Estilo de vida
29/10/2012 às 10:05•4 min de leitura
Skylon, projeto de avião espacial capaz de voar mais rápido do que o som (Fonte da imagem: Reaction Engines)
O ano de 1969 costuma ser lembrado pela primeira missão tripulada do homem à Lua, satélite natural da Terra que recebeu a visita de Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin “Buzz” Aldrin Jr. Mas outros fatos também marcaram essa época. Os fãs do bom e velho rock puderam se deleitar com o primeiro disco da banda Led Zeppelin, enquanto Elvis Presley entrava em estúdio para gravar “From Elvis in Memphis”, disco que contém grandes sucessos do músico, aclamados ainda hoje.
Mas 1969 também foi um grande ano para a aviação comercial. Para começar, em fevereiro daquele ano o Boeing 747 voava pela primeira vez, estreando na aviação comercial quase um ano depois, em janeiro de 1970. Porém, a aeronave que roubou a cena em 69 foi mesmo o Concorde, um avião supersônico que prometia fazer viagens internacionais à velocidade de Mach 2, ou seja, o dobro da velocidade do som (cerca de 2,1 mil km/h).
Apesar do alto custo do projeto e de diversas críticas recebidas, principalmente quanto à poluição ambiental e sonora, além da percepção do público de que os voos do Concorde eram um privilégio apenas dos ricos, a aeronave operou comercialmente por mais de 20 anos, sendo aposentada apenas em 2003, depois de crise na indústria aérea gerada com o ataque de 11 de setembro.
Por 27 anos, os aviões Concorde fizeram viagens internacionais muito rápidas (Fonte da imagem: Heritage Concorde)
Nesse meio tempo, o Concorde ficou famoso por feitos memoráveis. Enquanto aviões comuns levavam 8 horas para ir de Nova York até Paris, o Concorde fazia o trajeto em apenas 3,5 horas. Segundo a Folha, uma viagem transatlântica em uma dessas aeronaves custava cerca de US$ 9 mil, valor muito acima de uma passagem de primeira classe em um Boeing 747.
Devido ao alto custo de manutenção e ao número insuficiente de passageiros com o qual a aeronave costumava operar, o modelo foi aposentado. Seu último voo aconteceu no dia 24 de outubro de 2003, tendo como destino o aeroporto Heathrow, em Londres. Desde então, os Concordes se tornaram atrações em museus.
Por enquanto, continua em aberto a vaga de um novo avião supersônico para voos comerciais. Mas alguns projetos em andamento prometem mudar isso nos próximos anos, fazendo com que uma viagem de Nova York para a Austrália, por exemplo, dure apenas 4 horas.
Cabine do Concorde, que alcançava velocidade de Mach 2 (Fonte da imagem: Wikipedia)
Se o mundo já se espantou com o Concorde, avião supersônico que voava à velocidade de Mach 2, ele não perde por esperar as aeronaves hipersônicas, ou seja, que atingem uma velociade cinco vezes maior do que a do som (Mach 5). Para isso, problemas de engenharia e limites físicos têm sido estudados e superados frequentemente, com soluções inovadoras e capazes de deixar qualquer um otimista.
Como é de se esperar, boa parte dessa revolução hipersônica da aviação civil deve acontecer em uma peça fundamental da aeronave: o motor. As propulsões de foguetes usadas em aeronaves são capazes de atingir grandes velocidades, mas possuem um custo muito alto.
Modelo do motor SABRE, que usa o ar para alcançar Mach 5 (Fonte da imagem: Wikipedia)
A principal razão para isso é o fato de que o mecanismo deve ser potente o suficiente para suportar não apenas o avião, tripulação e passageiros, mas também a carga de combustível necessário: toda a massa de hidrogênio e oxigênio líquidos. Agora, engenheiros pensam em uma forma de amenizar essa desvantagem e, a princípio, a resposta para esse problema está em algo transparente aos nossos olhos: o ar.
Já que o avião se movimenta por um meio que está repleto de oxigênio, a turbina poderia sugar o ar e queimá-lo junto com hidrogênio para obter a propulsão necessária para fazer a aeronave voar tão rapidamente. Isso eliminaria peso e, consequentemente, tornaria o processo mais barato.
