Por que casos criminais nos fascinam tanto?

02/08/2024 às 14:004 min de leituraAtualizado em 02/08/2024 às 14:00

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Basta abrir qualquer plataforma de streaming e pesquisar termos como "crimes reais", "casos criminais" ou "true crime" para ter acesso a centenas de produções dedicadas a contar histórias de investigações criminais nacionais e internacionais.

O "boom" de séries, documentários e podcasts sobre o assunto sugere que o interesse do público por crimes aumentou juntamente com a popularização dessas plataformas. No entanto, essa impressão está longe da realidade, pois o fascínio humano por crimes precede (e muito!) a era digital.

A cobertura sensacionalista de crimes, por exemplo, pode ser observada desde a Era Vitoriana, conforme menciona o artigo "Como a tecnologia alimenta a obsessão global por crimes reais", publicado pela ExpressVPN, serviço de rede virtual privada. O texto destaca o caso de Jack, o Estripador, assassino que assombrou a população de Londres em 1888.

Curiosamente, parte do medo coletivo em torno dos crimes foi fomentado pela própria mídia londrina. Isso porque os jornais, com o objetivo de vender mais exemplares, não economizavam na divulgação dos detalhes sangrentos dos crimes, especulavam sobre a identidade do assassino e até publicavam cartas supostamente escritas pelo criminoso.

Do século XIX para cá, a obsessão por crimes reais continuou a crescer, evoluindo com as mudanças tecnológicas e culturais. Mas por quê? Por que narrativas macabras continuam atraindo os seres humanos? Psicólogos têm algumas teorias. Venha conhecê-las!

Solucionar mistérios, suprir a curiosidade, estar preparado: quais são os fascínios dos crimes reais?

Uma pesquisa conduzida pelo YouGov, um grupo internacional especializado em análise e dados de pesquisa online, ajuda a compreender a popularidade do "true crime" atualmente.

Entre agosto e setembro de 2022, mil adultos norte-americanos compartilharam suas opiniões sobre o gênero de casos criminais. Os resultados revelaram que metade dos entrevistados aprecia a temática, sendo que 13% a consideram seu gênero favorito.

Quanto à frequência de consumo, um em cada três participantes relatou assistir a conteúdos de "true crime" pelo menos uma vez por semana. Dentre esse grupo, um quarto afirmou assistir a produções relacionadas a crimes várias vezes durante a semana. Apenas 30% dos entrevistados declararam nunca ter consumido esse tipo de conteúdo.

As formas mais populares de acompanhar casos criminais são: programas de televisão (52%) e filmes (39%). Em seguida, destacam-se outras mídias como livros (23%), vídeos em plataformas online (20%), podcasts (17%) e artigos e fóruns na internet (15%).

Com números tão expressivos, não é à toa que o interesse dos seres humanos por casos criminais intriga os estudiosos. Diante desse fenômeno, algumas explicações para o fascínio por crimes têm ganhado destaque.

Gostamos de resolver quebra-cabeças

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Desafios, como solucionar um crime, estimulam as pessoas a consumirem esse tipo de conteúdo. (Fonte: Getty Images / Reprodução)

O mistério apresentado por programas sobre casos de crimes reais é parte do apelo desse gênero. É o que explica o pesquisador e professor associado de Psicologia Forense na Universidade de Derby, Dean Fido.

Em entrevista para a Derby Magazine, Fido comenta que, diferentemente da maioria dos programas que assistimos enquanto realizamos outras atividades, como mexer no celular, os programas sobre casos criminais capturam nossa atenção, pois são como um grande quebra-cabeça.

"Enquanto humanos, estamos sempre procurando por algo novo e original. Seja bom ou mau, precisamos de algo que crie um elemento de entusiasmo. Quando misturamos esse desejo com insight e solução de quebra-cabeça, isso pode nos dar um curto e intenso choque de adrenalina, mas em um ambiente relativamente seguro", explica Fido.

Ou seja, há algo estimulante em solucionar um mistério sobre um acontecimento terrível sem estar envolvido nele de verdade. No conforto e segurança das nossas casas, acompanhar o desenrolar de uma investigação quase se assemelha a ler um romance policial de Agatha Christie, pois há um distanciamento entre o espectador e a história.

