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26/08/2022 às 08:00•2 min de leitura
Em 1976, quando a poeta e ativista Audre Lorde lançou sua coletânea de poesias Coal, ela talvez nem imaginasse o impacto que sua obra teria. O livro a colocou definitivamente como uma defensora das mulheres, da negritude e da equidade. Seus trabalhos sequentes, como Sister Outsider, a posicionariam definitivamente como uma porta-voz das pessoas marginalizadas - em especial, das mulheres negras, que estavam à margem até do movimento feminista.
Audre Lorde se tornou desde então muito "citável". Suas frases seguiram reverberando - e, muitas vezes, fora do contexto original. Neste texto, portanto, trazemos várias ideias e conceitos que foram forjados a partir do pensamento de várias feministas negras.
(Fonte: Editora Elefante)
Uma das frases mais conhecidas de Audre Lorde é esta: "cuidar de mim não é auto-indulgência, é autopreservação, e isso é um ato de guerra política". A citação está no livro A Burst of Light, uma compilação de textos de Lorde de 1988 falando sobre o sistema de saúde e o câncer que havia invadido o seu corpo.
A partir daí, a ideia do autocuidado foi se tornando mais popular, a ponto de ter se esvaído do seu sentido original, que era vinculado à questão da resistência das mulheres negras e sua luta política, e se associado no senso comum mais aos cuidados estéticos.
(Fonte: Politize)
Em 2022, o Coletivo de História Afro-Americana do Museu Nacional de História Americana criou um projeto de podcast chamado Collected, que visa recontextualizar estes termos em seu contexto original. “Percebemos que, no discurso público, principalmente na mídia e nas redes sociais, há vários termos, ideias e práticas feministas negras circulando. Mas elas estão sempre desconectadas das pensadoras feministas negras que as criaram, do contexto em que foram criadas e, em alguns casos, do próprio significado que as criadoras originais estavam pensando quando as elaboraram”, falou Krystal Klingenberg, uma das curadoras do projeto.
A ideia de interseccionalidade, assim como autocuidado, também remete a estas estudiosas e feministas negras. A interseccionalidade (ou teoria interseccional) estuda a sobreposição de identidades sociais ligadas à opressão ou dominação, tais como gênero, classe, raça, orientação sexual, idade, etc.
Assim, pensa-se como as desigualdades se manifestam a partir de cruzamentos entre essas identidades: o que, por exemplo, uma mulher negra passa em relação a uma mulher branca lésbica, ou uma mulher pobre, e assim por diante.
(Fonte: Making Gay History)
O termo "política identitária" foi criado em 1974 pela feminista negra Barbara Smith. Ele reagia às primeira e segunda ondas feministas, que encorajavam as mulheres a se unirem, o que de alguma forma ignorava que as experiências das mulheres não eram todas iguais. Quando todas se uniam, havia sempre as que ficavam para trás.
O conceito da política identitária propõe-se a questionar se as medidas que são tomadas em prol da luta pelas minorias são sentidas (ou não) por todas as pessoas da mesma forma. Como a resposta é obviamente não, sugere a reflexão sobre o que se pode fazer sobre isso.
Para muita gente, este seria um conceito problemático, pois promoveria a desunião dos grupos minoritários, ao "hierarquizar" as opressões - o que é uma leitura deturpada da ideia original da feminista.
No podcast Collected, Barbara Smith explicou sobre a ideia em torno do conceito. “Não estávamos dizendo que éramos superiores a quaisquer outros grupos de pessoas oprimidas. Não achávamos que éramos as únicas pessoas na Terra que eram oprimidas. Queríamos apenas afirmar que, diferentemente do movimento de mulheres e do movimento de libertação negra da época, havia um conjunto particular de situações, circunstâncias, experiências e opressões que as mulheres negras vivenciavam e que precisávamos lidar com isso", falou.