Por que não nos lembramos da época em que éramos apenas bebês fofinhos?

27/12/2018 às 15:014 min de leitura

Provavelmente você não se lembra de sua primeira ou segunda festinha de aniversário, além de uma série de outros eventos que ocorreram no início da sua infância. Essa nossa “amnésia” dos primeiros anos de nossas vidas é absolutamente normal, apesar de sua natureza fundamental e influente.

A maioria dos adultos não se recorda dos primeiros momentos da vida, exceto pelas inúmeras fotos que foram registradas pelos seus pais ou pelas histórias que eles contaram da época. Porém, é possível acionar algumas poucas memórias daquele tempo com esses mesmos artifícios. Geralmente isso acontece com lembranças vindas já dos três ou quatro anos de idade.

Os cientistas chamam esse fenômeno de amnésia infantil. Enquanto você pode ter sido capaz de lembrar a sua segunda festa de aniversário por meses após ela ter acontecido, um ano depois, porém, as memórias podem simplesmente desaparecer e, eventualmente, se perdem completamente.

Mas porque isso acontece?

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O início da vida e da infância é uma fase em que ocorre uma avalanche de novas informações para o cérebro. E os pesquisadores apontam que há uma alta taxa de rotatividade de memórias nesse período, o que seria um dos culpados pela amnésia. Isso acontece porque, com toda uma série de novas experiências, significa simplesmente que algumas memórias iniciais são forçadas a cair no esquecimento.

Por exemplo, até os três anos de idade, as crianças avaliadas em um estudo conseguiram recordar eventos importantes que aconteceram com elas no ano anterior. O alto índice de recordação continuou até os sete anos de idade, com os participantes do estudo lembrando até 72% dos mesmos eventos que tinham recordado quando eram crianças de três anos.

Mas, quando chegaram à idade de oito ou nove anos, a maioria só pode recordar apenas 35% das experiências de vida que tinham tão descrito quando tinham três anos. Os pesquisadores concluíram que a mudança vem da maneira como as memórias são formadas com a idade das crianças.

Aos sete anos, as crianças armazenam memórias cada vez mais lineares que se encaixam de forma sucinta em um sentido de tempo e espaço. O próprio ato de se lembrar de eventos e categorizá-los dentro desse cronograma pessoal pode causar a recuperação induzida do esquecimento, um processo que faz com que as crianças mais velhas e os adultos cortem as primeiras lembranças da vida assim como elas recordam detalhes específicos sobre outros eventos.

Bebês formam memórias de um jeito diferente

Para entender por que ninguém se lembra de seu tempo de bebê de colo até os dois anos e alguns meses, é preciso primeiro compreender como as nossas primeiras experiências são registradas no cérebro.

Os bebês contam com a memória semântica e episódica. A memória semântica é a transformação de ideias não extraídas da experiência pessoal (nomes de cores ou datas de eventos na história, por exemplo). Já a memória episódica é elaborada a partir da experiência pessoal (o seu primeiro dia de aula, por exemplo). Com o tempo, a memória episódica pode tornar-se a memória semântica.

Os cientistas acreditam que a razão pela qual não podemos recordar acontecimentos desde a infância pode ser devido à forma como as memórias são armazenadas e acessadas. Embora as memórias semânticas e episódicas sejam armazenadas em várias regiões do córtex cerebral, não é, até as idades de dois a quatro anos, que o hipocampo “enreda” todas estas regiões diferentes dentro de uma mesma fonte centralizada de informação.

Essas conexões permitem que as crianças e adultos recordem memórias em longo prazo. Um estudo atual culpa os circuitos em nossos cérebros por trair a nossa capacidade de recordar da infância. A pesquisa centrou-se na formação constante de novas células em cérebros infantis.

O processo de crescimento de novos neurônios, conhecido como neurogênese, ocorre ao longo da vida de um mamífero. No entanto, os bebês produzem novos neurônios em um ritmo bastante acelerado. E toda essa produção vem do hipocampo, que é onde acessamos todas as memórias que armazenamos.

Para realizar a pesquisa, os cientistas usaram roedores como cobaias, supondo que todos os novos neurônios interrompessem a formação e acesso de memórias. De fato, os resultados mostraram que, quando eles utilizaram drogas para diminuir o número de novos neurônios formado pelos roedores, os bichos foram capazes de lembrar melhor. O aumento do número de neurônios teve o efeito contrário.

Início de memórias da infância

Mesmo com todas as pesquisas em torno da primeira infância, não há respostas definitivas a respeito de quando exatamente perdemos as memórias de ser um bebê. Mas, com certeza você já conheceu alguém que se lembra de experiências do início da infância de forma mais vívida do que outras pessoas.

Uma hipótese intrigante é que a capacidade de se lembrar da época de bebê pode estar ligada a lateralidade, ou seja, pessoas que realizam tarefas com ambas as mãos (direita e esquerda) podem ser capaz de lembrar memórias de infância formadas em uma idade bem mais nova do que aqueles são apenas destros, por exemplo.

No estudo, os cerca de 100 participantes universitários que eram ambidestros ou destros foram convidados para escrever duas memórias de infância. Eles foram instruídos que uma memória deveria ser um evento que lembrava pessoalmente, enquanto o outro deveria ser um evento recontado a eles por seus pais ou outra testemunha, que viria a ser verificada como verdadeira.

O exercício, destinado a medir memórias semântica e episódica, revelou que os eventos lembrados pessoalmente (episódicos) dos ambidestros foram lembrados a partir de uma idade mais precoce do que as memórias dos destros.

Além disso, os ambidestros podiam recontar as memórias contadas a eles a partir de uma idade mais adiantada, também. A razão é que eles poderiam ter mais comunicação entre os hemisférios do cérebro.

O corpo caloso, um feixe de nervos que liga os dois lados do cérebro, torna-se funcional aos quatro ou cinco anos de idade. Quase ao mesmo tempo em que a amnésia da infância começa a desaparecer, assim como as memórias episódicas tornam-se codificadas no hemisfério esquerdo do cérebro e recuperadas a partir do direito.

O estudo coloca em questão a hipótese de que o aumento da comunicação entre o lado direito e esquerdo do cérebro pode permitir que os ambidestros codifiquem e recuperem memórias de infância de forma mais eficiente do que os destros.

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