Artes/cultura
08/06/2023 às 04:00•2 min de leitura
Sempre que vemos uma série com uma base histórica real, surge aquela dúvida sobre o que é verdade ou ficção na trama contada a cada semana. É claro que Rainha Charlotte: Uma História Bridgerton, um spin-off de Bridgerton, não é uma exceção dessa regra e deixou vários de seus fãs bem curiosos sobre os acontecimentos exibidos em seus seis episódios. As duas séries contam com uma rainha Charlotte negra, interpretada por Golda Rosheuvel em Bridgerton e por India Amarteifio no spin-off em que a personagem aparece mais jovem.
A trama das séries, especialmente de Rainha Charlotte, possuem um grande foco em como a monarca teria aberto as portas para pessoas negras na sociedade inglesa do século XVIII após se casar com o rei George. É claro que não demora muito para surgir a dúvida sobre esta noção de igualdade racial que a série nos mostra, ainda mais pela época em que as tramas se passam, quando a escravidão ainda era legalizada no Reino Unido. Só que isso não significa que a ideia de uma rainha Charlotte negra tenha sido inventada por essas séries da Netflix.
A verdadeira Rainha Charlotte em um retrato de Johann Zoffany
Na verdade, essa possibilidade surgiu pela primeira vez em uma pesquisa conduzida pelo historiador Mario de Valdes Y Cocom. Em 1997, ele sugeriu que Charlotte seria uma descendente direta de Margarita de Castro y Souza, que é parente do rei D. Afonso III e sua amante moura Madragana Ben Aloandro. O historiador ainda argumenta que os "traços africanos característicos em diversos retratos da rainha" são prova de sua teoria, ainda ressaltando que os artistas da época suavizavam ou ignoravam traços que não "se encaixavam nos padrões de beleza do período".
Vale dizer que muitos outros historiadores são céticos quanto a essas afirmações de Valdes, incluindo Lisa Hilton, que em entrevista ao Insider, disse que o termo "mouro" era usado para se referir a qualquer pessoa que viveu durante o Império Mouro, sem levar em conta a sua etnia. Ainda segundo Hilton, mesmo se Madragana foi uma mulher negra, "após 500 anos, é extremamente improvável que vestígios da composição genética tenham aparecido nas feições de uma princesa do século XVIII".
A primeira aristocrata britânica negra, Dido Elizabeth Belle, e sua prima, Elizabeth Murray
O interessante é que mesmo que Charlotte não fosse negra como é retratado na série, isso não quer dizer que a aristocracia era composta apenas por pessoas brancas neste período. Como a Smithsonian Magazine relata, Dido Elizabeth Belle é considerada a primeira aristocrata britânica, tendo nascido em 1761 em consequência do relacionamento de um capitão da Marinha Real Britânica e uma escrava. Ela não tinha todos os privilégios de seus parentes brancos, mas ainda era tratada como parte da família e chegou a ser educada pela família de seu tio avô, o Conde de Mansfield.
Levando tudo isso em conta, é claro que não podemos esquecer que a intenção dos criadores de Bridgerton e Rainha Charlotte nunca foi a de mostrar exatamente o que aconteceu durante esse período histórico, mas sim de nos levar para essa versão alternativa e muito mais agradável de fantasia da aristocracia e realeza inglesa.