Ciência
23/11/2024 às 08:00•2 min de leituraAtualizado em 23/11/2024 às 08:00
Um aspecto pouco explorado pelos paleontólogos até hoje é a vida das crianças e adolescentes durante o Paleolítico Superior Europeu (entre 45 mil e 10 mil anos atrás), em suas comunidades. Um estudo recente, publicado na revista PLOS ONE, se baseou em pegadas e impressões de mãos para intuir o papel de jovens aprendizes na arte rupestre da época.
A coisa toda começou com o exame de fotos de alta resolução de 489 artefatos de cerâmica de Dolní Vestonice I e II, Pavlov I e VI e Predmostí, cinco sítios arqueológicos de República Tcheca. As duas questões da pesquisa foram: “1. Os produtos cerâmicos de aprendizes podem ser distinguidos daqueles feitos por especialistas? 2. Se sim, podemos dizer se esses aprendizes eram crianças?”.
As autoras do artigo, Rebecca Farbstein e April Nowell, ambas especialistas em pré-história da Idade do Gelo, apostam que eram crianças, e justificam em seu estudo: "as cerâmicas são menores, mais assimétricas e o resultado de sequências e técnicas de produção mais simples e curtas do que artefatos feitos de outros materiais. Além disso, eles demonstram um maior grau de experimentação, heterogeneidade tecnoestilística e improdutividade".
O que as especialistas estão tentando dizer na verdade é que, pelo nível de “barbeiragens” no manuseio da argila e das técnicas, só poderia se tratar de alguém que não sabia muito bem o que estava fazendo. E a prova disso são estatuetas humanas e de animais que, além de meio deformadas, são quebradiças e cheias de marquinhas de dedos.
Seja por não seguir as técnicas de cerâmica ao pé da letra, ou porque fizeram os objetos na base da farra que é comum a qualquer grupo de adolescentes, "muitas estatuetas e fragmentos de estatuetas exibem rachaduras típicas de choque térmico, indicando que as cerâmicas eram frequentemente queimadas antes de estarem suficientemente secas", diz o estudo.
Mas a assinatura definitiva veio das impressões digitais dos “artistas”, "e a maioria delas pertence a crianças", afirmam as autoras no estudo. As descobertas revelam insights importantes sobre o papel das crianças em sociedades antigas e que a aprendizagem lúdica não é assim tão nova como podemos pensar.
Em entrevista à Smithsonian Magazine, a antropóloga Jane Baxter, antropóloga da Universidade DePaul, em Chicago, e autora de A arqueologia da infância, afirmou que as evidências analisadas por Nowell e Farbstein "são incrivelmente fortes e também uma explicação realmente plausível para o que elas estão encontrando".
Para Baxter, que não participou da pesquisa, a compreensão é de que os donos desses artefatos eram comunidades fazendo nada muito diferente do que fazemos hoje. Quanto às crianças, parece que "estão praticando, experimentando e brincando com argila, e depois deixando tudo para trás quando terminam", conclui.
A prova definitiva de que os artesanatos eram feitos por crianças, explicou Nowell à Smithsonian Magazine, é que "Nenhuma peça de cerâmica foi encontrada em um enterro", mas perto da fornalha provavelmente usada para sua queima.