O caos na fundação do primeiro metrô no Brasil

02/09/2022 às 10:004 min de leitura

Desde 1890, quando a cidade de Londres, no Reino Unido, recebeu o primeiro sistema de metrô da história, o meio de transporte subterrâneo não parou de crescer pelo mundo, com 180 sistemas em 178 cidades e 56 estados do mundo.

No Brasil, o metrô abrange 12 capitais, sendo que só em São Paulo, considerada a cidade com maior índice de tráfego subterrâneo nacional e a 5ª cidade com o melhor sistema de metrô do mundo, mais de 5,3 milhões de pessoas utilizam o transporte por dia; gerando uma refeita de cerca de R$ 750 milhões por ano. Atualmente, o Metrô possui 7.300 funcionários, já a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) possui 6.800 empregados.

Da fundação do metrô no Brasil até esse patamar de desenvolvimento foi uma longa e conturbada jornada, recheada de atrasos e esquemas.

Do burro a eletricidade

(Fonte: Leiloeiro Público/Reprodução)(Fonte: Leiloeiro Público/Reprodução)

Foi em 1872 que o transporte urbano começou, a princípio, a partir de bondes a burro que conectavam um pequeno trecho que ia da Praça da Sé à Estação da Luz, regiões centrais da capital de São Paulo. Demorou até 1889 para que a Companhia Viação Paulista (CVP) expandisse as linhas e as reestruturasse para que os serviços acompanhassem o crescimento urbano.

Um ano antes, o alemão Alberto Kuhlmann conseguiu uma concessão de 50 anos para explorar uma linha férrea a partir do Largo do Rosário (atual Rua 15 de Novembro), mas ele não conseguiu concluir a obra no prazo estipulado, portanto, todo o material foi destinado à primeira construção do Viaduto do Chá, em 1892.

Essa foi a primeira vez que um projeto de metrô foi considerado para a cidade de São Paulo, porém estava longe de ser a última. Nos anos seguintes, várias propostas surgiram, inclusive a do engenheiro Felipe Antônio Gonçalves, que requiriu autorização do então prefeito Antônio da Silva Prado para a construção de uma estrada de ferro circular na região central de São Paulo. 

Em 1º de dezembro de 1909, foi prorrogado o prazo para 30 anos e concedido pelo prefeito a licença para que o engenheiro utilizasse do subsolo da cidade. Foi a primeira vez que o projeto foi referido como “O metropolitano”, e estava tudo certo para acontecer, sobretudo porque a capital da Argentina havia acabado de inaugurar o seu metrô, se tornando o primeiro sistema subterrâneo da América Latina.

(Fonte: Via Trolebus/Reprodução)(Fonte: Via Trolebus/Reprodução)

A intenção inicial era que o metro conectasse a atual Praça da Bandeira, seguisse pelo Anhangabaú, Vale do Tietê, Pacaembu, Cemitério do Araçá, Matadouro da Vila Mariana, Ipiranga e o Vale do Tamanduateí até a Praça da Bandeira novamente.

No entanto, a obra não foi para frente, tanto porque a Câmara Municipal achava cara demais e desnecessária, e a São Paulo Tramway, Light and Power Company (responsável pela eletrificação pública e expansão do transporte a burros) temia que seu sistema de bondes fosse afetado pelo novo empreendimento.

Na década de 1930, a popularidade da CVP descarrilou diante da falta de recursos, piorando a operação dos bondes, que já não comportavam os cidadãos, estavam sucateados e não chegavam a tempo aos destinos. Naquela época, São Paulo já desfrutava de cerca de 240 mil habitantes, fruto do boom de desenvolvimento econômico que trouxe imigrantes de todas as partes para trabalhar nos vários setores necessitados da economia paulista.

Um cenário nada favorável

(Fonte: Via Trolebus/Reprodução)(Fonte: Via Trolebus/Reprodução)

Nessa época, atravessando um período financeiro conturbado com a quebra de seu monopólio de bondes para o setor privado de ônibus devido ao racionamento da geração e distribuição de energia em decorrência da drástica seca que assolou São Paulo em 1924 –, foi a primeira vez que a Light tentou construir um sistema de metrô ao lançar seu ambicioso Plano Integrado de Transportes, ainda que a ideia tenha surgido mais para reestabelecer o equilíbrio financeiro golpeado pelo congelamento tarifário e a retomada de seu monopólio nos transportes públicos.

