Artes/cultura
30/06/2017 às 11:00•5 min de leitura
Há quase 100 anos, no dia 11 de novembro de 1918, a Primeira Guerra Mundial chegava ao fim. O período de quatro longos anos de batalhas, mortes, fome e doença que assolou a Europa finalmente terminava, deixando para trás cicatrizes profundas no mundo e uma herança de terror para a população que a testemunhou.
No entanto, a guerra também gerou inovações nas mais diversas áreas. A necessidade impulsionou a criatividade das pessoas e fez surgir alguns objetos, produtos e dispositivos que permanecem em uso até hoje. Mas antes de saber quais são eles, vamos para um breve histórico da Primeira Guerra Mundial.
Geavilo Princip (à esquerda), o assassino do arquiduque Franz Ferdinand (à direita)
Uma série de eventos devido a uma forte competição imperial entre alguns países levou à Primeira Guerra Mundial, mas aquele que formalmente teria sido o responsável pelo início, o estopim, foi o assassinato do arquiduque Franz Ferdinand da Áustria-Hungria (e sua esposa Sophie) em Sarajevo, no dia 28 de junho de 1914 — cometido por Gravilo Princip.
Semanas depois dessa ocorrência, a guerra teve realmente seu início com a invasão austro-húngara da Sérvia, que foi seguida pela invasão alemã da Bélgica, Luxemburgo e França, além de um ataque russo contra a Alemanha. Mas, logo, surgiu um impasse da Frente Ocidental (que continha uma linha de quilômetros de trincheiras), entre a Alemanha, ao leste e os aliados no oeste.
De acordo com um artigo de Simone Scully, do Nautilus, os soldados se posicionavam nas trincheiras, mas era quase impossível para qualquer um dos lados fazer qualquer progresso significativo contra o outro.
Aqueles que tentavam atravessar a curta distância entre a Frente Ocidental e as linhas opostas, local que poderia ser chamado de “terra de ninguém”, eram rapidamente mortos. Toda essa situação forçou as tropas a desenvolver novas tecnologias para superá-la.
Segundo o historiador do Museu da Guerra Imperial de Londres contou ao Nautilus, muitas inovações bem conhecidas que nós associamos com as guerras de hoje foram inventadas para tentar ganhar uma vantagem sobre um inimigo entrincheirado.
Entre os exemplos estão o desenvolvimento do tanque de guerra, do gás venenoso e da fotografia aérea. Mas não foram apenas esses itens que surgiram da necessidade da época. Confira abaixo seis dos exemplos mais surpreendentes das inovações técnicas que vieram da Primeira Guerra Mundial:
Os fertilizantes industriais surgiram na época da Primeira Guerra, mas não para a função de fazer germinar algo e sim para a fabricação de explosivos.
De acordo com o artigo do Nautilus, pouco antes da guerra, os químicos alemães Fritz Haber e Carl Bosch desenvolveram um processo para converter o nitrogênio atmosférico em uma forma biologicamente disponível (amônia), utilizando em alta pressão e temperatura. Isso permitiu que a Alemanha produzisse nitratos artificiais para criar explosivos, como o TNT.
Essa produção deu mais autonomia para os alemães, pois, antes, os nitratos vinham de depósitos de guano chilenos (guano é o nome dado às fezes de aves e morcegos que concentram uma grande quantidade de nitrogênio), que produziam uma oferta limitada.
Então, quando a guerra estourou, a Alemanha tinha apenas nitratos naturais suficientes para durar cerca de seis meses. Mas, com o novo processo químico, eles puderam criar explosivos por muito mais tempo.
E foi esse mesmo processo que acabou sendo adotado para a fabricação de fertilizantes a base de nitrato, que sustentam a agricultura industrial em grande escala hoje em dia.
Atualmente, mais do que nunca, os drones estão por aí pelos ares para as mais diversas funções. Mas, eles não surgiram apenas agora, sendo uma das invenções incríveis da Primeira Guerra Mundial.
Nesse período, além do poder de fogo, as potências dos motores aumentaram, assim como as velocidades de altitude e cargas de bombas. Foi quando também surgiu a ideia do primeiro objeto voador não tripulado.
Naquela época, o inventor norte-americano Charles Kettering projetou uma "bomba voadora” não tripulada, que poderia atingir um alvo a uma distância de 65 quilômetros. Este foi provavelmente o primeiro modelo de drone, projetado para decolar, voar até certa distância e depois parar e mergulhar no chão.
Porém, o primeiro voo de teste, que aconteceu no dia 2 de Outubro de 1918, falhou porque a aeronave subiu muito, parou e caiu. Os modelos seguintes não foram considerados muito confiáveis para serem usados, mas, de qualquer forma, a ideia do drone já estava consolidada.
O sistema de rádio comunicador já havia feito sua estreia antes da guerra, mas grandes progressos foram feitos durante ela, pois era uma ferramenta de extrema importância para as comunicações militares da aviação.
