Ciência
18/10/2024 às 09:00•3 min de leituraAtualizado em 18/10/2024 às 09:00
A maior parte das religiões compartilha alguma visão sobre o que seria o céu – ou, dependendo da sua crença religiosa, sobre o paraíso. Este é o lugar para onde supostamente a gente vai depois da morte, caso tenha vivido uma vida digna. No outro extremo, para as pessoas "más", existiria o inferno, lugar reservado a tormentos que não têm fim.
Mas é claro que o conceito de céu não nasceu da noite para o dia: ele foi desenvolvido durante milênios. A Bíblia tem uma fortíssima participação nessa crença; mas, ainda assim, ela deixa muitas lacunas em aberto.
De acordo com estudos teológicos, ao longo dos primeiros 400 anos após a morte de Jesus, os cristãos imaginaram o céu como um lugar físico. Aí, no século 5, Santo Agostinho ajudou a criar uma imagem mais consolidada, ao descrever o paraíso como uma espécie de cidade organizada, onde as pessoas andavam por ruas reais e reencontravam parentes já mortos. Já alguns versículos do Apocalipse atribuem elementos materiais ao céu: lá seria um local com "ruas de ouro", e "um grande e alto muro com doze portões".
Por outro lado, no século 13, São Tomás de Aquino adotou uma visão mais metafórica do céu como um estado da alma. O Catecismo da Igreja Católica também diz: "o céu é o fim último e a realização dos anseios humanos mais profundos, o estado de felicidade suprema e definitiva", e que viver no céu significa "estar com Cristo".
A Bíblia também cria imagens do céu como um lugar utópico. Em Lucas, lemos o relato de um ladrão crucificado que pede a Jesus para se lembrar dele no "reino" de Jesus. Jesus usa a palavra "paraíso" em resposta, traduzida do grego "paradeisos", o que remonta ao paraíso original da história de Adão e Eva.
Existe uma razão que explica por que costumamos imaginar que o céu esteja acima da Terra (por consequência, claro, o inferno estaria abaixo). É até lógico: se os deuses realmente existem, provavelmente eles estariam acima de nós nos supervisionando. Já os mortos são enterrados, ou seja, estão abaixo de nós. Esse "desenho" condiz com a cosmologia judaica.
O céu cristão, portanto, surgiu da concepção do judaísmo: Sheol é vista como uma habitação turva e sombria dos mortos que está abaixo da superfície da Terra, mais comumente traduzida como "a sepultura". Já o Shamayim é o mundo acima, entendido como uma cúpula de água na qual as estrelas, o sol e a lua se fixam.
No Antigo Testamento, lemos várias vezes a expressão "o céu", "os céus" ou "o ar". Os escritores do Antigo Testamento pensavam em Shamayim como "a casa de Deus", conforme é documentado no Gênesis. Por sua vez, os escritores do Novo Testamento usaram a palavra "ouranos" para significar céu.
A Bíblia começa com um texto que diz: "No princípio, Deus criou os céus e a terra" (lembre que, como falamos, "céus" significa "shamayin"). Mas será que foi simples assim: Deus mandou criar o céu e a terra e foi isso?
É um pouco mais complicado que isso. Alguns versículos do Antigo Testamento repetem o Gênesis e dizem: "Eu sou o Senhor, o Criador de todas as coisas, que estendo os céus, que espalho a terra por mim mesmo". Só que quando Jesus (ou seja, uma divindade encarnada) entra em jogo, as coisas se tornam menos claras.
Em Colossenses, lemos isso: "Pois nele todas as coisas foram criadas". Mas Coríntios, no entanto, nos diz: "Para nós há um só Deus, o Pai, de quem todas as coisas são e para quem existimos, e um só Senhor, Jesus Cristo, por meio de quem todas as coisas são e por meio de quem existimos".
Essa certa confusão se dá porque a doutrina cristã da Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo) não surgiu até 325 d.C., e não aparece sempre na Bíblia de forma clara. Portanto, dentro do livro sagrado, a criação do céu não está exposta de maneira totalmente resolvida.
Quando se pensa no céu, muitos de nós podemos imaginar um lugar bonito e cheio de flores em que as pessoas "do bem" não param de chegar – mais ou menos como o paraíso mostrado na novela espírita A Viagem. Mas a Bíblia traz outras versões possíveis.
No livro de João, lemos isso: "Ninguém jamais subiu ao céu, exceto aquele que veio do céu — o Filho do Homem". Então isso significa que as pessoas que morreram não vão para o céu? Os teólogos dizem que há várias pistas na Bíblia, mas não respostas definitivas.
Há trechos no livro que mencionam cenas como essa: "Elias subiu ao céu num redemoinho". No livro de Lucas, Jesus fala para o ladrão crucificado ao lado dele: "Hoje você estará comigo no paraíso". Mas, sem dúvida, não encontraremos na Bíblia respostas claras sobre quem merece (ou não) ir para lá.