Anna Jarvis: a fundadora do Dia das Mães que tentou proibir a data

06/11/2023 às 14:004 min de leitura

Estima-se que há 2 bilhões de mães no mundo, portanto, não é surpresa que o Dia das Mães seja o segundo feriado mais lucrativo de todos, comemorado em mais de 100 países. Esse ano, a Federação Nacional do Varejo (NRF) prospectou que os norte-americanos deveriam gastar cerca de US$ 37 bilhões, quase US$ 4 bilhões a mais do que em 2022.

No Brasil, a data é comemorada sempre no segundo domingo de maio, diferente do que acontece em outros países, e também é considerada um fenômeno comercial. Esse ano, os pequenos e médios lojistas movimentaram R$ 189,5 milhões apenas em vendas digitais durante o período do feriado, um aumento de 33% com relação ao ano passado, como mostraram dados da Nuvemshop, plataforma para criação de lojas online líder na América Latina.

Em entrevista à Exame, Babi Tonhela, especialista em e-commerce da Nuvemshop, disse: “O Dia das Mães é uma das datas mais importantes para o varejo”. E foi exatamente por esse motivo que Anna Jarvis decidiu proibir o Dia das Mães.

As precursoras

Anna Jarvis. (Fonte: The Cambridge Room/Reprodução)Anna Jarvis. (Fonte: The Cambridge Room/Reprodução)

A princípio, a ideia do Dia das Mães surgiu a partir de a intenção em promover a paz. A ativista antiguerra Julia Ward Howe, autora de O Hino de Batalha da República, defendia a ideia de um "Dia da Paz das Mães", em que as mulheres pacifistas se reunissem em igrejas, salões sociais e lares para ouvir sermões, ensaios, cantar e orar pela paz.

Professora e diretora, a norte-americana Mary Towles Sassen escreveu um guia chamado Mother’s Day Celebrations, em 1887, na esperança de que os sistemas escolares dos EUA observassem a data inspirada por Howe para fortalecer os laços entre alunos, pais e professores. Mas essa ideia nunca saiu de sua cidade natal, em Henderson, no Kentucky.

Em fevereiro de 1904, um discurso feito por Frank Hering, membro do corpo docente da Universidade de Notre Dame, treinador de futebol e presidente nacional da Ordem Fraternal das Águia, ressaltou a importância das mães nas vidas das pessoas. Essa foi a primeira declaração pública que insistiu na ideia de homenagear as mães. 

É por isso que a organização ainda defende que Hering foi o verdadeiro fundador do Dia das Mães, quando Anna Jarvis, na verdade, foi a única que lutou para que isso fosse além de um discurso bonito para uma plateia emocionada.

Honrando mamãe

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Jarvis era filha de Ann Reeves Jarvis, que teve treze filhos, dos quais apenas quatro conseguiram atingir a idade adulta. Sua mãe sempre foi uma mulher muito ativa no que diz respeito à mobilização das mães para cuidar de seus filhos e desejava que esse trabalho fosse bem reconhecido. Muito disso, ela se inspirou nos pensamentos e atitudes da ativista Ward.

A partir de 1858, a mãe de Jarvis foi muito ativa na Igreja Metodista Episcopal, dirigindo Clubes de Trabalho voltado para os primórdios do Dia das Mães para combater as altas taxas de mortalidade infantil, principalmente devido às doenças que devastavam sua comunidade, em Grafton, Virgínia Ocidental. Ela também se envolveu na organização de um Dia da Amizade das Mães após a Guerra Civil Americana, visando a união das mulheres depois de tanta discórdia no país.

(Fonte: Gettyimages/Reprodução)(Fonte: Gettyimages/Reprodução)

No leito de morte de sua mãe, falecida em 9 maio de 1905, uma Jarvis devastada prometeu que a honraria realizando seu sonho de espalhar a palavra do Dia das Mães. Sua campanha foi bem diferente do que sugeria sua mãe, cujo trabalho era melhorar a vida dos outros. O lema de Jarvis para o Dia das Mães foi: “Para a melhor mãe que já viveu – sua mãe”. Ela imaginou o feriado como um retorno ao lar e um dia para homenagear as mães.

Em 1908, Jarvis organizou as primeiras celebrações oficiais da data em Grafton e na Filadélfia, escolhendo o segundo domingo de maio porque homenageava o aniversário de morte de sua mãe.

A mãe fundadora

(Fonte: CLUW/Reprodução)(Fonte: CLUW/Reprodução)

O Dia das Mães rapidamente se tornou popular e, em 1910, a celebração se tornava feriado estadual na Virgínia Ocidental. A essa altura, Jarvis já se intitulava fundadora do Dia das Mães, estabelecido por ela mesma após muito trabalho, tempo e despesa. Quanto a sugestão de que Hering era o verdadeiro fundador, a mulher disse que ele só queria arrancar dela, em um esforço desesperado, o título de fundadora para promover seus interesses egoístas.

E Jarvis não estava errada, afinal, ela empreendeu uma jornada para que o feriado ganhasse reconhecimento nacional. Ela fez petições à imprensa, políticos, igrejas, organizações e indivíduos de influência, inclusive o rico magnata das lojas de departamento da Filadélfia, John Wanamaker. Ele abraçou a ideia e promoveu um evento em sua rede lojas que atraiu cerca de 15 mil pessoas, em que cada uma recebeu um cravo gratuito para homenagear sua mãe.

No ano seguinte, o preço dos cravos disparou e Jarvis divulgou um comunicado à imprensa condenando os floristas que se aproveitavam da situação. Ela chegou a escrever: “O que você vai fazer para derrotar charlatões, bandidos, extorquidores e outros cupins que minariam com um dos melhores, mais nobres e verdadeiros movimentos de celebração?”.

No entanto, a revolta de Jarvis não teve efeito, até porque a comercialização do Dia das Mães atingiu seu pico em 1914, quando o então presidente dos EUA, Woodrow Wilson, assinou o projeto de lei determinando a data como feriado nacional.

Perdendo o controle

(Fonte: Buzzfeed/Reprodução)(Fonte: Buzzfeed/Reprodução)

Em 1920, Jarvis já implorava para que as pessoas não comprassem mais flores, sem entender que o fator por trás do grande sucesso que sempre sonhou que a data tivesse era graças ao seu apelo comercial. “Portanto, a indústria de flores, cartões e doces merecem parte do crédito pela promoção da data”, disse Katharine Antolini, historiadora do West Virginia Wesleyan College, em entrevista à BBC.

Jarvis passou décadas de sua vida tentando boicotar a data porque acreditava que o povo americano não estava mais disposto a proteger o Dia das Mães do capitalismo, portanto, não eram dignos de celebrá-lo. A fundadora não conseguia ver um envolvimento verdadeiro entre a reflexão tranquila e às relações pessoais entre mães e filhos.

Em algum aspecto, Anna Jarvis não estava totalmente errada, seu problema, no entanto, foi tentar manter as rédeas de algo que ganhou uma proporção muito maior do que suas mãos. 

Como consequência, ela morreu em um hospital psiquiátrico, aos 84 anos, em 24 de novembro de 1948, após gastar sua fortuna lutando para manter o controle do Dia das Mães, talvez na esperança de poder achar que estava fazendo a coisa certa por sua mãe.

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