
Ciência
06/05/2015 às 11:25•3 min de leitura
Você já notou que costumamos associar a imagem de pessoas inteligentes com a de criaturas estressadas e infelizes? Afinal, não faltam exemplos de indivíduos geniais que sofreram enormemente ao longo de suas vidas, enfrentando profunda frustração, solidão e angústia — como Nikola Tesla, Charles Darwin e Alan Turing —, e muitos pensam que isso ocorre porque os gênios, de alguma forma, têm uma visão mais clara de tudo o que há de errado no mundo.
Sendo assim, será que isso significa que o velho ditado “a ignorância é uma bênção” está correto — e que ter um QI alto é, na verdade, um infortúnio? De acordo com David Robson da BBC, curiosamente, existem diversos estudos que parecem apoiar a ideia de que indivíduos mais inteligentes do que a média se preocupam mais do que os demais e vivem ansiosos.
Segundo David, os atuais sistemas de educação, de um modo geral, têm como objetivo melhorar a inteligência acadêmica dos alunos — e uma das formas mais comuns de medir seu progresso são os testes de QI. No entanto, apesar de todo o investimento de tempo e dinheiro no desenvolvimento de exercícios cerebrais e de técnicas para melhorar o desempenho cognitivo, será que o esforço de transformar todo mundo em gênio vale a pena? Talvez não...
Em 1926, o psicólogo norte-americano Lewis Terman decidiu aplicar testes de QI para identificar estudantes talentosos na Califórnia. O pesquisador então selecionou 1.500 indivíduos com pontuações iguais ou superiores a 140 — sendo que 80 dos escolhidos contavam com QI de mais de 170 —, e até hoje as vidas dessas pessoas estão sendo estudadas.
Por um lado, o acompanhamento desses indivíduos revelou que muitos realmente chegaram a ocupar posições de trabalho importantes e que diversos conquistaram fama e fortuna ao longo de suas vidas. Entretanto, supreendentemente, nem todos os integrantes do estudo atingiram as expectativas, preferindo se dedicar a atividades menos glamorosas, atuando como oficiais de polícia ou marinheiros, por exemplo.
A pesquisa ainda apontou que os gênios não tiveram vidas mais felizes graças à inteligência acima da média e, ao longo dos anos, foram detectados entre eles os mesmos níveis de divórcio, alcoolismo e suicídio observados no resto da população. Esses fatores levaram Terman a concluir que ser mais inteligente não garante uma vida melhor, assim como ter uma mente brilhante não faz diferença quando o assunto é conquistar a satisfação pessoal.
Ter uma mente brilhante não significa que os gênios necessariamente tomam as melhores decisões. Na verdade, em alguns casos fica evidente que o QI acima da média parece levar as pessoas a fazer escolhas menos coerentes. Segundo David, o que faz mais diferença nas tomadas de decisão não é a inteligência, mas sim a sabedoria — que é um conceito diferente — e ter a capacidade fazer julgamentos imparciais.
É importante destacar que nem todos os gênios são almas perturbadas. No entanto, conforme apontou David, é curioso que a inteligência acima da média não se traduza em mais benefícios. Segundo explicou, uma das teorias sobre esse dilema é que o reconhecimento da inteligência gera grandes expectativas — pessoais e dos demais —, fazendo com que esses indivíduos se sintam ansiosos e angustiados.
Muitos dos participantes do estudo de Terman, quando indagados a respeito de suas trajetórias, admitiram sentir que haviam falhado em alcançar tudo o que haviam almejado durante a juventude. Além disso, outros tantos revelaram que não haviam sido capazes de satisfazer as expectativas que outras pessoas tinham sobre eles.
De acordo com David Wilson do site Slate, outro estudo realizado por pesquisadores da Universidade MacEwin, no Canadá, revelou que estudantes com QI mais alto do que a média, especialmente aqueles com maior inteligência verbal, se preocupam mais e mais frequentemente do que os outros. E, curiosamente, na maioria dos casos, a inquietação não é provocada por questões existenciais e de ordem mais profunda, mas por assuntos mundanos.
A pesquisa ainda apontou que as pessoas com mais inteligência verbal tendem a verbalizar e “ruminar” mais sobre suas ansiedades. Isso porque esses indivíduos possivelmente também têm mais facilidade em considerar os eventos passados e futuros relacionados com seus problemas de maneira mais detalhada, o que levaria a uma reflexão mais intensa. E mais: pessoas inteligentes acabam encontrando mais coisas com as quais se preocupar.
Apesar dos pesares, os pesquisadores acreditam que as pessoas com mais tendência a se preocupar talvez sejam mais atentas e diligentes, o que levaria a um maior desenvolvimento intelectual. Além disso, indivíduos que se estressam mais costumam estar mais atentos a situações arriscadas do que as pessoas despreocupadas.
Sendo assim, como tudo na vida, sempre existe um lado positivo de se considerar os problemas: se você se preocupa demais, a sua aflição pode ser um forte indicativo de que o seu intelecto é superior à média. Além disso, se você é do tipo ansioso, você provavelmente está mais para uma “sentinela do perigo” do que uma pilha de nervos ambulante.