Estilo de vida
10/02/2020 às 10:45•6 min de leitura
É impossível falar de Carnaval sem pensar nas escolas de samba, certo? Elas são uma das instituições culturais mais famosas no Brasil e sua presença dentro das comunidades é extremamente importante. Agora, é hora de falar mais sobre elas.
Os ranchos carnavalescos surgiram no final do século XIX eram associações que realizavam cortejos de carnaval, contando sempre com a presença de Rei e Rainha, que desfilavam ao som das chamadas marcha-rancho.
Eles provavelmente foram derivados da cultura africana, como Congos e Cucumbis, mas enquanto os dois últimos eram mais difundidos entre as camadas mais populares, os ranchos costumavam ser mais “chiques”.
Seus desfiles envolviam uma alegoria muito parecida com um cortejo, e costumavam utilizar instrumentos de sopro e corda.
As marchas-rancho, como o próprio nome indica, possuíam um ritmo muito mais lento do que as músicas das atuais escolas de samba. A famosa marchinha Abre Alas, de Chiquinha Gonzaga, é um exemplo do estilo musical do rancho.
As escolas de samba surgiram como um produto das transformações de manifestações culturais do carnaval do Rio de Janeiro juntamente com a criação do samba moderno. Para especialistas na história carnavalesca, o surgimento dessas escolas começa em 1928, com a criação da Deixa Falar no Rio de Janeiro.
A ideia era criar um bloco de carnaval diferente, que dançasse e evoluísse com o samba, e diferentemente dos ranchos, que não utilizasse instrumentos de sopro.
Ainda em 1929, foi organizado o primeiro concurso de samba na casa do jornalista que também é o fundador da Mangueira. E em 1932, o jornalista Mario Filho organizou e patrocinou o primeiro desfile das escolas na icônica Praça Onze.
Neste primeiro concurso, 19 escolas participaram, e os pré-requisitos para o concurso incluíam ter mais de 100 pessoas, um samba inédito, não usar instrumentos de sopro, ter uma ala de baianas, entre outros. O vencedor foi a Estação Primeira de Mangueira, com a Portela ficando em segundo lugar (na época, a escola se chamava Osvaldo Cruz). Com o sucesso, ele foi oficializado e passou a acontecer anualmente na Praça Onze até 1941.
Ao longo do tempo, as escolas de samba começaram a incorporar certos aspectos dos ranchos, como a criação de um enredo para o desfile e a apresentação de um casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira.
Nos desfiles, cada detalhe apresentado pelas escolas é muito importante. Vários elementos precisam ser apresentados em um desfile de uma escola de samba, e alguns deles são quesitos que recebem notas dos jurados. Outros, como a ala das baianas, não são considerados como quesitos, mas se não forem exibidos, também podem levar à perda de pontos.
A comissão de frente é o primeiro grupo a desfilar de uma escola de samba e uma condição obrigatória. Sua função é saudar o público e os jurados e apresentar a sua escola. Normalmente, ela consiste de 10 a 15 pessoas que realizam uma coreografia, para introduzir o enredo. Antigamente, esses grupos eram formados por membros da velha guarda da escola, que carregavam bastões, como se estivessem protegendo a agremiação.
Com o passar dos anos, as escolas começaram a investir em artistas plásticos, coreógrafos e bailarinos profissionais para enriquecer a apresentação. Como existe para saudar e empolgar o público, obrigatoriamente precisa ser a primeira, e tirando essa regra, não existe nenhuma outra sobre a ordem dos outros elementos durante o desfile.
O abre-alas é a primeira alegoria apresentada pela escola e não precisa obrigatoriamente fazer parte do enredo. Normalmente, esse carro traz o símbolo de sua escola, como a Águia da Portela, ou o Tambor da Mangueira. Sua função é impressionar os jurados e o público, levando o encanto dos gigantes do samba para todo o mundo.
A ala das baianas, mesmo não sendo um quesito, é de extrema importância para uma escola de samba e deve contar com pelo menos 70 participantes. É um dos momentos mais aguardados dos desfiles e fica reservada para as mulheres mais experientes das escolas. No início da história das escolas, só os homens participavam dessa ala. Ela representa as antigas baianas quituteiras também conhecidas como “tias do samba” que acolhiam os sambistas em seus lares no início do século 20, em uma época na qual o ritmo ainda reprimido pela polícia.
Os carros alegóricos, junto com as fantasias, apresentam visualmente o tema da escola. Eles são julgados dentro do quesito alegorias e adereços, mas também são essenciais no quesito enredo. As alegorias englobam os elementos cenográficos, como luzes, telas e adereços. Seu design, originalidade e efeitos podem render muitos pontos. Elas servem como uma divisão de setor do enredo, e sintetizam vários elementos da história.
O mestre-sala e a porta-bandeira são os componentes mais importantes, com a responsabilidade de conduzir a bandeira da escola durante o desfile, que é considerada um dos símbolos mais emblemáticos da apresentação. A função original do mestre-sala era proteger a porta-bandeira, porque as agremiações rivais tinham o costume de roubar as bandeiras de seus concorrentes.