Detalhes do funcionamento do SABRE, motor do Skylon (Fonte da imagem: Reaction Engines)
Grosso modo, essa é a ideia de funcionamento do SABRE, motor de propulsão de foguete que tornará possível o mundo da aviação civil hipersônica.
Desenvolvido pela empresa Reaction Engines, em Oxfordshire, na Inglaterra, o SABRE será usado, inicialmente, para levar à órbita terrestre o avião espacial Skylon, que poderá ser empregado no lançamento de satélites. Entretanto, é muito provável que essa obra de arte da engenharia também sirva para realizar voos comerciais na velocidade de Mach 5.
A vantagem parece clara: com o mesmo motor, é possível viajar tanto dentro da atmosfera quanto fora dela. O conceito usado como base para a criação do SABRE surgiu em 1955, quando Robert P. Carmichael propôs que motores de hidrogênio poderiam ter uma performance muito maior caso o trocador de energia térmica conseguisse esfriar o ar que entra por ele.
Dessa forma, a baixa temperatura permitiria que materiais mais leves, como uma grande massa de ar, passassem pelo motor, permitindo que combustores injetassem mais combustível sem que se sobreaquecessem.
Esse tipo de motor ficou conhecido como “precooler” e é capaz de processar o ar antes de queimá-lo com hidrogênio. Em entrevista para a revista NewScientist, o gerente de desenvolvimento de negócios da Reaction Engines, Ben Gallagher, afirma que “ao entrar em um motor SABRE em Mach 5, o ar se aquece a uma temperatura de mais de 1 mil oC, o que derreteria qualquer motor comum”. Porém, o precooler da empresa é capaz de reduzir a temperatura do ar para -150 oC em um centésimo de segundo.
Dessa forma, quando o ar é comprimido e preparado para a combustão, ele não se aquece demais. Obviamente, a Reaction Engines faz segredo sobre o processo de resfriamento de ar. Aliás, a tecnologia é tão secreta que ainda nem foi registrada como uma patente. Tudo o que foi divulgado acerca dela é que o ar passa por uma série de tubos muito finos resfriados por hélio e espalhados por uma grande área do motor.
O SABRE já se encontra em fase de testes e, segundo a reportagem da NewScientist, já é capaz de funcionar por 6 minutos de maneira bastante estável e sem vibrações, o tempo necessário que ele precisaria para levar à órbita terrestre um avião espacial.
Não é só a Reaction Engines que sua para tornar esse tipo de voo comercial uma realidade. A campanhia aeroespacial EADS, responsável pelo Airbus, tem desenvolvido, em parceria com Instituto Lavrentyev de Hidrodinâmica, na Rússia, uma alternativa ao SABRE e que conta com uma abordagem diferente. Segundo o Technology Newspaper, esse motor funcionará como uma variante aperfeiçoada do motor de pulso jato, projeto alemão que foi usado durante a Segunda Guerra Mundial.
Imagem do motor de pulso jato sendo desenvolvido pela EADS (Fonte da imagem: Technology Newspaper)
Esse tipo de motor funciona injetando, aos poucos, combustível e ar em um canal e inflamando a mistura, direcionando a propulsão para a direção certa. A diferença no projeto da EADS é que o novo motor provocará as explosões dessa mistura em velocidades supersônicas. Com o tempo, a ideia é que o projeto entre nas velocidades hipersônicas por meio da tecnologia que eles chamam de “onda contínua de detonação”, que criará milhares de injeções de combustível por segundo.
Quem também aposta nesse novo nicho de mercado é a Virgin, que já possui um projeto bastante desenvolvido de turismo espacial e cuja passagem já pode ser comprada por brasileiros. Segundo a companhia, se o programa espacial da Virgin for expandido, será possível sair de Londres para almoçar na Austrália em apenas 45 minutos. Parece ótimo, não?
Fontes: NewScientist, Reaction Engines, AIAA, Skylon, Technology Newspaper