Ciência
02/09/2014 às 06:07•3 min de leitura
Em 14 de dezembro de 1799, morria George Washington, o primeiro presidente dos Estados Unidos, aos 67 anos de idade, dois anos após se aposentar da política. Figura central do imaginário norte-americano, Washington não morreu. Hoje, ele é o nome da capital do país, estampa a nota de um dólar e tem seu rosto esculpido, com enormes 18 metros de altura, no Monte Rushmore.
Mas, para alguns, não morrer metaforicamente não é o bastante. Ficar para a História sem fazer parte dela tem a mesma graça? William Thornton parecia acreditar que não. Amigo de Washington, ele sugeriu que o político fosse ressuscitado. Isso mesmo. Por que não ter um ex-presidente zumbi, não é?!
Médico e arquiteto amador, Thornton é conhecido principalmente por ter desenhado o Capitólio dos Estados Unidos, onde funciona o Congresso do país. Nascido em 1759, no Reino Unido, Thornton se tornou um cidadão americano em 1787. Em 1793, Washington, então presidente, escolheu o seu projeto para a construção do prédio, hoje um dos principais pontos turísticos do país.
Capitólio foi desenhado por William Thornton
Negócios à parte, Thornton parecia gostar muito de Washington. Em seus diários, ele descrevia o líder político como o seu melhor amigo na Terra. Washington estava enfermo em sua fazenda Mount Vermon, no estado de Virgínia, quando um membro da família convidou Thornton para ver se ele podia ajudar. No entanto, o médico chegou tarde demais.
Quando Thornton entrou na residência, na manhã do dia 15, Washington já estava morto. O presidente morrera na noite anterior, após apenas 48 horas de febre e infecção na garganta (Deus abençoe o antibiótico).
Dois dias antes de morrer, Washington foi à cavalo supervisionar as atividades da fazenda. Uma chuva fria atrapalhou seus planos e, no dia seguinte, ele já estava de cama. Progressivamente, o ex-presidente começou a apresentar dificuldade de falar e engolir.
Para se tratar, Washington ingeriu uma mistura de vinagre, melaço e manteiga, que não ajudou nem um pouco. Os médicos da família, a pedido do enfermo, começaram a drenar o seu sangue por meio de um corte no seu estômago. Na época, acreditava-se que a técnica era eficaz para a cura de doenças infecciosas. Mais de dois litros de sangue foram retirados de Washington antes de sua morte.
George Washington
O tratamento obviamente não funcionou e, ao longo do dia 14, Washington agradeceu aos médicos, reviu seu testamento e aproveitou para se despedir da família. O ex-presidente não aparentou ter medo de morrer, mas tinha receio de ser enterrado vivo. Poucas horas antes de seu suspiro final, ele pediu para ser enterrado decentemente e ordenou que esperassem ao menos três dias até o velório.
Assim foi feito. O cadáver de Washington foi congelado, e é aí que William Thornton aparece na história com sua sugestão pra lá de bizarra. Quando o médico chegou, deparou-se com Washington nesse estado e pensou que poderia reverter a situação.
Thornton sugeriu que, antes de mais nada, o cadáver fosse descongelado. O corpo deveria ser posto em água fria e reaquecido com cobertores e fricção, tudo para colocar os vasos sanguíneos em atividade. Ao mesmo tempo, o médico faria uma traqueostomia no presidente. Assim, ele conseguiria inflar ar aos pulmões para criar uma respiração artificial. Para repor o sangue perdido, Thornton faria uma transfusão com sangue de cordeiro.
Na época, a transfusão de sangue começava a ser testada em maior escala e o animal era a principal escolha dos médicos para o procedimento. Muitos cientistas acreditavam que o fluido tinha propriedades especiais.
Felizmente, para o bem da sanidade mental da humanidade e infelizmente para o defunto, que podia ter ganhado mais uns aninhos por aqui, a oferta não foi aceita. Martha, viúva de Washington, não deixou que fizessem essa indignidade com o corpo do marido e muitos acreditaram que não ia funcionar.
Thornton não ficou contente com a decisão e, muitos anos depois, ainda parecia magoado por não terem acatado sua sugestão. Em seus escritos, ele defendeu sua teoria dizendo que, se ele morreu pela perda de sangue e falta de ar, bastava devolver esses elementos. “Não tenho dúvida de que essa restauração era possível”, afirmou.
William Thornton
No texto, o médico ainda se lamentava por não ter tentado, seguro de que ainda não era a hora de Washington partir: “Se fosse possível, teria sido certo tentar trazer de volta à vida alguém que partiu cheio de honra e renome; livre das fragilidades da idade, em pleno gozo de todas as faculdades e preparado para a eternidade”.
Um dos líderes da Guerra de Independência norte-america, Washington foi o primeiro presidente do país entre os anos de 1789 e 1797. No dia 18 de dezembro de 1799, ele foi finalmente enterrado. Seus restos mortais permanecem no jazigo da família, em Mount Vernon.