Tal distância pode ser associada a outra teoria do porquê esse gênero de entretenimento faz sucesso: trata-se da “apatia do espectador”.

“Ainda bem que não foi comigo”

Não queremos ser vítimas de crimes horríveis, mas nossa atenção é frequentemente capturada por relatos de violência e calamidade. De acordo com o artigo mencionado da ExpressVPN, os psicólogos concordam que isso é um sintoma de uma obsessão social por tragédias.

Nesse contexto, programas, seriados, filmes e documentários sobre crimes reais proporcionam uma sensação de alívio ao espectador, pois satisfazem a curiosidade por assuntos mórbidos enquanto nos fazem perceber que tais coisas terríveis estão acontecendo com alguém desconhecido, e não conosco.

Tudo isso está relacionado à apatia do observador, que pode ser entendida como o pensamento de "antes eles do que eu" que surge, mesmo que momentaneamente, quando sabemos de alguma fatalidade que acometeu outra pessoa.

Casos criminais nos fazem sentir preparados

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Histórias de crimes dão a falsa sensação de proteção. (Fonte: Getty Images / Reprodução)

Para responder ao porquê de sermos tão obcecados por crimes reais, o portal Science Focus da BBC, em parceria com o BBC World Service’s CrowdScience, revelou que esse interesse pode ter raízes nos primórdios da humanidade.

Psicólogos especializados em Psicologia Evolucionista, ramo que examina a estrutura psicológica a partir de uma perspectiva evolutiva moderna, apontam que a atração por histórias de assassinatos, roubos e violência sexual tem sido uma constante na sociedade humana desde os nossos dias enquanto caçadores-coletores.

"É da nossa natureza estarmos altamente sintonizados com comportamentos criminais, e instintivamente desejamos saber o 'quem', o 'quê', o 'quando' e o 'onde' para compreender o que motiva os criminosos e, assim, proteger melhor a nós mesmos e aos nossos parentes," explica Holly Spanner no artigo "Why are we so obsessed with true crime?" publicado na Science Focus.

Para corroborar essa teoria, Spanner menciona um estudo de 2010 da Universidade de Illinois. A pesquisa constatou que as mulheres tendem a ser mais atraídas por histórias de crimes reais do que os homens, e que o público feminino tem maior interesse em entender a motivação dos criminosos e como as vítimas conseguiram escapar.

Para a autora, isso ilustra a ideia de que somos instintivamente atraídos por casos criminais nos quais podemos nos identificar com a vítima e aprender dicas e estratégias para nos defender de possíveis ameaças.

Os impactos da popularidade do “true crime”

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Quem nunca se divertiu assistindo a um crimezinho na TV, não é mesmo? (Fonte: Getty Images / Reprodução)

A predileção por conteúdos de entretenimento com temáticas criminais traz repercussões que ultrapassam os limites das plataformas de streaming e da internet.

No âmbito jurídico, os impactos observados se dividem entre positivos e negativos, conforme abordado em artigo publicado no The Criminal Law Practitioner, portal mantido por estudantes da Faculdade de Direito da Universidade Americana de Washington.

Por um lado, o interesse em crimes reais pode encorajar profissionais da lei a defender os direitos das pessoas, assim como destacar casos envolvendo indivíduos marginalizados pela sociedade. Em contrapartida, com o aumento do interesse em casos criminais, os membros do júri podem ter noções preconcebidas sobre o crime, a justiça e os criminosos em si, afetando prejudicialmente o desfecho de julgamentos.

A popularização do "true crime" também levanta importantes questões éticas mencionadas pela ExpressVPN. Uma das principais preocupações é a revitimização das pessoas envolvidas nos crimes, especialmente familiares das vítimas, que podem reviver o trauma ao verem os detalhes do caso repetidamente explorados na mídia. Além disso, há um risco de glorificação dos criminosos, que podem ser retratados de maneira sensacionalista, desviando a atenção das vítimas e do impacto dos crimes.

Também vale destacar a responsabilidade dos criadores de conteúdo em relação à precisão e à sensibilidade das informações divulgadas, visto que a distorção de fatos para aumentar a audiência leva à desinformação e prejudica a memória das vítimas.

Já para quem consome o gênero, a dica é refletir se o conteúdo é respeitoso em relação às vítimas. Caso contrário, é melhor trocar de canal.

Fonte

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