Artes/cultura
24/08/2021 às 02:30•2 min de leitura
Berço do Kama Sutra e lar de uma das mais fortes tradições eróticas do planeta, a Índia se tornou referência no que diz respeito à união de sexo e religião, dois fundamentos que naturalmente não têm o costume de andar junto. Apesar de ser considerada sagrada por boa parte dos indianos, em especial para os que moram no Estado de Madhya Pradesh, a sensualidade vem causando descontentamento por parte de grupos radicais nos últimos anos, e já é colocada, por muitos, como um controverso tabu.
Desde o século III, com a distribuição do Kama Sutra, obra que reúne textos sobre o comportamento sexual humano e é classificada como o trabalho definitivo sobre amor na literatura em sânscrito, os indianos tratam o sexo como algo muito além da prática carnal. O livro inspirado nos pensamentos do filósofo Vatsiaiana (em torno do século V) tratou, então, a sensualidade como prazer e inspirou conceitos existencialistas envolvendo o erotismo, enraizando uma nova tendência na cultura oriental.
“Kama, em sânscrito, não significa sexo, e sim prazer, desejo”, diz Nybdi Aditya Haksar, responsável por traduzir o livro. “Esta busca (pelo prazer) é apenas um dos três princípios da vida humana. Os outros são a busca da bondade e da virtude, e a busca da prosperidade e da riqueza.”
(Fonte: iStock / Reprodução)
Em Madhya Pradesh, a 630 quilômetros da capital Nova Delhi, os textos antigos serviram como base para a criação de templos estonteantes chamados de “templos do Kama Sutra”, construídos entre os séculos X e XI. Os edifícios, relacionados à crença hinduísta e repletos de alusões ao livro, trazem centenas de imagens e cenários com fundos eróticos, exibindo quase uma dança sem nenhum tipo de censura e tudo é mostrado de forma explícita.
Segundo historiadores, a repressão sexual na Índia começou na segunda metade do século XIX, quando a Coroa britânica assumiu o comando do país — após a revolta de 1857 contra a East British Company — e regulamentou um conjunto de leis que efetivaram uma moral puritana, fundamentada em regras sobre a família e os bons costumes. Além disso, as normas também esclareciam um comportamento ideal para homens e mulheres.
(Fonte: Wikimedia Commons/Reprodução)
Essas políticas antigas reforçaram atitudes de correntes mais estritas do hinduísmo, muitas delas ligadas ao conservadorismo radical. Relacionadas ao partido BJP, as patrulhas dos fundamentalistas, parcialmente educadas por britânicos, caçaram namorados e namoradas em São Valentim, queimando bandeiras e acessórios, e barrando a comemoração da sexualidade.
“Posso ser um ser muito sexual, mas não posso demonstrá-lo publicamente”, diz Sandhya Mulchandani, autora do livro O Kama Sutra para Mulheres. “É da natureza da sociedade e do povo. Se expressa a todo momento na Índia.”, afirma a autora.