Artes/cultura
13/04/2022 às 06:30•3 min de leitura
No Brasil, todo 29 de janeiro marca o Dia Nacional da Visibilidade Trans. Essa data objetiva promover reflexões sobre a cidadania das pessoas travestis, transexuais (homens e mulheres trans) e não-binárias (que não se reconhecem nem como homens nem como mulheres).
O dia foi escolhido porque, em 29 de janeiro de 2004, um grupo de ativistas transgênero esteve no Congresso Nacional para se manifestar em favor da campanha "Travesti e Respeito", em um ato político, que posteriormente se tornou histórico, em prol do respeito à diversidade de identidade de gênero no Brasil.
Mas por que é importante discutir isso? Porque, mesmo em pleno século XXI, as pessoas trans e não-binárias seguem sendo alvo de muito preconceito e violência — em parte, por conta da desinformação de uma camada da população. Por isso, é necessário levantar quais são os equívocos mais comuns que são cometidos em relação a essas pessoas.
(Fonte: Direito Administrativo)
É comum que as pessoas confundam os conceitos de sexo (que tem a ver com a biologia) e gênero (focado na questão da identidade, que se relaciona a como a pessoa se vê). O sexo de um sujeito costuma ser determinado por um médico logo após o nascimento do bebê, baseado na genitália externa. Ainda assim, vale lembrar que uma parcela das pessoas (estima-se que seja 1% a 2% da população mundial) é de intersexuais — indivíduos que têm características sexuais que não se encaixam nas noções típicas de sexo feminino ou masculino.
Já o gênero é um conceito menos focado em uma análise clínica ou biológica. A Human Rights Campaign já definiu a identidade de gênero como “o conceito mais íntimo de si mesmo como masculino, feminino, uma mistura de ambos ou nenhum — como os indivíduos se percebem e como eles se chamam”.
Nesse sentido, a pessoa que se posiciona como transgênero é aquela que não se identifica com o gênero que lhe foi atribuído ao nascer. Se ela nasceu com órgãos sexuais femininos, ela foi biologicamente definida como mulher, mas pode desenvolver uma identidade mais voltada a outro gênero, como o masculino. Seria, neste caso, um homem trans.
Já a pessoa não-binária é a que não se percebe como pertencente a um único gênero. Sua identidade, portanto, se expressa para além do feminino e masculino (ou seja, uma visão centralizada na binaridade).
O termo não-binário é bastante amplo e acaba funcionando como um grande guarda-chuva que engloba vários modos de identificação, como o agênero (não se encaixa em masculino e feminino), bigênero (identidade de gênero ambígua), genderfluid, entre vários outros.
(Fonte: QG Feminista)
Em 2020, a escritora J.K. Rowling, famosa por ter criado a saga de livros sobre Harry Potter, causou revolta por comentários considerados transfóbicos. Ela compartilhou um texto do jornal The Times que tecia críticas à polícia escocesa por registrar estupros cometidos por pessoas com genitais masculinos como crimes realizados por mulheres, uma vez que o criminoso se identificou dessa forma. J.K. Rowling escreveu: “Guerra é paz. Liberdade é escravidão. Ignorância é força. O indivíduo com pênis que estuprou você é uma mulher.”
O comentário da escritora levantou uma série de discussão sobre as confusões entre gênero e a presença, ou não, de genitais femininos ou masculinos. Há aqui um equívoco, comumente cometido, sobre se uma pessoa trans seria aquela que operou seus genitais para adequar-se ao gênero com o qual se identifica. E a resposta é: não, isso não define quem é uma pessoa trans.
A professora Katie Spencer, diretora do Centro Nacional de Saúde do Espectro de Gênero em Minneapolis (Estados Unidos) diz que é equivocado pensar em hormônios sexuais como definidores do gênero de uma pessoa. "Homens cis têm estrogênio e mulheres cis têm testosterona, sem mencionar a grande variabilidade entre indivíduos intersexuais. Na verdade, todos nós temos uma mistura de hormônios em nossos corpos", explica.
A discussão sobre a presença de hormônios no organismo ainda tem gerado muita polêmica — por exemplo, o debate sobre atletas trans em esportes de alta performance. Mas há um erro em definir o gênero em termos de funções corporais — como, por exemplo, o fato de uma pessoa menstruar, engravidar, ou desenvolver testículos.
Katie Spencer ainda esclarece que há pessoas trans que não tomam hormônios ou fazem cirurgia, assim como há pessoas cisgênero (as que se identificam com o gênero que foi designado a elas ao nascer) que tomam hormônios suplementares, bem como mulheres cisgênero que não menstruam. Por isso, a clareza entre a diferença entre os dois conceitos — sexo e gênero — é fundamental para que as pessoas possam ser respeitadas e tenham seus direitos protegidos.