Dom Hélder Câmara: o arcebispo perseguido pela ditadura militar

23/04/2023 às 08:003 min de leitura

Nara Leão, Raul Seixas, Chico Buarque e Paulo Coelho. Esses são alguns nomes das pessoas que foram resistência mesmo em meio a um dos períodos mais repressivos da história do Brasil, a Ditadura Militar, imposta após o Golpe de 1964, que derrubou o governo e aparelhou todos os aspectos da vida social brasileira, prometendo uma aceleração econômica ilusória, proteção e prospecção por meio da criminalização de qualquer tipo de oposição ou dissidência.

Em meio a isso estava Dom Hélder Câmara, o arcebispo “irmão dos pobres” que foi perseguido pelos militares.

Ideais diferentes

Dom Hélder Câmara. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)Dom Hélder Câmara. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)

Nascido Hélder Pessoa Câmara, em Fortaleza, Ceará, em 7 de fevereiro de 1909, o religioso ingressou no Seminário da Prainha em sua mais tenra idade, aos 14 anos, onde foi ensinado sobre filosofia e teologia.

Foi lá que ele aprendeu que qualquer tipo de ideal comunista deveria ser abominado e rejeitado veementemente. Por se tratar de um ensino muito conservador, Dom Hélder teve que deixar de fora o entendimento sobre os ideais do Iluminismo e da Revolução Francesa.

Em 1931, aos 22 anos, o religioso foi ordenado padre sob a tarefa de acompanhar os Círculos Operários Cristãos e a Juventude Operária Católica (JOC), contribuindo para a alfabetização dos adolescentes pobres. Filho de uma professora e um jornalista crítico teatral, Dom Hélder ajudou na organização sindical de mulheres em estado de vulnerabilidade à margem da sociedade, como lavadeiras e empregadas domésticas.

(Fonte: O Globo/Reprodução)(Fonte: O Globo/Reprodução)

Nada ironicamente, Dom Hélder acabou simpatizando com movimentos religiosos que rejeitavam o capitalismo, como a Legião Cearense do Trabalho, um grupo político-sindical que flertava com ideias da Idade Média sobre como a estrutura da sociedade, os costumes e o governos deveriam operar. Ele também fez parte da Ação Integralista Brasileira, que possuía inclinações fascistas ao reunir seus seguidores sob o lema "Deus, Pátria, Família".

Todo esse histórico fez o padre se destacar, sobretudo, como um dirigente político, na mesma proporção que líder religioso, tanto que conseguiu resultados expressivos para a Liga Eleitoral Católica no Ceará. Em meados de 1936, com apenas 27 anos, Dom Hélder já trabalhava como secretário estadual de educação no Ministério da Educação, no Rio de Janeiro.

Tudo isso mudou em 10 de novembro de 1937, quando Getúlio Vargas, por meio de um golpe de Estado, instituiu o então Estado Novo, dando início ao primeiro capítulo da ditadura no Brasil.

De símbolo a pária

(Fonte: Adveniat/Reprodução)(Fonte: Adveniat/Reprodução)

Com isso, Dom Hélder se desvinculou da AIB, voltando às raízes do que chamava "verdadeiro comprometimento" — no caso, com a Igreja e o povo. Ao longo dos 10 anos que permaneceu no Rio, onde foi ordenado bispo aos 43 anos, em 1952, ele estabeleceu compromissos com projetos sociais, fundando a Cruzada São Sebastião, o Banco da Providência — para viabilizar moradias populares —, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e o Conselho Episcopal Latino-Americano, com o aval do Vaticano.

Semanas antes do Golpe de 1964 de Castelo Branco, Dom Hélder foi designado arcebispo na Arquidiocese de Olinda e Recife, dando início ao seu período de perseguição ao longo de todo o regime opressor que o tornou de um ícone a um pária.

Apesar das determinações do AI-5, o religioso continuou falando em conferências e meios de comunicação internacionais sobre os crimes do regime ditatorial brasileiro, mesmo correndo risco de vida.

Em 1969, Dom Hélder flertou com a morte quando seu auxiliar, o padre Antônio Henrique Pereira Neto, foi assassinado por um grupo paramilitar chamado Comando de Caça aos Comunistas (CCC), apoiado e financiado pelos militares e empresários locais. Dias antes, a milícia havia metralhado o centro educacional Juvenato Dom Vidal, onde o padre trabalhava, deixando feridos e causando a paraplegia do estudante Cândido Pinto.

(Fonte: Brasil de Fato/Reprodução)(Fonte: Brasil de Fato/Reprodução)

O reconhecimento mundial de Dom Hélder como líder contra o autoritarismo e defesa aos Direitos Humanos, provavelmente, foi o que impediu que a ditadura o matasse, mas não que uma campanha difamatória de larga escala, inclusive internacional, fosse criada. Os militares tentaram incriminá-lo de todas as maneiras, acusando-o de contrabandear armas para grupos de guerrilha contra a ditadura.

Dom Hélder é o brasileiro que mais foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz por suas ações, reunindo 4 indicações, porém perdeu em todas às vezes devido à imagem que os militares criaram dele.

Dom Hélder Câmara deixou o comando da Arquidiocese de Olinda e Recife aos 76 anos, em 1975, para se aposentar e viver em uma pequena casa aos fundos da Igreja de Nossa Senhora das Fronteiras, onde permaneceu até 27 de agosto de 1999, seu último dia de vida.

Em 2015, o Vaticano o reconheceu como Servo de Deus, a primeira etapa para o processo de canonização por todos os seus feitos históricos na luta pelos pobres e oprimidos.

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