A roupa da dupla é tradicionalmente confeccionada nas cores da escola, recebendo adaptações para o enredo escolhido no ano, mas sempre com acabamentos luxuosos. O desempenho do casal é um dos quesitos de julgamento, um peso muito grande se considerarmos que é atribuído somente a duas pessoas.
A bateria é o coração de uma escola, sendo formada por um grupo de 250 a 300 percussionistas que ficam responsáveis pela energia e evolução do ritmo durante toda a apresentação. Ela costuma apresentar instrumentos como o surdo de primeira (responsável pela marcação do samba), o surdo de segunda e o surdo de terceira; repique, caixa de guerra, chocalho, tamborim, cuíca, agogô, reco-reco e prato.
Cada escola pode fazer suas variações nessa composição, mas os instrumentos de sopro continuam fora dessa festa. O mestre de bateria tem o fator crucial entrada no recuo na avenida, coordenando o ritmo para que os outros músicos sigam o compasso e não deixem "buracos" no desfile ao fazerem a curva para a área reservada. Ela forma um quesito específico, mas também influencia outros, como harmonia musical e samba-enredo.
A madrinha de bateria não é uma presença obrigatória no desfile, a menos que faça parte do enredo. Algumas escolas escolhem mulheres de sua comunidade para essa posição, enquanto outras optam por famosas para essa função.
O puxador é responsável pelo andamento do samba-enredo durante o desfile, o músico normalmente possui o auxílio de um grupo de cantores de apoio, e desfilam juntos em cima ou ao lado do carro de som, logo depois da bateria. O nome vem do princípio que todos os integrantes da escola devem cantar o samba durante a apresentação, então a música precisa ser apenas iniciada, ou puxada, pelo artista. A afinação dos cantores é julgada no quesito harmonia.
A velha guarda tem uma importância fundamental para as escolas de samba e preservação da cultura do estilo musical. A missão dos integrantes é transmitir a história das agremiações para a próxima geração, mantendo viva as tradições. Normalmente, a velha guarda usa roupas de gala nas cores da escola, e fica na ala que fecha o cortejo, com seus membros mais simbólicos presentes no último carro alegórico ou no abre-alas. Cada escola tem sua forma de escolher os membros, mas no geral, elas avaliam os anos de serviço prestados e integrantes que se destacaram como ritmistas, mestre-salas e passistas.
As alas são as seções nas quais os participantes do desfile são divididos e cada uma possui um papel bem definido. Cada uma conta com seu próprio presidente para orientar os demais participantes durante o desfile, evitando assim os infames “buracos”. Antes da apresentação, o papel dessa pessoa é garantir que todos os trajes serão confeccionados dentro do prazo.
Os passistas são moças e rapazes das comunidades das escolas, e esta ala geralmente é composta pelos 20 melhores dançarinos da agremiação. Seu papel é encantar os espectadores, trazendo alegria e descontração para o desfile, sempre incentivando a participação do público.
Os carnavalescos estão por trás dos desfiles, sendo normalmente os responsáveis por escolher o tema para o ano, criar e desenvolver as fantasias e carros alegóricos, além de cuidar da direção artística do espetáculo e acompanhar os ensaios. Algumas escolas investem em comissões de carnaval, usando um conjunto desses profissionais para as decisões sobre a apresentação.
Por último, mas não menos importante, temos o enredo e o samba-enredo. O enredo é o tema a ser desenvolvido pela escola durante toda a apresentação. Ele precisa ter um começo meio e fim. Seu tema pode ser histórico, crítico, exaltar personagens, lugares e até outras artes. O samba-enredo é a tradução musical do tema, ajudando o público a entendê-lo melhor, além de motivar os participantes a desfilarem com mais empolgação. No começo, eles possuíam uma primeira parte e a segunda era improvisada, mas no final dos anos 40 o improviso foi proibido.
Cada escola de samba tem sua quadra, que age como uma espécie de quartel-general, e durante o ano inteiro vários eventos da comunidade ocorrem ali, como almoços nos fins de semana, feijoadas, shows de cantores populares, além de projetos comunitários voltados principalmente para crianças e a terceira idade.
No período de Carnaval, as quadras abrem suas portas e todos estão convidados para participar das eliminatórias para a escolha do ritmo do samba que irá embalar escola nos desfiles. Cada eliminatória é uma grande festa, que só vai ficando melhor até o dia da grande final.
Depois da escolha do samba, elas abrem todas as semanas para receberem visitantes que desejam aprender a cantar a música escolhida, dançar e se divertir a noite inteira. Estes eventos contam com a participação dos principais elementos das escolas, como a bateria, intérpretes e a velha guarda. Ali, o samba é expresso em sua mais pura essência, com um público de todas as idades torcendo pela escola e participando da luta pelo campeonato.