Ciência
16/12/2024 às 21:00•2 min de leituraAtualizado em 16/12/2024 às 21:00
O que nos diferencia dos outros animais é muitas vezes difícil de precisar. No caso dos neandertais, nossos primos distantes, as fronteiras entre “nós” e “eles” ficam ainda mais nebulosas. Fósseis descobertos na Caverna do Prado Vargas, no norte da Espanha, sugerem que eles também tinham um traço que muitos consideram bem humano: a capacidade de pensar além do imediato.
Um conjunto de 15 fósseis marinhos foi encontrado no local, datando de cerca de 40 mil a 55 mil anos atrás. Eles parecem ter sido coletados pelos neandertais não para uso como ferramentas, mas por curiosidade ou por razões estéticas e simbólicas.
Os fósseis, datados do Cretáceo Superior, incluíam caracóis e moluscos extintos, alguns trazidos de até 30 quilômetros. Sem utilidade prática aparente, exceto por um usado como ferramenta, eles levantam a questão: por que os neandertais os colecionavam?
Os pesquisadores têm algumas hipóteses intrigantes. Pode ser que esses fósseis tivessem valor ornamental, fossem usados em trocas ou até mesmo como presentes, dando pistas sobre a complexidade social desses hominídeos. Outra possibilidade é que eles estivessem associados a alguma forma de identidade cultural.
Alguns estudiosos chegam a imaginar que poderiam ter sido brinquedos para crianças, sugerindo uma dimensão lúdica à vida neandertal. É tentador pensar em crianças da pré-história brincando com esses fósseis, talvez os organizando em jogos ou simplesmente fascinadas pelas formas inusitadas.
Essa descoberta não é a primeira a indicar que os neandertais apreciavam objetos sem utilidade prática imediata. Em outros sítios arqueológicos, foram encontrados cristais de quartzo, conchas marinhas e até crânios de animais com chifres, todos aparentemente coletados por seu apelo visual.
Além disso, sabemos que eles já demonstravam comportamentos simbólicos complexos, como o uso de pigmentos, a criação de ornamentos e até a pintura em paredes de cavernas. O colecionismo de fósseis reforça essa ideia de que os neandertais eram muito mais sofisticados do que costumávamos acreditar.
O hábito de colecionar coisas, ao que parece, é profundamente enraizado em nossa história evolutiva. Não somos apenas Homo sapiens que gostam de juntar figurinhas, meias coloridas ou modelos de ação; nossos antepassados remotos também pareciam encontrar valor em objetos que transcendiam a funcionalidade.
Evidências anteriores apontam que esse comportamento pode ter começado com espécies ainda mais antigas, como o Australopithecus africanus, que, há cerca de 3 milhões de anos, teria coletado uma pedra de jaspe que lembrava um rosto humano.
A análise dos fósseis de Prado Vargas mostra que eles podem ter sido vistos como “pequenos tesouros”. Talvez os neandertais estivessem tentando entender o mundo ao seu redor, fascinados por essas relíquias de um tempo em que os dinossauros ainda dominavam o planeta.
Ou talvez, como muitos de nós, eles simplesmente gostassem de coisas bonitas e diferentes. Seja qual for a explicação, o que fica claro é que esses hominídeos não eram os brutos simplórios que por muito tempo imaginamos.
O estudo dessas coleções nos aproxima de um entendimento mais amplo do que significa ser humano — e nos lembra que a curiosidade e o apreço pelo desconhecido são traços que compartilhamos com nossos parentes distantes. Afinal, o desejo de colecionar e atribuir significado ao que colecionamos pode ser tão antigo quanto a própria humanidade.