Ciência
25/11/2024 às 18:00•2 min de leituraAtualizado em 25/11/2024 às 18:00
Popularizado por alguns filmes recentes, o Ragnarök é uma versão nórdica do nosso Apocalipse. Na saga definitiva, deuses como Odin e Thor morrem combatendo monstros e forças do caos, simbolizando um ciclo de destruição e renovação cósmica. Como prelúdio da hecatombe mundial, o mundo passa pelo Fimbulwinter, um inverno consecutivo de três anos.
Em um estudo recente, publicado na revista Journal of Archaeological Science: Reports, pesquisadores do Museu Nacional da Dinamarca investigaram se um “inverno vulcânico” ocorrido no ano de 536 d.C. pode ter sido interpretado como um sinal do fim dos tempos e seja uma inspiração do relato mítico.
Esse evento mundial teve consequências dramáticas no mundo inteiro, como tempestades de neve na China durante o verão, queda de 2,5°C na temperatura da Europa, seca no Peru e uma peste bubônica que espalhou pelo Egito. Por isso, alguns estudiosos começaram a se questionar se o Fimbulwinter não seria o relato simbólico de um evento real.
Para investigar o impacto desse evento climático na Dinamarca, os autores examinaram anéis anuais de crescimento de mais de 100 peças de carvalho do século 6. As análises revelaram um crescimento arbóreo reduzido, principalmente entre 539 e 541, o que pode ser um indício de condições ambientais extremas.
Em um comunicado, o pesquisador sênior do museu dinamarquês, Morten Fischer Mortensen, explicou que, quando as árvores não crescem, também não há cultivo nos campos, o que acarreta consequências terríveis para sociedades agrícolas. Nas vizinhas Noruega e Suécia, especialistas estimam que até metade da população morreu nessa época conturbada.
Como alternativa de sobrevivência, os habitantes daquelas regiões decidiram implantar culturas agrícolas diversificadas, como o centeio. Adaptável a terrenos menos férteis e condições climáticas desafiadoras, o cereal tem risco reduzido de perda total de colheitas e pode ser utilizado tanto na alimentação humana quanto na alimentação animal.
Embora as evidências não tenham sido suficientes para provar que o Fimbulwinter foi baseado nos eventos catastróficos do século 6, a coincidência é bem expressiva. Para os pesquisadores, mitos podem ser reflexos de verdades históricas.
As narrativas simbólicas são muitas vezes formas como os habitantes da época conseguiram expressar eventos apocalípticos.
A pesquisa mostrou de que forma eventos climáticos extremos são capazes de moldar não só a sobrevivência física de um povo, mas também sua mitologia, cultura e estratégias de adaptação. Além de memória mítica, Ragnarök pode ter sido um repositório de memória histórica. "É um pensamento interessante o nosso amor pelo pão de centeio ter nascido de uma crise climática", brinca Mortensen.