Ciência
30/10/2022 às 06:00•3 min de leitura
Por volta da década de 1890, cerca de 16% das pessoas internadas no St. Bartholomew's Hospital, em Londres, Inglaterra, foram diagnosticadas com clorose. Os afetados pela doença desenvolviam fadiga, desejo de comer coisas que normalmente são comeríamos, falta de apetite, amenorreia e anemia. No entanto, o que mais chamava a atenção era o tom esverdeado da pele dos doentes.
Hoje, se você pesquisar o termo "clorose" no Google, o que encontrará serão links para doenças de plantas. No entanto, aqui a clorose é caracterizada pela perda da cor verde, não um excesso. Ocasionalmente, um ou outro caso explicável de humano com pele colorida ainda aparece, mas o que antes era uma epidemia sumiu com a chegada do século XX.
(Fonte: The New Inquiry/ Reprodução)
Apenas em 1619 é que o professor de medicina Jean Varandal cunhou o termo clorose. Antes disso, a doença recebeu vários nomes, como “doença do amor” ou “febre do amor”, possivelmente porque afetava mais as mulheres e as supostas curas tinham algo a ver com o papel feminino dentro de uma relação naquela época.
O termo clorose tem suas raízes na palavra grega cloros, que quer dizer verde-pálido ou amarelo-esverdeado. Durante centenas de anos, a doença do amor era uma constante em várias regiões, mas principalmente na Europa.
(Fonte: Wellcome Library)
Os diagnósticos por trás dela mudaram ao longo dos séculos conforme os conhecimentos médicos e as normas sociais do período. Foi descrita pela primeira vez em 1554, sendo que até por volta do ano 1700 era chamada de a “doença das virgens”. Não por acaso, imaginava-se que uma possível cura era ter relações sexuais.
Registros históricos que datam do século IV a.C., já falavam de uma doença parecida. Os egípcios, por exemplo, tinham relatos sobre alguns dos sintomas notados na clorose. Ao longo da história, a doença do amor foi vista sempre como uma doença feminina. Isso ajuda a explicar porque não sabemos quase nada sobre ela, já que por envolver mulheres recebia pouca atenção e, muitas vezes, era “curada” com métodos absurdos.
As principais vítimas da doença do amor eram moças jovens. Fisicamente elas aparentavam estar nutridas, no entanto, a pele tinha um tom amarelo-esverdeado, especialmente nas mais morenas. O branco dos olhos também adquiria uma tonalidade azul.
Outros sintomas comuns eram as dores de cabeça, sonolência, rosto e tornozelos inchados, sangramentos nasais, diminuição da libido, sintomas hoje classificados como de ansiedade e depressão, menos desejo sexual, ondas de calor, anorexia ou obesidade e apetite peculiar, como vontade de comer cera ou preferência por coisas azedas.
(Fonte: Shutterstock)
Por exemplo, se recomendava às jovens doentes o casamento, sexo para engravidar, dietas suspeitas, pílulas de ferro, sangrias de diversos tipos, incluindo com sanguessugas e até mesmo choque elétrico no útero. Em alguns casos era indicado que a mulher abandonasse a educação.
Embora raros os casos, homens também foram diagnosticados com clorose. Quando isso acontecia, os médicos apontavam que a doença surgia naqueles que eram efeminados.
Não existe uma única explicação para dizer o que aconteceu com a doença. Para pesquisadores atuais da medicina, é possível que vários aspectos ajudem a responder por qual motivo a clorose sumiu.
Por exemplo, os sintomas da doença acabaram sendo desviados para outros tipos de diagnósticos, como a anemia hipocrômica ou anorexia. Além disso, o tratamento feminino foi melhorando com o passar dos anos, focando mais na dieta do que na virgindade das mulheres.
Outra razão pela qual a clorose pode ter desaparecido dos registros médicos é que outras doenças mais chamativas e eventos preocupantes apareceram. Por exemplo, a Primeira Guerra Mundial, a gripe e a pandemia de 1918.
(Fonte: TV Tropes/ Reprodução)
E como era algo “de mulher”, as jovens que não menstruavam e apresentassem qualquer tipo de sintomas, incluindo ficar verde, eram deixadas em segundo plano, possivelmente com a doença se curando por conta própria.
Muita coisa sobre a clorose é um mistério. Embora o dramaturgo Sheakespere tenha chamado a condição de “doença verde”, não se sabe se todas as pessoas afetadas adquiriam essa cor.
Um artigo mais recente, de 1980, publicado no British Medical Journal, sugeriu que muitas pessoas falavam sobre a pele verde porque achavam que deveriam confirmar esse sintoma. Outra hipótese levantada pelo artigo em questão é que o apelido de “doença verde” talvez tenha origem no fato de que as afetadas eram mulheres jovens – metaforicamente, elas estavam "verdes", pois ainda eram "inexperientes".