Ciência
02/12/2013 às 10:50•3 min de leitura
Você acordou no horário hoje? Conseguiu se aprontar, tomar café da manhã e chegar à escola, à faculdade ou ao trabalho na hora certa? Então agradeça ao seu cérebro por ajudar você a calcular o tempo adequadamente, afinal nossa capacidade de detectar a passagem do tempo é uma habilidade fundamental na rotina do dia a dia.
Mas como será que o cérebro consegue ter um relógio tão apurado? Neurocientistas acreditam que nós temos sistemas neurais distintos para processar diferentes tipos de tempo, como para manter o ritmo circadiano, por exemplo, ou para controlar os movimentos do corpo e para manter a consciência da passagem do tempo.
Até recentemente, os cientistas acreditavam que esse último tipo de processamento – que faz você perceber que já está a muitas horas assistindo televisão, por exemplo – é mantido por um único sistema cerebral. No entanto, novas pesquisas indicam que a teoria de que temos apenas um relógio neural é muito simplista.
Contrariando os estudos realizados até então, uma pesquisa feita pelos neurocientistas da Universidade da Califórnia e publicada no periódico Journal of Neuroscience revelou que nós temos um método alternativo para compreender a passagem do tempo. Mais do que isso, os responsáveis pelo estudo sugerem que nós temos um segundo relógio biológico que funciona em paralelo com nosso relógio neural primário.
Fonte da imagem: Reprodução/Shutterstock
Levantamentos anteriores sugeriam que uma região do cérebro conhecida como corpo estriado seria a responsável por nosso relógio biológico, trabalhando em parceria com outras partes do córtex para integrar as informações temporais. Um indício dessa função pode ser encontrado em pacientes com Doença de Parkinson, que é um problema degenerativo que interrompe a entrada de informações no corpo estriado e faz com que as pessoas tenham dificuldades em notar a passagem do tempo.
Mas essa consciência demanda que o cérebro não meça apenas o tempo, mas mantenha uma memória do período que já se passou. A ciência sabe há muito tempo que o hipocampo é uma estrutura fundamental para relembrar experiências passadas. Por esse motivo, eles acreditam que essa parte do cérebro também esteja relacionada com a nossa noção de tempo.
Estudos registraram os impulsos elétricos da atividade cerebral de animais e mostraram que os neurônios presentes no hipocampo sinalizam momentos específicos no tempo, mas o hipocampo nem sempre é utilizado para registrá-lo. Na verdade, pessoas que sofreram danos no hipocampo conseguem se lembrar facilmente de períodos curtos de tempo, mas têm dificuldades para retomar longos intervalos. Todas essas conclusões levaram os pesquisadores a associar o hipocampo ao nosso relógio biológico.
Para comprovar sua teoria, os neurocientistas realizaram testes com ratos utilizando um sistema de treinamento e injetando uma substância química que bloqueava as funções do hipocampo temporariamente. Dessa maneira, eles concluíram que essa parte do corpo é importante para distinguirmos entre intervalos de tempo semelhantes, mas não se faz necessário quando os intervalos são muito diferentes.
Isso os fez concluir que, por mais que a estrutura tenha algum papel na nossa percepção de tempo, essa função é muito específica e serve apenas para diferentes períodos similares em longas escalas, ou seja, é uma questão de minutos. Se você conseguir discernir se seu banho durou 10 ou 15 minutos, por exemplo, isso é graças ao seu hipocampo. Mas quando você percebe a diferença entre 60 ou 90 segundos, outras regiões do cérebro estão trabalhando no seu relógio interno.
Fonte da imagem: Reprodução/Shutterstock
O hipocampo pode não ser confiável para eventos que acontecem em uma escala de segundos, mas certamente ele consegue perceber a rápida passagem dos momentos. Se considerarmos que o corpo estriado é capaz de registrar o tempo em segundos, os autores propõem que as duas estruturas competem. Uma prova disso é que, quando o hipocampo é bloqueado, o corpo estriado tem liberdade para funcionar de maneira mais efetiva do que o usual, como foi demonstrado a partir dos testes com os ratos.
Logicamente, danificar o próprio hipocampo apenas para calibrar melhor o seu relógio biológico é uma opção que traria uma série de consequências. Porém, se isso realmente fosse possível, os pesquisadores acreditam que teríamos uma habilidade muito maior de registrar a passagem de pequenos períodos de tempo.
Como se descobriu que as duas estruturas funcionam separada e antagonicamente, o próximo passo do estudo é entender se existe alguma relação inibidora entre o hipocampo e o corpo estriado que faça com que um pare de funcionar quando o outro está ativo.