Como fazer os jovens gostarem de música clássica?

16/11/2022 às 10:205 min de leitura

Quando você vê um adolescente andando na rua com seus fones brancos firmemente presos aos ouvidos, balançando levemente o corpo como se fosse um bosque sacudido por uma brisa interior, você pode ter uma certeza quase absoluta que não é música clássica o que ele está ouvindo.

Qualquer um de nós pode verificar esse fato por conta própria: a maioria dos adolescentes consegue citar entusiasticamente o nome de dezenas de bandas e artistas de pop ou funk, os últimos lançamentos ou o que está em suas listas de reprodução favoritas. 

Mas tente perguntar a eles quem foi Johann Sebastian Bach, Richard Wagner ou Johannes Brahms, por exemplo, e provavelmente você notará um tipo engraçado de olhar vidrado e perdido.

Fonte: Andrea Piacquadio / Pexels/ Reprodução)Fonte: Andrea Piacquadio / Pexels/ Reprodução)

Segundo oThe National Endowment for the Arts, em 2008, somente 8,8% dos estadunidenses haviam visto uma apresentação de música clássica nos últimos 12 meses. Décadas antes disso, esse percentual era de 11,6%. E tem mais, naquele ano, somente 3% das gravações vendidas consistiam de música clássica, bem como apenas 3% dos ingressos de shows vendidos eram para concertos clássicos.

De lá para cá, a situação não mudou muito. Os millennials e a geração Z estão ouvindo bem menos música clássica que as anteriores. Se nada for feito, possivelmente, a geração Alpha, aqueles nasceram após 2010 e que serão a maioria da humanidade a partir de 2025, seguirão pelo mesmo caminho.

De quem é a culpa?

(Fonte:Eleazar Ceballos/ Pexels/ Reprodução)(Fonte:Eleazar Ceballos/ Pexels/ Reprodução)

Mas será possível atribuir o desinteresse do jovem pela música clássica a algum culpado? Para alguns, computadores, smartphones e consoles de games talvez possam ser responsabilizados pela baixa popularidade desse estilo musical entre os adolescentes. Para outros, isso não explica toda a questão: boa parte dos jovens simplesmente acha a música clássica chata. Claro que isso não se aplica a todos.

Crianças e jovens são agitados e emocionais, falam rápido e pensam da mesma forma. Então, nada mais natural que preferirem que sua música também seja rápida e "mexa" de alguma forma com suas emoções. O ritmo da música clássica, com suas muitas paradas e recomeços, longos momentos, mudanças de humor e dinâmica, sem contar o andamento, é o oposto do que psique turbinada desse grupo deseja.

O gênero pop, por exemplo, tem músicas estruturalmente mais simples e apelativas que funcionam como ímãs para a mente da juventude. Além disso, a temática da música pop atrai mais os adolescentes que a complexidade multifacetada da música clássica.

(Fonte: Kampus Production/ Reprodução/ Pexels)(Fonte: Kampus Production/ Reprodução/ Pexels)

Colin Eatock, um compositor canadense, pesquisou entre seus alunos da Universidade de Toronto o motivo pela falta de apelo da música clássica entre os jovens. Em termos gerais, as razões apontadas pelos estudantes (que incluíam alunos com mais de 40 anos) poderiam ser divididas em duas categorias: coisas que as pessoas não gostam na cultura que cerca a música clássica e coisas que as pessoas não gostam como a música clássica soa.

Sobre isso, o próprio Eatock aponta um aspecto interessante: a música clássica é puramente instrumental, não existe texto para dar significado às composições. E quando temos cantores, óperas e concertos, o estilo vocal soa antinatural e artificial, com muitos gritos e berros. Ou seja, mesmo que não estejam cantando em uma língua estrangeira, as palavras são praticamente ininteligíveis. Desnecessário dizer o quanto isso pode parecer absurdo para um jovem de hoje.

Afinal, quantos adolescentes você conhece que gostam de permanecer parados por mais de uma hora para admirar e aproveitar a sutileza de qualquer coisa? Isso nos faz lembrar daquela imagem de um grupo de adolescentes em um museu concentrados em seus smartphones, não nas obras de arte, que viralizou há algum tempo na internet.

A boa notícia é que os serviços de música clássica ainda resistem, sejam do jeito tradicional, em salas de concerto, ou modernizados em plataformas de streaming de música e vídeo.

No entanto, são muito mais caros de serem consumidos hoje em comparação com algumas décadas atrás. Nos anos 1970 e 1980, por exemplo, era possível até ter acesso à música erudita de graça. Aliás, é importante considerar que a música é algo que está deixando de fazer parte da educação escolar de cada vez mais crianças e adolescentes.

Como despertar o interesse dos jovens pela música clássica

(Fonte: Ð?ng Thanh Tú/ Pexels/ Reprodução)(Fonte: Ð?ng Thanh Tú/ Pexels/ Reprodução)

Como os jovens consomem música hoje é bem diferente do que as gerações anteriores faziam. A grande questão é que não existe uma única solução para fazer com que crianças e adolescentes passem a gostar de música erudita.

Aliás, cabe aqui uma observação: gostar é uma palavra um tanto específica, afinal, gostamos ou não de algo com base em nossas experiência, cultura, sentimentos e expectativas. Então, interesse seria um termo mais apropriado.

