Estilo de vida
07/02/2023 às 11:00•3 min de leitura
Antes de enlouquecer com o próprio poder a ponto de se humilhar pedindo para que seu secretário Epafrodito o matasse, Nero acabou com a vida de todos ao seu redor. Fosse os decapitando para exercer seu tiranismo ou contaminando com a loucura e perversidade que o manteve nas trevas. Esporo foi um deles.
O jovem e belo romano chamou a atenção do imperador por um motivo: ele se parecia com Popeia Sabina, considerada a mulher mais bela de Roma com quem Nero embarcou em um relacionamento extraconjugal, que levou à morte de sua mãe, Agripina, a jovem e de sua esposa, Octavia.
A história acredita que ela foi a responsável por despertar as trevas que existiam no imperador, a mesma que causou a morte dela e do filho em sua barriga quando foi chutada por Nero de maneira tão violenta que não aguentou. Essa é a história de como o jovem Esporo se tornou a imperatriz de Roma.
Representação de Esporo. (Fonte: biney-bottlesworth/DeviantArt/Reprodução)
Não, você não leu errado. Esporo sentou ao lado de Nero para contemplar uma Roma destruída pelas loucuras do semideus autoproclamado, vestindo as roupas de Sabina e sendo, para todos os efeitos —inclusive para os cidadãos —, a própria.
Esporo era o retrato aberrante do comportamento sexual predatório e perturbador que Nero sustentava, e que ainda ecoa através dos séculos. O imperador ficou conhecido como um homem que abusava de meninos nascidos livres, seduzia mulheres casadas, estuprava quem recusava suas investidas e até matava, se fosse necessário.
(Fonte: Hulton Archive/Getty Images)
A falta de escrúpulos fez Nero manter relações incestuosas até com sua mãe e só foi parado por seus inimigos que temiam que o relacionamento pudesse dar à mulher mais influência, sendo que o pouco que tinha causava um grande estrago na sociedade romana. Isso tudo terminou com o assassinato dela, em 59 d.C., por desaprovar o relacionamento do imperador com Sabina.
Depois que Nero chutou sua esposa até a morte, devastado pelo remorso que se transformou em loucura, o homem viu o rosto de Sabina no jovem Esporo, cuja vida quase nada se sabe além do nome — que nem era seu.
(Fonte: Wikimedia Commons)
É provável que o nome Esporo tenha sido dado pelo próprio Nero em uma tentativa de zombar da incapacidade do jovem em produzir herdeiros. Em grego a palavra "esporo" significa "semente" ou "semeadura"— um epíteto, no mínimo, cruel.
Apesar disso, Nero chamou Esporo de Sabina, e se importava apenas com sua aparência extraordinariamente atraente e muito parecida com a de sua falecida esposa. E para que emulasse ainda mais essa imagem, Esporo foi envolto em véus e se casou com Nero durante uma cerimônia, em 67 d.C., onde se tornou imperatriz e foi brutalmente castrado mais tarde.
Esse tipo de situação só aconteceu e foi socialmente aceita porque, naquela época, as dinâmicas ao redor da homossexualidade falavam menos sobre atração pelo mesmo sexo e mais sobre a posição, tanto no sentido físico quanto social da palavra.
Com quem alguém fazia sexo importava apenas se ambos estavam em pé de igualdade na sociedade romana, caso contrário, aquele que ocupasse uma posição de poder precisava ser quem colocaria o outro em submissão. Essa configuração, no entanto, não se aplicava a quem era escravizado, sendo que alguém poderoso manter relações com um era considerado uma abominação.
A castração de Esporo e sua feminilização isentou Nero de qualquer tipo de vergonha pública, ainda que a união tenha sido considerada uma perversão pelo status do jovem.
(Fonte: Trajan's Column/Reprodução)
Após a morte de Nero, Esporo continuou desempenhando seu papel de esposa, só que para o prefeito pretoriano Ninfídio Sabino. Quando ele morreu, o jovem foi passado como uma mercadoria para Otão, o primeiro marido de Sabina, de quem ela se divorciou para se casar com Nero.
Ao se tornar imperador de Roma, em 69 d.C., Vitélio propôs que Esporo protagonizasse a peça O Estupro de Proserpina, uma performance que serviria como parte de um espetáculo de gladiadores, basicamente desempenhando o papel de sua vida. Esporo se recusou a se humilhar de maneira ainda mais pública, sobretudo vivenciar uma dor tão real. Com isso ele decidiu interromper a própria vida.
Historicamente, até hoje ecoa a jornada do jovem sequestrado, mutilado e violentado sexualmente que morreu tendo a certeza de que seria apenas um fantasma, já que sua vida não passou de um grande borrão.