O incrível quase-desastre do edifício salvo por uma estudante

09/03/2023 às 12:003 min de leitura

Histórias de desastres costumam fascinar as pessoas... Mas essa história, onde o desastre só ficou no "quase", talvez seja ainda mais interessante. 

Tudo começa nos anos 1970, quando a grande empresa de serviços financeiros Citicorp estava planejando seu novo arranha-céu, em Nova York. Eles precisavam comprar os terrenos de uma igreja luterana — que se recusava terminantemente a sair dali, ainda que quantias exorbitantes fossem oferecidas. 

As duas partes só chegaram a um acordo quando a empresa aceitou os terrenos vizinhos e os "direitos aéreos" sobre o terreno da igreja. Esse é um tipo de acordo que típico de Nova York, onde o dono do terreno não permite construir no nível da rua — mas permite construir acima de sua propriedade. E assim o Citicorp criou um prédio único no mundo. 

Fonte: TripAdvisor/ReproduçãoFonte: TripAdvisor/Reprodução

Um prédio super diferente

Para construir acima da igreja, sem ocupar seu terreno, o arquiteto Hugh Stubbins criou um design bastante curioso: o corpo do prédio só começaria aos 34 metros de altura. Embaixo disso, estaria uma base central e quatro pilastras, suportando todo o prédio. 

Mas, pela localização da igreja, essas pilastras não poderiam ser colocadas nas quinas, o que seria o ideal. Elas seriam instaladas no meio de cada fachada. 

Os cálculos de uma estrutura tão diferente eram bem complicados — e ficaram a cargo de um dos engenheiros mais renomados da época, William J. LeMessurier. O principal problema, nos cálculos da estrutura, não é o peso do próprio edifício, mas sim a força dos ventos.

Para que o edifício conseguisse suportar fortes ventos sem pilares nas quinas, LeMessurier criou uma solução igualmente única. Colunas de aço em forma de "V" seriam colocadas nas laterais, conduzindo a força horizontal dos ventos até as pilastras no centro. Além disso, um amortecedor de massas — uma grande bola de concreto no topo do edifício — foi instalado para contrabalancear forças anormais. Tudo certo, não?

Fonte: ReproduçãoFonte: Reprodução

Um erro de cálculo fatal

Com a arquitetura única de Stubbins e as soluções de engenharia de LeMessurier, o Citicorp Center foi inaugurado com grande publicidade, em 1977. Na época, este era um dos prédios mais altos do mundo, com 59 andares e quase 300 metros de altura. 

Mas um ano depois disso, o escritório de LeMessurier recebeu uma ligação. A estudante de engenharia Diane Hartley afirmou que estava fazendo um trabalho sobre o Citicorp Center e estava intrigada com os cálculos. Segundo ela, o prédio realmente suportava os ventos que atingissem a lateral do prédio — mas, como as pilastras ficavam no centro, eram necessários reforços para aguentar ventos diagonais. Ou seja: como estava, o prédio poderia desabar.

Tanto o funcionário que atendeu Diane, quanto o próprio engenheiro tinham certeza de que seus cálculos estavam certos. Eles chegaram a discutir com a estudante, que insistiu em suas ideias. LeMessurier ficou com a pulga atrás da orelha e decidiu revisar os cálculos. 

Então, ele percebeu que a estudante tinha razão. Embora os cálculos previssem margens de segurança grandes, a estrutura foi enfraquecida quando os responsáveis pela obra decidiram economizar — colocando rebites na estrutura, ao invés de soldas, como LeMessurier previu. 

O prédio só resistiria aos ventos diagonais de uma tempestade com a ação do amortecedor de forças. A tal bola de concreto no topo. Contudo, este sistema depende de energia elétrica para funcionar. Se a luz acabasse durante a tempestade, o prédio poderia cair. 

Fonte: Pinterest/ReproduçãoFonte: Pinterest/Reprodução

Uma operação de salvamento em segredo

O brilhante engenheiro não sabia o que fazer com essa informação. Ele se isolou em sua casa de campo e chegou a contemplar o suicídio. Então, pensou em quantas vidas seriam perdidas caso o prédio desabasse — e decidiu agir. 

Ele se reuniu com os executivos do Citicorp e explicou que a estrutura precisava ser soldada. A diretoria, que temia um escândalo, aceitou realizar a obra. Mas em segredo. 

Entre junho e agosto de 1978, os soldadores — que assinaram acordos de confidencialidade — reforçaram a estrutura metálica do prédio. Enquanto isso, a empresa entrou em contato com a Prefeitura de Nova York para criar um plano de evacuação, caso o pior acontecesse. 

Isso porque a temporada de furacões estava quase se aproximando e, se o Citicorp Center não suportasse os ventos diagonais, até 18 quarteirões de Manhattan seriam destruídos. Um bizarro efeito dominó, em uma catástrofe sem precedentes. 

O plano de evacuação quase entrou em ação, quando o furacão Ella se aproximou da costa, no dia 31 de agosto. Felizmente, a tempestade desviou de Nova York e os reforços terminaram em setembro, continuando em segredo. Ou nem tanto... Já que a fofoca corria pela cidade. 

A fofoca correu por anos, a boca pequena, até que um jornalista norte-americano publicou um texto sobre o Citicorp Center, na revista New Yorker. Isso levou a BBC a fazer um documentário citando a tal "estudante que ligou para LeMessurier". Diane Hartley só soube que a sua ligação tinha salvo o prédio quando viu o documentário na BBC America, em 2000. 

Na mesma hora, ela telefonou para a BBC e se identificou. Agora, toda vez que essa história é contada, podemos lembrar da estudante que salvou Manhattan de um desastre. Hoje em dia, Diane é agente imobiliária em Washington — e o prédio, agora chamado de Citigroup Center, continua de pé. 

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