Artes/cultura
07/07/2022 às 08:00•4 min de leitura
Ao lado de Bonanno, Colombo, Gambino e Lucchese, o sobrenome Genovese, que compõe as Cinco Famílias mais influentes da máfia italiana dos Estados Unidos, faz parte da cultura e história da sociedade nova-iorquina da década de 1930.
Com origens em diferentes cidades da Sicília e na Itália Continental, os Genovese se tornaram a família mafiosa mais diversificada entre as demais, e também a responsável por carregar o integrante mais controverso de todos os tempos: Vito Genovese, cuja ambição não só causou uma revolução na organização, ajudando a moldar suas hierarquias modernas, quanto a derrubou como um castelo de cartas.
Vito Genovese. (Fonte: Hulton Archive/Getty Images)
Nascido em 27 de novembro de 1897, em Rasiglia, Itália, Vito só tinha 15 anos quando seus pais, Frances Genovese e Nunziata Aluotto, decidiram imigrar para os EUA, o destino de muitas famílias no início do século XX.
A bordo do SS Taormina, ele desembarcou em Nova York em 1913, indo morar em um pequeno apartamento em Little Italy, como boa parte dos ítalo-americanos daquele tempo, e também onde ele teve seu primeiro contato com o crime organizado ao conhecer Charles 'Lucky' Luciano pelo bairro.
Devido ao seu baixo nível de escolaridade, Vito passou seus dias na rua caçando algum tipo de furto e fazendo cobranças de dívidas para mafiosos. Aos 19 anos, ele já enfrentava sua primeira condenação por posse de arma de fogo, permanecendo preso por 1 ano. Quando saiu, passado o "período de experiência no crime", Lucky fez dele seu braço direito, apresentando-o para os crimes de homicídios, nos quais ele se tornou o executor mais confiável, conquistando uma reputação impressionante no submundo do crime.
Dessa forma, não demorou muito para que ele escalasse a hierarquia da máfia nova-iorquina, chegando a comandar o crime organizado durante o período da Lei Seca, na década de 1920.
"Lucky" Luciano. (Fonte: National Archives/Handout/Getty Images)
Mas, como em toda situação, Vito encontrou seus percalços que o fizeram dar alguns passos para trás para poder continuar vivo. Como aconteceu quando assassinou o gângster Ferdinand Boccia, em 19 de setembro de 1934, em meio à Guerra Castellammarese encabeçada por ele e Lucky, que aconteceu nos subúrbios de Nova York entre mafiosos novatos e tradicionais por território, dinheiro e poder.
Devido à morte de Boccia, Vito teve que escapar para Itália, onde ficou por 11 anos, estabeleceu conexões, extorquiu e até flertou com o fascismo pregado por Benito Mussolini. Ao retornar, em 1946, Vito se deparou com uma cena da máfia italiana em Nova York completamente diferente da que havia deixado, inclusive seu posto, que havia sido ocupado por Albert Anastasia, então líder do comércio de narcóticos contrabandeados que acontecia nas docas do Brooklyn. Havia um traço marcante na personalidade de Anastasia: ele não se deixava abalar por ninguém, portanto, a presença de Vito não lhe causou nenhum efeito.
Frank Costello. (Fonte: Wikimedia Commons)
Além disso, havia também Frank Costello, o subchefe de Lucky na família, que assumiu o controle depois que ele foi extraditado para a Itália, como recompensa por sua assistência durante a guerra na repressão dos sindicalistas em Nova York, um ano após a volta de Vito.
Consequentemente, Costello se tornou intocável, e restou a Vito apenas aguardar, encontrar rachaduras em seu poder e ir construindo sua base para recuperar sua posição de prestígio na máfia, assumindo o controle da família de volta.
E sua espera valeu a pena, visto que na década de 1950, o poder de Costello começou a erodir conforme ele perdia seus aliados de confiança para à morte ou para deportação, até que restasse apenas Anastasia. Em 2 de maio de 1957, Vito tentou assassinar Costello que, assustado, escolheu a aposentadoria do crime organizado. Então, em 25 de outubro, Anastasia foi morto na barbearia do Park Sheraton Hotel, em Manhattan, por mandantes de Vito.
Albert Anastasia. (Fonte: Hulton Archive/Getty Images)
Vito renomeou a família como Genovese, convocando uma reunião em 14 de novembro, na propriedade rural de seu amigo Joseph Barbara, em Apalachin, a 320 quilômetros a noroeste de Nova York, para consolidar sua retomada ao poder e receber a aprovação dos demais colegas mafiosos.
Chefes ou representantes de cada uma das Cinco Famílias de Nova York e outros mafiosos, de Califórnia a Cuba, seguiram pelas estradas em seus Cadillacs para o que se tornou o encontro do século.
(Fonte: National Crimes Syndicate/Reprodução)
O local escolhido por Vito era estratégico, pois deveria estar fora dos olhares da polícia, porém, ironicamente ou não, o agente federal Ed Croswell conseguiu rastrear a carreata até a fazenda, onde chamou por reforços e pediu para as quatro estradas de acesso fossem bloqueadas.
Os 100 gângsteres se reuniram do lado de fora da casa, no quintal dos fundos, para começar a celebração de Vito com um churrasco, cuja quantidade de carne até Croswell estava inteirado sobre. A reunião foi um banquete para os agentes do FBI, que capturaram 60 mafiosos durante tentativas de fuga para todos os lados, carregando joias e maços de dinheiro.
Curiosamente, Vito foi o único dispensado pelos agentes, alegando estar na fazenda apenas para um churrasco, e que não tinha envolvimento nenhum com aqueles homens. Essa situação ergueu a hipótese de que a reunião pode ter sido uma armadilha para que Vito herdasse a soberania da máfia sem nenhuma luta ou derramamento de sangue — mas isso foi um tiro no pé.
(Fonte: Bettmann/Getty Images)
Ele atraiu toda a atenção que nenhum criminoso gostaria, principalmente para as conexões da máfia, ao extraí-la das sombras do subúrbio e a revelar para o mundo em uma bandeja de prata, inclusive para o FBI que, até aquele momento, havia negado sua existência.
Enquanto isso, Robert F. Kennedy montou toda sua campanha de governo sobre uma cruzada anti-máfia, pela qual se consolidou na história da política dos EUA, investigando o cerne do problema e gerando centenas de custos para a organização criminosa, de perseguição ao secamento de fontes de dinheiro. Ali começou o início do fim.
Em abril de 1959, Vito Genovese foi condenado a 15 anos em prisão federal por seu envolvimento com narcóticos. Seu império de poder e influência também desmoronou, mesmo com ele ainda controlando muitos aspectos por trás das grades, visto que a máfia se voltou contra ele por sua reunião ter os exposto.
O criminoso morreu de ataque cardíaco, em 14 de fevereiro de 1969, carregando sua ambição e, talvez, o segredo que ela tenha sido a responsável por afundar um verdadeiro império de sujeira.