Crença em deuses moralizadores não foi essencial para grandes civilizações

29/03/2019 às 12:002 min de leitura

A crença em deuses que recompensam os bons e punem os maus é tão difundida que muitos filósofos argumentam que ela é essencial para a existência de grandes sociedades. No entanto, também existem evidências de que a fé em divindades moralizantes só surgiu séculos depois de algumas civilizações se tornaram complexas.

Foi isso que concluiu o pesquisador Patrick Savage, da Universidade de Oxford. Para tanto, ele analisou as crenças religiosas de 414 sociedades que existiram em todo o mundo ao longo dos últimos 10 mil anos. Na maioria dos casos, as deidades moralizantes só apareceram em registros depois que as civilizações atingiram populações de mais de 1 milhão de pessoas.

Como a pesquisa foi realizada

(Reprodução/Wikipedia)

A crença em forças sobrenaturais é comum a praticamente todos os povos. Entretanto, para fins de estudo, Savage focou apenas nos ditos “deuses moralizadores”, que são aqueles que, além de exigirem alguns sacrifícios ou determinarem lugares sagrados, ainda punem violações a leis morais que deveriam ser seguidas pelos humanos.  

Nessa categoria se encaixam as deidades das três principais religiões abraâmicas: cristianismo, islamismo e judaísmo. Todas elas pregam que a pessoa que faz o mal pagará por isso em algum momento. Lembrando que os malfeitos podem ser aqueles que qualquer lei comum condena, como assassinatos, ou coisas específicas, como alguns comportamentos sexuais.

Para saber o nível de desenvolvimento das sociedades pesquisadas de acordo com o período em que elas existiram, Savage levou em consideração os dados reunidos no Seshat Global History Databan. De acordo com essa ferramenta, algumas características de sociedades complexas são hierarquia bem estabelecida, códigos legais formais e infraestrutura de transportes.

Em artigo publicado na revista científica Nature, o pesquisador explica que cruzou essas informações com relatos obtidos em 30 regiões distintas do mundo. “Embora todos esses lugares tivessem a crença de que era preciso acalmar seres sobrenaturais com rituais, não existiam deuses moralizadores antes de processos de colonização em pelo menos 10 deles”.

Nas outras 20 regiões, a crença em deuses moralizadores surgiu sem a interferência de outros povos. Porém, isso só acontecia em média 400 anos depois do desenvolvimento da escrita; então, elas teriam sido registradas caso tivessem aparecido antes. O exemplo mais antigo disso é o Egito, há 4,8 mil anos, durante o período conhecido como Segunda Dinastia.

Saber quando as pessoas começaram a acreditar em deuses moralizantes é relevante para os debates sobre como muitos países são cada vez menos religiosos. A conclusão de Patrick é que, embora a crença nessas divindades possa ter contribuído para a estabilidade de algumas sociedades, ela não foi necessária para a formação delas.

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