Artes/cultura
23/09/2024 às 18:00•3 min de leituraAtualizado em 23/09/2024 às 18:00
O mistério de como o imponente Crystal Palace (Palácio de Cristal) foi erguido em apenas 190 dias, na Londres vitoriana, finalmente foi resolvido. O segredo da construção ultrarrápida desse marco arquitetônico, que abrigou a Grande Exposição de 1851, estava escondido na simplicidade das porcas e parafusos padronizados — uma inovação que, apesar de parecer banal hoje, revolucionou o mundo da engenharia na época.
Com 30 mil dessas peças conectando as colossais 3.300 colunas de ferro fundido, o palácio tornou-se o maior edifício do mundo e um símbolo do poder industrial da Grã-Bretanha.
O Crystal Palace, projetado por Joseph Paxton (1803-1865), foi encomendado para ser construído no Hyde Park, em Londres, e seria o centro de uma exposição internacional que atrairia cerca de seis milhões de visitantes, incluindo nomes ilustres como Charles Darwin e Charlotte Brontë.
No entanto, apesar de sua grandiosidade, o verdadeiro enigma por mais de 170 anos foi como o edifício, com suas vastas dimensões e complexidade estrutural, pôde ser concluído em tão pouco tempo. A resposta veio de um estudo recente liderado pelo professor John Gardner, da Universidade Anglia Ruskin.
Gardner e seu colega, Ken Kiss, curador do Crystal Palace Museum, descobriram que o palácio foi o primeiro grande projeto a utilizar parafusos padronizados, desenvolvidos pelo engenheiro Joseph Whitworth (1803-1887) em 1841.
Antes da padronização, cada parafuso e porca era fabricado individualmente por artesãos, o que tornava praticamente impossível substituir peças perdidas ou quebradas sem longos atrasos. Nesse contexto, grandes construções dependiam de tijolos e argamassa, materiais mais tradicionais e demorados de se trabalhar.
Por isso, o Crystal Palace representou uma ruptura com essa abordagem, utilizando o conceito inovador de roscas e parafusos do mesmo padrão, o que permitiu um ritmo de construção muito mais rápido. Essas peças, feitas em diferentes oficinas e encaixadas com precisão em todas as partes do edifício, garantiram a eficiência necessária para completar a obra no prazo estabelecido.
O edifício, com mais de 560 metros de comprimento e 92 mil metros quadrados de área, foi um feito extraordinário. Seu telhado de vidro maciço era sustentado pelas 3.300 colunas de ferro fundido, todas interligadas pelos parafusos padronizados de Whitworth.
Após a exposição, o palácio foi transferido para Sydenham, no sul de Londres, onde ficou até ser destruído por um incêndio em 1936. Durante esse processo, muitos parafusos originais se perderam, atrasando a descoberta desse detalhe crucial. Uma escavação recente, porém, revelou os últimos parafusos restantes, permitindo que Gardner e Kiss os analisassem.
Os pesquisadores confirmaram que os parafusos seguiam o padrão criado por Whitworth, conhecido como British Standard Whitworth (BSW), e que esses mesmos padrões só se tornaram oficialmente adotados pelo Reino Unido mais de 50 anos depois, em 1905.
A introdução da padronização não apenas acelerou a construção do Crystal Palace, mas também foi um marco que impactou o desenvolvimento da engenharia industrial global.
Logo após o sucesso da construção, a demanda por parafusos padronizados cresceu exponencialmente, tornando-se a base para inovações que incluíram a produção em massa de motores a vapor e equipamentos militares, como as canhoneiras da Guerra da Crimeia.
A solução do mistério do Crystal Palace mostra que, por trás da grandiosidade da arquitetura vitoriana, a revolução estava nos simples, mas transformadores, parafusos padronizados. Sem eles, esse marco da engenharia não seria possível, e o avanço foi essencial para fortalecer a posição da Grã-Bretanha como potência industrial e militar no século XIX.