Artes/cultura
15/06/2020 às 14:00•3 min de leitura
A tuberculose é uma doença que data do período neolítico, sendo que pesquisadores e epidemiologistas encontraram a bactéria em ossos enterrados há milhares de anos. Só em meados do século XIX, a doença já havia matado pelo menos uma pessoa em cada sete. Naquele tempo, muitos pacientes buscaram a cura em sanatórios e retiros, pois muitos acreditavam que o clima bucólico e calmo poderia, de alguma forma, mudar o curso da doença.
Em meados de dezembro de 1879, na cidadezinha de Pincherville (atual cidade de Orange), ao norte da Pensilvânia (Estados Unidos), o filho da família Bellingan contraiu a devastadora tuberculose. Apesar de serem muito ricos e possuírem fundos suficientes para tratá-lo, o avanço da Medicina ainda era pouco naquela época, portanto a doença consumiu rapidamente o garotinho e de uma forma avassaladora. Os médicos só podiam aliviar o sofrimento causado por essa doença tratando os pacientes com medicamentos à base de zinco e chumbo, sem terem noção de que essas substâncias eram altamente danosas para o organismo humano.
Demorou até o dia 11 de janeiro de 1880 para que o coração do filho mais novo dos Bellingan parasse de bater de repente. A família entrou em um luto profundo, pois não era a primeira vida que eles perdiam para a doença. Os pais se recusaram a enterrar o filho até que todos os entes queridos o visitassem para se despedirem. E isso significou tudo.
(Fonte: iStock/Reprodução)
Estranhamente, por 3 dias o rostinho do menino continuou corado e sua aparência não cedeu lugar a um aspecto macilento, tampouco demonstrou os sinais inevitáveis de decomposição da carne. A criança não cheirava mal e não possuía rigidez dos tecidos corporais. Como se tudo não fosse incabível o possível, o corpo da criança não transmitia nenhum sinal vital.
Os pais enxergaram aquilo como um verdadeiro milagre, e a chama da esperança de terem o filho de volta cresceu no coração dos Bellingan. Para tentar encontrar uma explicação mais lógica do que estava acontecendo, o médico legista que atestou a morte do garoto foi convocado. O homem confirmou que a criança estava morta, porém notou que a pupila dela ainda respondia às alterações da luz, o que indicava que poderia existir algum sinal de atividade cerebral.
Apesar de o corpo estar clinicamente morto há tempos, a equipe médica realizou tentativas de reanimação cardíaca, mesmo cientes de que era humanamente impossível qualquer resposta de vida. Eles estavam certos, no entanto era curioso demais que a morte sistemática de órgãos e outras funções ainda não tivesse apodrecido o cadáver ou que os primeiros sintomas não tivessem aparecido depois de tantos dias.
Provavelmente, pensando em estudar mais sobre a situação, o médico legista pediu para o prefeito da cidade uma autorização para adiar o enterro da criança.
(Fonte: Dreamstime/Reprodução)
No 5º dia o menino ainda aparentava estar vivo, esse foi abatido por uma série de movimentos espasmódicos que comoveu e chocou a todos que não desgrudaram a atenção dele. E, então, subitamente e para o horror de todos os presentes, o corpo começou rapidamente a se degenerar, como se o tempo decidisse agir sobre ele de uma só vez.
Em poucos minutos, sob um espécie de ataque epilético incontrolável, o rosto da criança escaveirou-se e ganhou um tom lívido. A pele, primeiro, exibiu manchas de coagulação, depois ficou flácida e ressecada. Ao longo de 2 dias de observação dos profissionais, o cadáver endureceu como uma pedra e ficou extremamente arroxeado. Ele se decompôs tão rápido que não tiveram como esperar mais, finalmente providenciando o enterro do menino no dia 18 de janeiro de 1880.
A partir desse dia, uma onda de terror e caos maior do que a causada pela doença se instalou por toda a cidade. Muitas pessoas que perderam os seus familiares para a tuberculose começaram a exumar os cadáveres na esperança de que os encontrasse ainda vivos. Passaram a exigir uma atenção maior com os mortos declarados do que com aqueles que estavam batalhando por suas vidas.
Isso dificultou ainda mais o ofício dos médicos, que se viram em combate ao desespero dos vivos que não queriam enterrar os seus mortos.
(Fonte: Wellcome Collection/Reprodução)
Até hoje, acredita-se que a história do menino Bellingan foi um típico caso de “morte aparente”, mais comumente conhecida como catalepsia. Um estado patológico do organismo que simula a morte com a diminuição vertiginosa dos sinais vitais a um ponto quase identificável, principalmente para a Medicina pouco desenvolvida daquela época. Tudo indica que a corrosão da tuberculose tenha induzido ao distúrbio como uma resposta direta ao sistema em colapso.
No entanto, não existem estudos que comprovem a possibilidade de alguém sobreviver a tanto tempo em um estado cataléptico, sobretudo sofrendo de uma doença tão aguda como era a tuberculose naquela época — o período de 24 horas foi o caso de maior duração já registrado. Além disso, não conseguiram entender o mistério de como o corpo do menino se decompôs de maneira tão rápida, como se a vida fosse sugada dele até que definhasse.
Seja como for, certamente a tecnologia moderna teria detectado qualquer movimentação vital no corpo do pequeno Bellingan, e uma reanimação adequada poderia tê-lo trazido de volta.
Atualmente, a prefeitura da pequena cidade de Orange mantém expostos para a apreciação pública os laudos médicos com os detalhes minuciosos e outros documentos explorando o insólito acontecimento que, por muitos anos, foi motivo de pura histeria e medo.