Disciplina e ordem estão por trás do excesso de regras e manuais no Japão

15/10/2024 às 16:003 min de leituraAtualizado em 15/10/2024 às 16:00

Disciplina e regras são uma das maiores características do povo japonês, cimentadas, sobretudo, durante o longo período medieval, de 1185 a 1603. A construção dessa mentalidade serviu como base aos ideais que definem o compromisso social japonês, pregando que o individualismo é menos importante que o coletivo.

A exaltação desse tipo de virtude pode ser considerado herança das doutrinas budistas, xintoístas e confucionistas, que enfatizam a adesão rigorosa à hierarquia social, lealdade pessoal tanto quanto a apresentação polida de si aos outros como a maior forma de respeito.

(Fonte: Getty Images/Reprodução)
Sociedade japonesa preza pela organização e ordem em todos os âmbitos. (Fonte: Getty Images/Reprodução)

Apesar de os japoneses terem começado a ser alfabetizados no período Edo (1603 a 1866), quando foram fundadas as escolas de caligrafia e escrita para camponeses e artesões em geral, os juízos e valores morais já eram passados adiante boca a boca desde a época medieval, um palco de traições e desonras que quase destruíram o país e serviram apenas para mostrar esses valores se faziam necessários.

Mais tarde, porém, essas virtudes foram incorporadas em textos e manuais de treinamento militar, que inclusive serviram como base para revoluções, como a de 1904, que recrutou milhares de jovens para servirem a seu país e colaborarem para a expansão colonial de modo a estabilizar a nação após uma depressão econômica agravada pelos conflitos internos.

É possível dizer, portanto, que esse foi apenas o início da obsessão dos japoneses por regras e manuais.

A rigidez de uma sociedade

(Fonte: Museu Arqueológico de Atenas/Reprodução)
O Mecanismo de Antikythera possui mais de 2 mil anos.(Fonte: Museu Arqueológico de Atenas/Reprodução)

Manuais existem há muito tempo. O Mecanismo de Antikythera, um computador analógico grego de cerca de 2 mil anos, já possuía instruções impressas nele, bem como uma tábua de argila de 1.400 a.C., exposta no Museu Britânico, com um passo a passo sobre como fazer vidro vermelho naquela época.

Os manuais acompanharam o gênero da escrita que, para ser ensinada ou aprendida, é necessário seguir uma série de regras para uma boa comunicação. Por essa razão, a maneira como os japoneses são treinados desde pequenos a seguir regras começa na alfabetização, em como ordenar e contar os traços dos ideogramas. Entender a regra básica da escrita é a porta para entender como funciona a estrutura da sociedade no Japão.

Para Ryo Nakayama, escritor e fundador da empresa 2.1 (Nitenichi), especializada na criação de manuais para revitalizar empresas, um manual nada mais é do que uma ferramenta para o desenvolvimento dos recursos humanos. Nakayama não só defende que a falta desse tipo de material prejudica a produtividade, além de gerar estresse por mal-entendidos na transmissão de mensagens, como também endossa sua indispensabilidade no meio corporativo.

(Fonte: Getty Images/Reprodução)
Crianças japonesas são ensinadas desde cedo sobre o rigor das regras da sociedade. (Fonte: Getty Images/Reprodução)

O tipo de manual que conhecemos hoje foi desenvolvido pelo engenheiro mecânico Frederick Winslow Taylor, no final do século XIX, quando os processos industriais já haviam dominado os meios de produção de uma sociedade em expansão. Seu método científico de gestão, que oferecia instruções sistemáticas aos trabalhadores para produzir mais e com melhor qualidade, foi duramente criticado no Ocidente por parecer uma tentativa de transformar o homem em uma espécie de máquina.

Por outro lado, o taylorismo teve melhor adesão no Japão exatamente por suas normas, inclusive os manuais foram incrementados com elementos sociais e culturais nas entrelinhas que se tornaram uma tarefa difícil para o próprio povo entender.

Depois que o McDonald’s abriu o primeiro restaurante no país, em 1971, o tipo de manual usado pelos japoneses nunca mais foi o mesmo, sobretudo por inserir esses códigos de conduta e normas sociais nos procedimentos de montagem e no atendimento ao cliente.

Pecando pelo excesso

O excesso de regras também prejudicam a agilidade da vida japonesa. (Fonte: Getty Images/Reprodução)
O excesso de regras também prejudicam a agilidade da vida japonesa. (Fonte: Getty Images/Reprodução)

Hoje, os manuais no Japão tem mais do que a função de instruir, mas de fazer a manutenção da estrutura social, que reforça que as pessoas devem entender suas funções plenamente e saber executá-las bem antes de abrir espaço para qualquer tipo de mudanças.

A criança japonesa é ensinada que o aprendizado acontece de forma cumulativa e que seguir as regras básicas, de saudação, vestimentas, de se portar em sociedade, de onde se posicionar em uma fila e como agir em diversas situações constrói um país que ruma de maneira ordenada para um objetivo. Além disso, essa consciência de ordem e coletividade foi o que contribuiu várias vezes para que a nação atravessasse bem períodos de vulnerabilidade natural, como terremotos e outros cataclismos.

Mas ter as regras como um sistema absolutista nem sempre é algo que ajuda. O excesso de burocracia, por vezes, acaba atrapalhando a vida das pessoas, principalmente no meio corporativo. Em uma empresa no Japão, o dono precisa estar a par dos mínimos detalhes que acontece em todas as áreas, porém, até chegar a ele, existe um longo caminho que a informação precisa percorrer, o que acaba diminuindo a produtividade – tão exigida dos trabalhadores japoneses.

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