Contudo, a grandiosidade e tecnologia toda do plano encontrava com os conceitos do Plano de Avenidas, de Francisco Prestes Maia, que defendia que a expansão urbana da capital deveria ocorrer com apoio de avenidas radiais, unidas por grandes anéis e sucessivos anéis perimetrais; que exigiam um investimento menor em comparação ao transporte subterrâneo. Maia alegava também que a cidade nem sequer possuía densidade o suficiente que justificasse a implementação de uma rede de transportes daquela magnitude.

(Fonte: Pinterest/Reprodução)(Fonte: Pinterest/Reprodução)

A politização excessiva da proposta não só a demoliu, como problemas governamentais e a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial congelaram qualquer debate sobre um futuro metrô. A pauta só voltou em 1956, quando São Paulo sofria com o caos em uma proporção pior do que a Londres da Revolução Industrial do século XVIII, com mais de 2 milhões de habitantes, e dependendo de uma rede de transporte público feita de bondes velhos, ônibus que não iam para lugar algum e um sistema tímido de trólebus.

O então prefeito Wladimir de Toledo Piza estava encarregado de desenvolver o Anteprojeto de um Sistema de Transporte Rápido Metropolitano, nascido a partir da Comissão do Metropolitano, do ex-prefeito Lino de Matos, no final de 1955, e coordenada por Prestes Maia, sob a proposta de instaurar uma rede de transporte massiva.

No estudo que propunha uma rede radial de 100 quilômetros de extensão, integrando 6 linhas, sendo elas Santana-Santo Amaro, Penha-Lapa, Itapecerica-Ipiranga. Visto que elas precisavam cruzar a região central da cidade, isso só seria possível com um sistema de metrô. 

Se você pensou que esse era o momento que tudo aconteceria, então pensou errado.

"São Paulo depende do metrô"

(Fonte: Pinterest/Reprodução)(Fonte: Pinterest/Reprodução)

Em 1961, Prestes Maia voltou à prefeitura de São Paulo, resgatando o plano de transportes, após uma onda de 6 anos de discussões e instabilidades que cancelaram qualquer iniciativa de sua implementação. Contudo, o estado financeiro precário, resultado da administração municipal anterior, o deixou de mãos atadas.

Um ano mais tarde, com uma condição financeira melhor, Faria Lima assumiu a prefeitura e conseguiu colocar, pela primeira vez, o plano de construção em prática com os insumos financeiros do governo federal, apesar da reforma tributária de Castello Branco.

Em 31 de agosto de 1966, foi fundado o Grupo Executivo Metropolitano (GEM) sob o slogan “São Paulo Depende do Metrô”, pensando em ser o primeiro metrô do país e o segundo da América do Sul. O estudo de viabilidade econômico-financeiro ficou a cargo da Hochtief, Montreal e Deconsult (HMD).

(Fonte: Acervo O Globo/Reprodução)(Fonte: Acervo O Globo/Reprodução)

No ano seguinte, a pesquisa Origem-Destino para determinar os caminhos básicos da rede de metrô – feita a cada 10 anos até hoje –, determinou que seria necessário 66,2 km de trilhos subterrâneos e elevados, dos quais 2,8 km seriam na superfície. A malha se concentraria na Casa Verde-Vila Mariana e Pinheiros-Via Anchieta. A rede seria completa pela Linha Cila Madalena-Paulista e Moema e Vila Bertioga.

A linha pioneira, então denominada Norte-Sul, com 18 km, foi dividida em 11 trechos, sendo o trecho 7 (Santa Cruz a Praça da Árvore) e o 8 (Praça da Árvore a São Judas), que tiveram os contratos assinados para início das obras em novembro de 1968.

Finalmente, a estação Jabaquara da Linha 1 Azul do metrô de São Paulo, foi inaugurada em 14 de setembro de 1974, após anos de atrasos, discussões, instabilidades e cancelamentos durante o período de obras.

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