reforça a ideia de que o desenvolvimento de al-Natah não se deu com a rapidez observada em regiões como a Mesopotâmia e o Egito, onde cidades grandes e complexas surgiram já no quarto milênio a.C.
Em vez disso, o noroeste da Arábia seguiu um ritmo diferente, no qual o assentamento urbano surgiu como uma adaptação gradual às condições locais e culturais. Essa forma de vida pode ter dado origem a redes comerciais rudimentares, com oásis fortificados servindo de entrepostos de troca e ligação entre tribos nômades e as rotas comerciais emergentes, como a futura rota do incenso.
O estudo da cidade de al-Natah faz parte de uma série de investigações mais amplas sobre a Idade do Bronze na Arábia Saudita, que incluem descobertas em Tayma, outro oásis que já foi habitado por povos antigos e onde foram encontradas fortificações e estruturas similares. A preservação natural do local, graças às rochas de basalto que cobrem a região, foi crucial para que as escavações arqueológicas fossem bem-sucedidas e livres de intervenções modernas.
No entanto, muitas perguntas ainda permanecem, principalmente sobre o motivo do abandono da cidade entre 1500 a.C. e 1300 a.C. Charloux admite que, por ora, não há respostas claras para essa questão, mas destaca a importância de continuar investigando.
Enquanto isso, a redescoberta de al-Natah reforça que a Península Arábica, tantas vezes vista apenas como um deserto inóspito, tem segredos complexos e histórias de civilizações antigas ainda esperando para serem reveladas.