Como Operação Condor ensinou a tortura ao Brasil da ditadura

03/04/2023 às 12:203 min de leitura

Depois da guerra, o que mais foi visto na segunda metade do século XX foi a repressão em todas as suas formas, da China aos Estados Unidos, este que prosperava no pânico causado pela ideia da “ameaça vermelha”.

O governo americano se mostrou disposto a fazer qualquer coisa para suprimir atividades supostamente comunistas e antiautoritárias em todo o mundo durante a Guerra Fria, não poupando esforços, nem que isso significasse financiar grupos armamentistas fascistas e apoiar financeira e belicamente regimes autoritários – como fizeram durante o Golpe de 1964, que instaurou uma Ditadura Militar no Brasil.

Na Europa, a Operação Gladio estabeleceu redes espiãs para inibir a atividade do comunismo, enquanto os EUA criaram a Operação Condor, que prendeu, sequestrou e abusou física e sexualmente de milhares de pessoas em uma verdadeira rede de esquadrões militares e paramilitares da morte associados à subversão política de maneira transnacional. 

Como aconteceu

(Fonte: The Guardian/Reprodução)(Fonte: The Guardian/Reprodução)

Revolucionários que lutaram ativamente contra as ditaduras militares, indígenas, membros de sindicatos ou democratas — todos foram vistos como inimigos dos EUA durante a Operação Condor, oficialmente implementada em novembro de 1975 pelas ditaduras de direita do Cone Sul (o triângulo geográfico formado por Chile, Argentina, Uruguai e Brasil, que possuem características geopolíticas semelhantes).

Mas a campanha foi muito além, apoiando material e financeiramente os regimes militares também da Bolívia, Equador, Paraguai, Peru e Uruguai; procurando criar um ambiente altamente hostil para membros de organizações antiautoritárias viverem – ou seja, livre de oposição.

Com uso da inteligência, os EUA vigiaram os países que faziam parte do pacto da Operação Condor por meio de dispositivos de criptografia fornecidos por uma empresa de propriedade da Agência Central de Inteligência (CIA). Portanto, a todo o momento, o governo americano sabia o que estava acontecendo nesses países, podendo também controlar as atividades repressivas. Isso significava que eles ensinaram como as autoridades locais deveriam torturar.

(Fonte: Al Jazeera/Reprodução)(Fonte: Al Jazeera/Reprodução)

No Paraguai, foram encontrados os denominados "Arquivos do Terror", contendo até 700 mil documentos compilados durante a operação, com dados de reuniões, fotografias e movimentos de quem defendia a reforma social. Tudo isso foi feito por meio de lentes de telefoto usadas para a vigilância de reuniões e de qualquer cidadão, de professores a pastores. Todos estavam sujeitos à vigilância.

Só no Paraguai, mais de 100 mil pessoas foram executadas ou desapareceram. Os arquivos também mostraram que a rede espiã massiva foi usada para coordenar vários assassinatos, como o carro-bomba que tirou a vida dos exilados Carlos Prats González e Sofía Cuthbert, na Argentina, após fugirem do Chile quando o governo caiu sob o golpe de Pinochet.

Os voos da morte

(Fonte: EBC/Reprodução)(Fonte: EBC/Reprodução)

Desse modo, fica mais fácil entender como surgiu, por exemplo, a Casa da Morte. Estabelecida em Petrópolis, no Rio de Janeiro, o local foi um centro clandestino de tortura e assassinatos criado pelos órgãos de repressão da ditadura militar, que usou métodos ensinados pela CIA e o Escritório de Segurança Pública (OPS) dos EUA.

Esses dois órgãos forneceram assistência para os países que integraram a Operação Condor por meio de manuais bem específicos sobre como os dissidentes deveriam ser tratados pelos policiais e oficiais.

Muitos deles receberam treinamento na Escola das Américas, fundada em 1946 no Panamá para formar militares da América Latina e do Caribe na doutrina da segurança nacional, tida como a base de toda a operação. Na instituição, os aprendizes eram treinados em abusos de direitos humanos e, antes de torturar, eles foram ensinados a como sumir com as pessoas.

(Fonte: Canal Ciências Criminais/Reprodução)(Fonte: Canal Ciências Criminais/Reprodução)

Uma vez encarcerados, os dissidentes eram colocados em interrogatórios que poderiam durar meses, onde eram brutalmente torturados. No regime paraguaio de Alfredo Stroessner Matiauda, os métodos usados pela Direção Nacional de Assuntos Técnicos incluíam inserir agulhas sob as unhas, submersão em banheira de dejetos e crucificação. Já no Brasil, de Castelo Branco a Emílio Médici, os militares aprenderam técnicas francesas de tortura que envolviam espancamento para induzir abortos, choques elétricos nas genitálias e empalação.

Só no Chile e Paraguai, de 40 mil a 70 mil pessoas desapareceram durante a Operação Condor, mortas por acidente ou intencionalmente, durante ou após os interrogatórios perturbadores. Os cadáveres foram despejados em valas comuns no Chile, sepultados em várias regiões do imenso deserto do Atacama, que possui restos mortais de ativistas e indígenas.

A Argentina usou o método denominado "voo da morte", em que os corpos eram lançados de aviões para a imensidão do oceano Atlântico. E para impedir que os restos mortais chegassem até as praias, os oficiais removiam os intestinos das vítimas para que gases não se acumulassem neles e fizessem o cadáver flutuar.

Assim foi até o fim da Operação Condor, em meados de 1983, quando as ditaduras militares de direita começaram a cair por todos os países ocupados.

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