Dito isto, alguns possíveis caminhos para atrair a atenção dos jovens e despertar seu interesse pela música clássica apontados por pesquisadores, empresários do setor musical, especialistas em música erudita e professores de música são bastante diversos. Alguns deles incluem:

1. Fazer com que a música clássica deixe de ser considerada “melhor” que outros estilos musicais ou elitista. De forma direta, diga a um adolescente para conhecer algo elitista que ele, provavelmente, recusará. Afinal, querem seguir os caminhos que sua tribo trilha. Faz parte da juventude.

2. Integrar conservatórios em escolas e universidades também é uma saída. Os jovens tendem a fazer aquilo que seus amigos fazem. Se um universitário que estuda economia tem um amigo que gosta e estuda música clássica, há uma grande probabilidade de ele acompanhar o colega a uma apresentação. 

O importante é que seja no mesmo lugar, isto é, se os jovens com interesse em música clássica estiverem em uma instituição educacional separada, eles terão bem poucos amigos não músicos para "fisgar".

(Fonte: Kostiantyn Klymovets/ Pexels/ Reprodução)(Fonte: Kostiantyn Klymovets/ Pexels/ Reprodução)

3. Quanto mais barato melhor. Mas aqui é um meio-termo. Boa parte dos ingressos para concertos clássicos são adquiridos por jovens que já estudam música ou por admiradores do estilo. Logo, seria necessário encontrar uma maneira de atrair os curiosos musicalmente. Talvez, investindo em um marketing mais atual e viral.

4. Educar o jovem seria outra forma de despertar o interesse dele por compositores clássicos. O problema está na maneira como isso é feito atualmente — e quando é feito. Por exemplo, talvez ele até tenha ouvido falar sobre Mozart ou Beethoven, mas provavelmente se perguntará quem esse tal de Rautavaara ou como se pronuncia Korngold ou Berlioz. 

Desenvolver programas temáticos ou algo mais criativo para apresentar os compositores clássicos gradativamente aos jovens poderia ser uma solução, mesmo que fosse preciso apostar no interesse deles por instrumentos ou até apelar para o emocional.

5. Mostrar que a música clássica combina com quase tudo também constituiria um bom caminho. Por exemplo, não é raro que hoje bandas de heavy metal a artistas de música pop desenvolvam algum projeto com uma orquestra sinfônica. Trilhas sonoras de games, seriados e filmes poderiam contribuir muito nesse sentido.

6. O conceito de concertos clássicos pode ser algo assustador como experiência para os jovens. Temas tediosos e músicos vestindo smokings com caudas é algo que possivelmente os desanima e os faz reafirmar ainda mais a ideia de que a música clássica é anacrônica e arcaica. Isso poderia ser “atualizado” sem perder a originalidade. 

7. A música clássica precisa ser fácil para o jovem. Por exemplo, é mais prático para ele se interessar por jazz, blues ou qualquer outra coisa que não precise de uma explicação pré-show. 

Isso significa que estudiosos do assunto, compositores, músicos, professores e maestros precisariam encontrar uma forma de tornar o conceito de música erudita algo que possa ser descoberto facilmente por quem não tem uma gota de conhecimento sobre o segmento. Ou mais tragável por quem tem curiosidade

Um caminho complicado

(Fonte: Gustavo Anacleto / Pexels/ Reprodução)(Fonte: Gustavo Anacleto / Pexels/ Reprodução)

Na internet há uma série infinita de artigos sobre “Como fazer com que os jovens gostem de música clássica”. Alguns reúnem aspectos interessantes, como os que compilamos acima, mas não existe um consenso sobre isso. Além disso, a maioria falha em um ponto muito importante: o fator gostar. Se o jovem não é guiado pela música clássica, dificilmente se interessará por ela. Ou ela o pega, ou não!

Nenhuma quantidade de pressão ou convencimento fará com que eles gostem de algo que não querem ou não pensam em gostar. E esse é o maior erro cometido quando se tenta apresentar a música clássica ao público jovem. Afinal, se existe um grupo que odeia que algo seja “enfiado goela abaixo” é este.

(Fonte: Andrea Piacquadio/ Pexels/ Reprodução)(Fonte: Andrea Piacquadio/ Pexels/ Reprodução)

Finalmente, o tecido musical da vida cotidiana da juventude atual não é bem uma coisa sinfônica. Pense bem, quantos games, programas de televisão ou canais do YouTube usam a música clássica de alguma maneira? Não muitos, podemos apostar.

Talvez, o primeiro passo para fazer com que crianças, adolescentes e jovens mais velhos se interessem e passem a gostar de música clássica é integrá-la às suas vidas e rotinas sem forçar a barra. 

Mas é aqui que encontramos o trabalho mais difícil de todo o processo, pois envolve a educação recebida em casa, a escola, o comportamento do mercado de entretenimento que gosta do lucro e a própria psique do jovem, que deve ser a primeira coisa considerada quando se deseja apresentar algo para ele. 

Para entender o quanto isso é complicado, basta considerar o relatório da The Audience Agency , segundo o qual “o público da música clássica está concentrado nas faixas etárias médias e idosas, com 42% na faixa etária de 41 a 60 anos e 37% acima de 61 anos”.

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