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17/04/2024 às 10:00•2 min de leituraAtualizado em 17/04/2024 às 10:00
Se você mora ou já esteve em São Paulo, certamente já deve ter caminhado pelas ruas movimentadas da cidade e se deparado com aquele padrão geométrico peculiar que parece se repetir infinitamente sob seus pés. Se nunca foi à cidade, pelo menos já deve ter visto aquele desenho estampado em algum produto.
Essa característica marcante das calçadas paulistanas tem uma história interessante por trás, em que de um lado nós temos a oportunidade e, do outro, a injustiça.
Nos idos de 1966, em plena vigência do regime militar que assombrou o país, a cidade de São Paulo estava em busca de uma identidade visual para seus calçamentos. O então prefeito, João Vicente Faria Lima, lançou um concurso para escolher o novo padrão de piso da cidade, inspirado nas ondas de Copacabana.
Entre os competidores, estava a arquiteta e artista Mirthes dos Santos Pinto, que na época trabalhava como desenhista na Secretaria de Obras da Prefeitura.
Mirthes não imaginava que seu simples rascunho, inspirado no contorno do mapa do Estado de São Paulo, se tornaria o vencedor do concurso. Um fato interessante é que a arquiteta não iria participar do evento.
Ela havia feito o desenho e engavetado. Foi graças a seu chefe — que ao ver o desenho guardado na gaveta de Mirthes a incentivou a participar — e aos outros arquitetos da Secretaria, que a arquiteta tomou coragem de se inscrever.
Composto por módulos quadrados em preto e branco, o desenho de Mirthes encantou a comissão julgadora e o público, que o escolheu como o novo padrão de calçada da cidade.
A partir daí, o padrão criado por Mirthes dos Santos Pinto começou a tomar conta das ruas paulistanas, começando pela Avenida Faria Lima e se espalhando por toda a metrópole. O desenho, composto por quatro peças quadradas, sendo duas brancas e duas pretas com uma divisão diagonal, logo se tornou um ícone da cidade.
A história por trás desse icônico projeto vai além de sua criação. Mirthes lutou por anos pelo reconhecimento de sua autoria e pelos direitos autorais de sua criação, sem sucesso.
Em uma entrevista para o jornal Folha de S. Paulo, Mirthes falou que, quando registrou o desenho, foi informada que teria direito a uma certa porcentagem por calçada implantada com a sua arte. Quanto ela ganhou? Nada. Apesar de ter patenteado o desenho, ela nunca recebeu compensação financeira pelo uso de sua obra.
O seu desenho é considerado hoje de domínio público, tendo servido para muitas marcas utilizá-lo das mais diversas formas e em todo tipo de produto, rendendo milhões às empresas e nenhum centavo à autora.
Mirthes faleceu em 18 de dezembro de 2020, aos 86 anos, sem ter ganho qualquer centavo com a obra e tendo pouco reconhecimento do seu feito. A arquiteta já tinha se conformado de que não receberia qualquer valor em vida e tinha a esperança de, um dia, seus familiares pudessem enfim ter um retorno financeiro do Estado.
Hoje em dia, o desenho de Mirthes dos Santos Pinto é conhecido como o "piso Paulista" e pode ser encontrado em diversos pontos turísticos da cidade, como a Avenida Brigadeiro Faria Lima e a tradicional esquina da Avenida Ipiranga com a Avenida São João. Apesar de sua autora não receber o devido reconhecimento, seu legado permanece vivo nas ruas de São Paulo.