Artes/cultura
13/04/2021 às 08:01•3 min de leitura
Hoje em dia, o beijo na boca é um ato comum entre pessoas que possuem um relacionamento afetivo mais forte e próximo. Contudo, isso nem sempre foi assim. A antropóloga Vaughn Bryant, da Universidade Texas A&M, fez um levantamento histórico para tentar traçar uma linha do tempo do beijo. Vamos conferir?
Os pesquisadores acreditam que a ação de encostar uma boca na outra surgiu há milhões de anos com a tentativa de mamíferos passarem comida para sua prole. A partir dessa observação, tendo-se em vista que somos dessa classe de animais, o estudo aponta que os humanos também trilharam esse caminho, ou seja, em algumas ocasiões as mães procuravam alimentar seus filhos diretamente boca com boca.
Embora a origem real do beijo ainda seja um mistério, historiadores encontraram indícios da prática na Índia. Quatro textos da literatura de Vedic Sanskrit, uma língua antiga do país, datados de 1.500 a.C. descrevem que os indianos tinham o costume de esfregar e encostar os narizes. Eventualmente, os lábios se encostavam, e alguns achavam isso prazeroso.
Fonte da imagem: Chore Bagan Art Studio/Wikimedia Commons
E isso não é tudo. Um poema de Mahabharata elaborado 500 anos mais tarde contém claras referências ao que seria o beijo: “Ela encostou a sua boca na minha e fez um barulho e isso produziu prazer em mim”. Além disso, o Kama Sutra, uma clássica obra erótica escrita no início do século 5 depois de Cristo, tem descrições de técnicas do beijo.
O ato de beijar teria ultrapassado as fronteiras da Índia no ano de 326 a.C., graças aos exércitos de Alexandre, o Grande. Os soldados aprenderam a prática com os indianos e a levaram de volta para suas casas. Com a morte do renomado conquistador, suas tropas foram divididas e espalhadas por várias áreas do Oriente Médio, e com elas o beijo.
Os romanos foram um dos maiores responsáveis pela popularização do beijo, levando-o para boa parte da Europa e partes do norte da África. “Eles foram missionários devotos do beijo”, menciona Bryant.
Fonte da imagem: Jastrow/Wikimedia Commons
Para eles o beijo não era apenas um “beijo”. Os romanos tinham diferentes maneiras de beijar. O osculum era uma forma de demonstrar amizade, sendo entregue geralmente no rosto. Havia também o basium, um tipo de beijo mais sensual em que as bocas já se encostavam. Por fim, o savium consistia em beijo mais apaixonado, que mais tarde ficou conhecido como “beijo francês” ou “beijo de língua”.
O beijo era levado tão a sério na Roma Antiga que foram criadas leis para a sua prática. Por exemplo, “se uma garota virgem fosse beijada de maneira apaixonada em público, ela tinha o direito de exigir o casamento com o homem que a beijou”, relata a antropóloga.
Na Idade Média, o beijo ganhou outros significados. Ele passou a ser elitizado, sendo que somente pessoas da mesma classe social poderiam se beijar na boca. O ósculo também virou um sinônimo de submissão, tanto que os servos eram obrigados a beijar mãos, pés e até o chão de seus “patrões”.
Fonte da imagem: Master Of The Prayer Books/Wikimedia Commons
Como muitas pessoas naquela época não sabiam ler nem escrever, o beijo ainda foi usado para selar contratos. Nesse mesmo período, a Igreja Católica começou a se preocupar com o beijo, temendo que ele incentivasse atos carnais. Por isso, o Papa Clemente V, durante o Concílio de Vienne entre os anos de 1311 e 1312, proibiu o chamado “beijo santo” que era praticado durante os eventos religiosos — hoje, esse gesto de paz é exteriorizado com um aperto de mão.
De acordo com a pesquisa de Vaughn Bryant, o ato de beijar começou a perder força na metade dos anos 1600 na Europa, quando outros gestos foram adotados em sinal de respeito e admiração, incluindo as clássicas reverências de chapéu. Para piorar, com o surgimento da Grande Praga de Londres em 1665, um surto em menor escala da Peste Negra, as pessoas passaram a ter medo de beijar e transmitir a doença.
Em 1896, o filme intitulado “O Beijo” mostrou pela primeira vez dois atores, May Irwin e John Rice, se beijando repetidamente. Obviamente, a cena causou um escândalo para a época, pois após séculos de decadência o ósculo havia se tornado algo extremamente íntimo. Atualmente, o beijo voltou a ganhar certa liberdade, embora ainda seja um sinal de desrespeito em alguns países quando feito em público e de ser usado geralmente apenas por casais apaixonados.
Você imagina quantos tipos diferentes de beijo existem? O neurocientista alemão Onur Güntürkün realizou um estudo de quase dois anos, no qual ele percorreu parques, praias, estações de trem, aeroportos e outros locais públicos olhando as pessoas se beijarem. O pesquisador concluiu e gravou 124 beijos cientificamente válidos.