Artes/cultura
27/09/2021 às 12:00•3 min de leitura
Em uma época em que as mulheres viviam até os 42 anos e os homens até os 40, em meio a taxas de mortalidade altas devido à falta de estudos para tratar doenças como cólera, escarlatina, febre tifoide e varíola; a obsessão pelo luto na Era Vitoriana se tornou uma espécie de “tendência”, bem mais que um estado de espírito.
Quando o Príncipe Albert faleceu, em 14 de dezembro de 1861, a rainha Vitória lamentou por 40 anos sua perda, vestindo-se com um traje preto em homenagem e respeito ao seu eterno vazio espiritual.
E, ainda que ela não tenha sido a responsável por iniciar a exaltação do luto e da morte, foi ela quem o alavancou em todo o Reino Unido.
(Fonte: My Tributes/Reprodução)
Naquele período, a morte foi considerada uma visitante frequente, mas inesperada, então as mães e jovens aprendiam a planejar desde cedo seu velório — ainda mais porque os enterros eram vistos como sagrados, e as pessoas temiam que seus cadáveres não ascendessem aos céus se não fossem enterrados de maneira apropriada.
Portanto, poupar dinheiro era uma das regras principais entre os pobres, que guardavam o pouco que tinham para uma digna ideia de eternidade em um futuro incerto. Para baratear o processo, as mulheres costumavam se reunir para tecerem as próprias mortalhas enquanto discutiam sobre circunstâncias banais de suas vidas, inclusive da própria morte — que aprenderam a falar sem tabus desde criança.
Organizar o próprio velório e enterro como se fossem uma cerimônia de casamento era um passatempo comum entre os vitorianos, deixando uma espécie de testamento em que os que ficaram vivos deveriam seguir à risca seus gostos para o evento ecumênico.
(Fonte: Pinterest/Reprodução)
O luto tinha regras de etiqueta rigorosas que também deveriam ser seguidas. Elas abrangiam desde quanto tempo se deveria lamentar até o que poderia ser usado em cada fase. Houve três períodos distintos de luto: luto profundo ou luto completo; segundo luto; e o meio luto. A duração de cada um deles dependia da relação com o falecido. As mulheres que perdiam seus maridos, por exemplo, deveriam permanecer em luto profundo por 2 anos, evitando que fossem confortadas por outras pessoas.
Os homens precisavam usar apenas luvas pretas, terno escuro e uma faixa preta em volta do chapéu para ressaltarem que estavam enlutados. Para as crianças não havia regras específicas para usarem preto, mas as meninas costumavam ser vestidas com branco.
Por outro lado, a etiqueta do luto para as mulheres jovens e adultas era muito mais rígida, visto que as vestimentas precisavam externar seus sentimentos íntimos. Sugeridos em manuais femininos sobre etiqueta lutuosa, como o The Queen e o Cassell's, os vestidos eram desconfortáveis e potencialmente perigosos.
(Fonte: MoMu/Reprodução)
Para os períodos de luto profundo, todo o vestuário deveria ser em preto, simbolizando a “escuridão do estado espiritual”. Os vestidos eram feitos de seda paramatta não reflexiva, com a bombazine barata, e adornados com crepe. Áspero e rugoso, o crepe foi associado ao luto porque era considerado um tecido que não combinava bem com nenhuma roupa.
Além desses componentes, os vestidos também carregavam anáguas de crinolina feitas de um tecido rígido altamente inflamável, que geralmente se incendiavam com o calor dos fogões enquanto as mulheres cozinhavam.
(Fonte: Pinterest/Reprodução)
À medida que o luto avançava, a cor do tecido ia ficando mais clara, passando do preto para um tom de cinza, depois o malva até chegar no branco — considerado o “meio luto”.
As mulheres só podiam usar joias durante a segunda fase do luto, porém feitas de azeviche, um material duro e preto parecido com o carvão. Os broches, anéis e medalhões eram muitas vezes enrolados com fios de cabelo da pessoa falecida.
Com o passar dos anos, a sociedade em geral se desprendeu da ideia de exaltação da morte. Antes discutida sem problemas, a morte hoje é evitada veementemente até o último momento, bem como as joias de luto que, em alguns casos, foram reduzidas a uma urna funerária.
É provável que, na modernidade, os vitorianos não fossem saber como conviver sem discutir sobre a única certeza que teriam em vida.