Segundo o Nautilus, o Exército dos Estados Unidos instalou os primeiros rádios bidirecionais em aviões antes mesmo do envolvimento do país na guerra. Em 1916, os técnicos poderiam enviar um sinal de rádio a uma distância de 225 quilômetros e mensagens telegráficas de rádio podiam ser trocadas entre aviões em voo.
No final daquele mesmo ano, começaram os projetos dos capacetes equipados com microfones e fones embutidos. No ano seguinte, foi a primeira vez que a voz de uma pessoa foi transmitida por rádio a partir de um avião voando até um controlador de voo em terra firme. Esse sistema foi essencial para as batalhas, mas também se tornou a base para a tecnologia atual de tráfego aéreo.
Os atendimentos de serviços médicos nos campos de batalha não eram nada fáceis na Primeira Guerra Mundial. Em 1914 (o primeiro ano dessa guerra) foi marcado por extremas dificuldades nessa área, mas os exércitos rapidamente trataram de desenvolver sistemas sofisticados para resolver os mais variados problemas de lesões durante o período com algumas inovações.
Umas delas foi a tala de Thomas, artefato utilizado para imobilizar os membros (geralmente pernas quebradas), que teve um enorme impacto sobre as taxas de sobrevivência em uma época antes dos antibióticos. Antes disso, a porcentagem de mortes decorrentes de complicações de fraturas de fêmur (por exemplo) era muito alta.
Além disso, bancos de sangue foram desenvolvidos, graças à utilização de citrato de sódio para evitar que o sangue coagulasse e se tornasse inutilizável, permitindo as transfusões em pleno campo de batalha. Mais uma inovação que salvou muitas vidas.
No entanto, talvez uma das inovações médicas mais importantes da época foi a capacidade de poder levar as ferramentas de diagnóstico para a linha de frente. Mas tinha um equipamento que era muito grande e delicado para ser transportado: o aparelho de raio-X.
Pensando em tornar o transporte e uso mais prático para o serviço médico dos campos de batalha, a cientista polonesa Marie Curie (que morava em Paris) levantou fundos na França para desenvolver pequenas máquinas de raios-X móveis. Os equipamentos foram então instalados em carros e caminhões do exército francês.
Ela mesma dirigiu alguns desses veículos para levar até as linhas de combate, contando com a ajuda de sua filha Irene, de 17 anos, e trabalhando em estações de remoção de vítimas com o uso dos aparelhos de raio-X para localizar fraturas, balas e estilhaços.
Você sabia que os absorventes higiênicos femininos não foram inventados exatamente para a função de ajudar as mulheres naqueles dias do mês? A princípio, o item foi criado para estancar o sangue de grandes ferimentos de bala durante a Primeira Guerra Mundial.
Segundo conta a história, em 1914, Ernst Mahler, o chefe de uma pequena empresa americana chamada Kimberly-Clark, visitou fábricas de papel e celulose na Alemanha, Áustria e Escandinávia, observando um novo material de celulose chamado "Cellucotton".
O material impressionou Ernst, pois era cerca de cinco vezes mais absorvente que o algodão e, quando produzido em massa, era metade do preço. Ao retornar para os EUA, Mahler registrou o material e, quando os Estados Unidos entraram na guerra em 1917, a Kimberly-Clark começou a produzir os curativos cirúrgicos com ele.
Porém, os curativos chamaram a atenção das enfermeiras da Cruz Vermelha, que começaram a usá-los para a própria higiene pessoal e o costume se tornou conhecido.
Então, quando a guerra acabou, a Kimberly-Clark aproveitou o excedente de ataduras dos militares e da Cruz Vermelha para criar os primeiros absorventes higiênicos comerciais com o nome de Kotex. A ideia foi muito inovadora em uma época em que as mulheres usavam pedaços de tecidos para as suas necessidades higiênicas naquela época do mês.
A fome e a reclusão dos alemães durante a guerra levou a um aumento bastante significativo dos casos de raquitismo, uma doença causada pela falta de vitamina D, cálcio ou fosfato que leva ao enfraquecimento dos ossos.
No inverno de 1918, metade das crianças de Berlim estava sofrendo dessa condição, apresentando também muita fraqueza e apatia. Na época, a causa da doença não era conhecida, mas um médico de Berlim chamado Kurt Huldschinsky percebeu que as crianças também estavam muito pálidas, então ele resolveu realizar um experimento com algumas delas.
Para isso, ele realizou várias sessões em que colocou quatro crianças sob a luz de lâmpadas de mercúrio de quartzo que emitiam luz ultravioleta.
Então, vieram os resultados: o tratamento funcionou, pois os ossos das crianças se tornaram mais fortes. Isso porque a luz ultravioleta faz com que a pele produza a vitamina D, que é necessária tanto para a saúde dos ossos, como para fatores de resposta imunológica e até para o humor.
*Publicado em 12/11/2014