Estilo de vida
19/07/2023 às 13:00•2 min de leitura
Em 20 de julho começa a 8ª edição da Copa do Mundo FIFA de Futebol Feminino, na Austrália e na Nova Zelândia, onde a Seleção Brasileira Feminina estreará sob o comando da técnica sueca Pia Sundhage.
Apesar de uma longa trajetória na disputa mundial, nossa seleção segue sem nenhum título na competição. Na expectativa de mudar esse placar pela primeira vez na história, é impossível não lançar um olhar para a trajetória conturbada das mulheres brasileiras em um dos esportes mais machistas de todos os tempos.
Assim como na Europa, o futebol feminino no Brasil acontecia longe de clubes ou grandes ligas, esnobado. No entanto, isso mudou em 1940, quando a mídia descobriu jogos entre mulheres acontecendo no Estádio do Pacaembu, em São Paulo, gerando revolta em parte da sociedade. Imediatamente, foi lançada uma campanha de difamação para tentar proibir a prática.
Foi assim que dona Carlota Resende, a "mãe do futebol feminino", foi parar na cadeia.
(Fonte: Acervo Portuguesa de Desportos/Reprodução)
Apesar de o futebol ser considerado a modalidade mais democrática da esfera esportiva atualmente, nem sempre foi assim. Por muito tempo, desde sua chegada ao Brasil pelas mãos de Charles Miller, em 1894, o esporte era algo destinado apenas à elite branca e abastada.
Muitas lutas sociais foram necessárias para que o futebol alcançasse a periferia. Por décadas, grupos minoritários ou fora dos padrões sociais de suas épocas sofreram com o fantasma elitizado que rondava o futebol. Ao longo do caminho, enquanto muitas histórias e figuras essenciais foram descobertas, de Pelé a Ronaldinho Gaúcho, muitos tentaram ser apagados. E esse foi o caso de Carlota Alves Resende, mais conhecida como dona Carlota, a "mãe" do futebol feminino no Brasil.
Na época com 60 anos e moradora de Pilares, bairro no subúrbio do Rio de Janeiro, a dirigente brasileira se tornou uma figura influente entre os homens envolvidos na organização do futebol em bairros da capital carioca, responsável por montar times e coordenar partidas amadoras de futebol aos finais de semana. Não é para menos que sua casa se tornou a sede do Primavera A.C., um dos principais times femininos da década de 1930.
(Fonte: Uol/Reprodução)
Sendo mulher periférica e um sucesso em ascensão, dona Carlota Resende atraiu problemas. No início de 1940, o futebol feminino estava em intenso desenvolvimento devido aos seus esforços, tanto que as mulheres começaram a estampar jornais e até mesmo a receberem dinheiro para realizar jogos preliminares às partidas masculinas.
No final daquele ano, dona Carlota Resende já havia conseguido fazer do seu Primavera Athletico Club uma das agremiações de maior destaque, chamando atenção até do empresário argentino Alfonso Doce, que convidou o time para uma excursão ao Uruguai e Chile.
Foi então que, na mesma proporção que os jornais começaram a divulgar o sucesso de dona Carlota Resende, passaram a acusá-la de aliciar suas atletas. Eles também alegaram que o futebol feminino, na verdade, não passava de um esquema para ganhar dinheiro às custas de meninas jovens e pobres.
(Fonte: Futebol Feminino do Brasil/Reprodução)
As matérias atingiram um nível grotesco de difamação, apontando que não só as meninas poderiam ser recrutadas para a prostituição ativa em boates pelos Brasil, mas que isso de fato acontecia na casa de dona Carlota Resende, na rua Gaspar, 45. Com o local considerado um "antro de perdição e imoralidade", em janeiro de 1941, a mulher chegou a ser presa por 48 horas. Isso foi o suficiente para que fosse cancelada a excursão que transformaria a história do futebol feminino.
O golpe final, no entanto, ainda estava por vir. Em abril daquele mesmo ano, o artigo 54 do decreto-lei número 3.199, do governo de Getúlio Vargas, proibiu que mulheres praticassem esportes considerados "violentos" ou que não estivessem de acordo com o que se esperava da conduta de uma mulher da época.
Demorou até 1983 para que essa realidade fosse alterada e as mulheres voltassem a ocupar os gramados.