Cruzada das Crianças: elas acreditaram que reaveriam Jerusalém

21/10/2021 às 11:043 min de leitura

Houve uma comoção em massa quando o sultão muçulmano do Egito e da Síria, Nácer Saladino, dominou Jerusalém em 1187. A Terceira e a Quarta Cruzadas cristãs para tentar reaver a Terra Santa, entre 1187 e 1204, fracassaram em proporções épicas. Porém, ainda havia muitos cristãos no oeste querendo viajar para a cidade visando retomá-la — apesar dos impostos solicitados e dos sacrifícios de materiais e suprimentos para bancar o exército dos cruzados.

Essa questão de honra cristã era tão grande que, em 1212, surgiu um movimento que ganhou um caráter lendário: milhares de crianças se organizaram em um exército, no que ficou conhecido como Cruzada das Crianças.

Todas partiram para o Oriente Médio certas de que poderiam fazer melhor do que os adultos e derrotar os muçulmanos. Mal esperavam o que estava por vir.

As visões

(Fonte: Wikipedia/Reprodução)(Fonte: Wikipedia/Reprodução)

Foi em junho de 1212 que um pastor de 12 anos, chamado Estêvão de Cloyes, se aproximou do rei Filipe II da França dizendo que recebeu uma carta de Jesus Cristo, na qual era instruído a formar uma cruzada com o quanto de seguidores pudesse para reconquistar a Terra Santa.

O rei rejeitou a proposta, mas o menino não se intimidou e partiu em uma viagem de pregação pela região. Como resultado, conseguiu reunir uma multidão de 30 mil pessoas, das quais 20 mil eram crianças e jovens.

Enquanto isso, em Colônia, na Alemanha, um pastor de 10 anos, chamado Nicholas, teria liderado um grupo de 7 mil crianças dos Alpes até a Itália, chegando no porto de Gênova no final de agosto de 1212, onde poderiam encontrar navios que os levassem para Jerusalém. Vários grupos se formaram na França e na Alemanha, todos com o mesmo objetivo: reconquistar a terra sagrada.

(Fonte: Curious Historian/Reprodução)(Fonte: Curious Historian/Reprodução)

Até hoje existem debates se o movimento foi formado inteiramente por crianças, visto que os registros medievais são confusos. Na época, o termo mais usado para designar os participantes do movimento era pueri (rapaz, em latim), que pode incluir crianças, adolescentes e adultos. Contudo, segundo o historiador C. Tyerman, o movimento não teria perdido sua integridade por envolver pessoas que não eram diretamente ligadas às cruzadas.

“Os relatos indicaram que os participantes vinham de fora das hierarquias usuais de poder social — jovens, meninas, solteiros, às vezes excluindo até viúvas — ou condição econômica: pastores, lavradores, carroceiros, trabalhadores agrícolas e artesãos rurais sem um interesse fixo na terra ou na comunidade, sem raízes e móvel. Sinais de anticlericalismo e ausência de liderança clerical acentuaram esse sentimento de exclusão social”, apontou Tyerman.

Além disso, uma cruzada era tipicamente convocada pela autoridade papal, e a Cruzada das Crianças nunca foi sancionada pela Igreja.

A jornada

(Fonte: Science Photo Library/Reprodução)(Fonte: Science Photo Library/Reprodução)

Durante toda essa odisseia, os grupos acabaram se dividindo em grupos menores que seguiram para portos alternativos, seja em Marselha (sul da França) ou em Brindisi (sul da Itália). Como todos os viajantes dependiam da caridade das pessoas por onde quer que passassem para se alimentar, milhares deles morreram de fome.

Aqueles que sobreviveram para conseguir chegar aos portos, sem equipamento militar, treinamento ou sanção da Igreja, foram impedidos de embarcar nos navios. Em algumas versões da lenda que a Cruzada das Crianças se tornou, houve as que esperaram com otimismo que o Mediterrâneo se abrisse como o Mar Vermelho para Moisés.

Depois que se viram sem milagre e ajuda material, as crianças voltaram para casa — mas poucas delas chegaram. A maioria foi sequestrada e enviada para regiões da Sardenha, Egito e até Bagdá para sempre vendidas como escravas.

(Fonte: Christ and Pop Culture/Reprodução)(Fonte: Christ and Pop Culture/Reprodução)

Alguns historiadores ainda trabalham com a hipótese de que os dois eventos liderados por crianças tenham sido incorporados no imaginário cristão para fomentar a obstinação pela reivindicação do cristianismo. Isso, porque no início do século XIII surgiram migrações de pobres por toda a Europa, motivadas pelas mudanças nas condições econômicas da época.

Do norte da França e da Alemanha, camponeses teriam sido forçados a vender suas terras, e um bando de pueri teria liderado multidões em nome de Jesus, alegando o recebimento de visões para que mudassem de vida radicalmente.

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