Artes/cultura
26/05/2022 às 08:00•2 min de leitura
Conhecidos por seus feitos em combate, os vikings se destacaram pela barbárie durante as invasões ao antigo reino britânico, evitando relações diplomáticas quando o assunto era expansão territorial na Europa. Porém, o mesmo povo que levou banhos de sangue a todas as regiões pelas quais passou desenvolveu um método curioso de estimular a inteligência de seus integrantes, colocando guerreiros para disputarem batalhas de insultos similares às dos raps atuais, conhecidas como flytings.
Originalmente, o termo "flyting" é derivado das palavras nórdicas antigas para “briga” e “provocação”. Praticada entre os séculos V e VI pelos vikings, a disputa consistia em um jogo ritualístico de inteligência onde o moral dos participantes era testado a partir do momento em que expressões sobre covardia, aparência, masculinidade duvidosa ou falta de cognição serviam como meios de ataque poético para abalar o adversário.
As palavras eram emitidas em forma de versos e o número adequado de sílabas e a sonoridade serviam como critérios de validação da desenvoltura dos "cantores". Por mais brutais que os soldados fossem em combate no campo, sua cultura era marcada por um amplo desenvolvimento da astúcia e sagacidade, e suas habilidades provocativas deveriam ser tão capacitadas quanto os dons com machados e escudos.
(Fonte: Getty Images / Reprodução)
Nomes importantes das lendas nórdicas, como Loki, Thor, Odin e Beowulf, foram diretamente vinculados ao flyting e tiveram momentos emblemáticos relatados em poemas. Em The Flyting of Loki: The Lay of Greybeard, o filho de Fárbauti e Laufey se disfarça de Greybeard para enfrentar seu irmão, o Deus do Trovão. Enquanto isso, o texto Hárbarðsljóð, conhecido como um dos mais fascinantes manuscritos édicos, colocou o antigo rei de Asgard em um novo duelo de insultos, agora contra seu próprio pai.
"Não vou mais guardar segredo:
foi com sua irmã
que você teve um filho tão
ruim quanto você." — Hárbarðr, de Lokasenna
Os anglo-saxões possivelmente adotaram a prática de seus invasores vikings e transformaram o ritual de intelecto em uma competição. Seus salões de festas lotavam com espectadores e participantes, e os vencedores, escolhidos pelo público em geral, tinham direito a beber uma grande caneca de cerveja ou hidromel e convidar o derrotado a se juntar à mesa para celebrarem juntos.
Nos séculos XV e XVI, o flyting voltou a ganhar popularidade graças aos makars, um tipo de bardo escocês que se envolvia nos concursos verbais para ofender seus alvos com insultos sexuais e escatológicos. Curiosamente, a batalha começou a gerar problemas entre as pessoas e quem fosse pego citando profanidades nas ruas era multado no valor de 20 xelins (algo em torno de R$ 1200, em conversão direta), exceto se fosse encarregado de entreter a nobreza em cortes reais.
Posteriormente, os flytings foram citados inúmeras vezes na literatura mundial, inclusive em peças de William Shakespeare e nas tragégias de Ralph Roister Doister, de Nicholas Udall, e de John Still, autor de Gammer Gurton's Needle.