Artes/cultura
13/05/2021 às 12:29•3 min de leitura
O Brasil ainda tem uma parcela bem grande de católicos: 50%, segundo uma pesquisa de 2020, do Datafolha, contra 31% de evangélicos e 10% de pessoas sem religião. Para essa metade da população, 13 de maio é Dia de Nossa Senhora de Fátima, quando se comemora uma das aparições marianas mais famosas da história.
Porém, mesmo que a gente deixe a fé de lado (o que é meu caso, que estou nos 10% sem religião), a história das aparições de Nossa Senhora em Fátima pode ser bem interessante. Afinal, você já deve ter ouvido falar nos "três segredos" que ela teria revelado às crianças, certo?
Mas, antes disso, vale a pena dar um passo para trás e contar a história completa das aparições — de acordo a fé católica, claro, já que os céticos podem não acreditar que tudo aconteceu dessa forma. Também é legal tirar uma dúvida comum de quem não é católico: Nossa Senhora de Fátima e as "outras" Nossa Senhora (Aparecida, Guadalupe e por aí vai...) são a mesma a pessoa, para os crentes. Trata-se de Maria, mãe de Jesus, que resolve aparecer de diferentes formas, em diferentes lugares.
Imagem: Wikimedia Commons
A história começa em 1916, com três crianças pobres, pastoras de ovelhas, chamadas Lúcia dos Santos, Francisco Marto e Jacinta Marto. Eles receberam a visita de um anjo, o "Anjo da Paz" ou "Anjo de Portugal", que teria lhes avisado sobre visitas futuras de Nossa Senhora aos meninos. Em 13 de maio de 1917, Maria apareceu para elas pela primeira vez, em um lugar chamado "Cova da Iria". Lúcia tinha 10 anos, Francisco, 9, e Jacinta, 7.
A mãe de Jesus disse para os três pequenos pastores rezarem muito e aprenderem a ler. Também pediu que eles voltassem àquele lugar todo dia 13 de cada mês, no mesmo horário, ao meio-dia. Lúcia sugeriu que eles guardassem segredo, mas Jacinta acabou contando a história e mais gente começou a se interessar pela aparição.
No dia 13 de junho e julho, Nossa Senhora teria aparecido conforme o combinado e foi no terceiro encontro que ela contou os tais "segredos de Fátima".
Ainda tem mais história antes dos segredos. Isso porque, quando chegou o dia da visita de agosto, as três crianças estavam detidas pelas autoridades locais. Nossa Senhora de Fátima acabou aparecendo em outro lugar, apenas no dia 19.
A essa altura, muita gente desconfiava da história contada pelas crianças. Em uma das aparições, Nossa Senhora teria dito que enviaria um milagre para que as outras pessoas acreditassem nela. Em 13 de outubro de 1917, milhares de pessoas se reuniram no local e presenciaram o chamado "Milagre do Sol".
Imagem: Wikimedia Commons
A tradição católica conta que, nesse dia, caía uma chuva forte. Até que as nuvens se dissiparam e o sol apareceu em um disco opaco, com luzes multicoloridas ao redor e fazendo movimentos de zigue-zague. Muitos dos presentes afirmam que suas roupas, antes molhadas pela chuva, secaram instantaneamente e há relatos de curas.
Quem não acredita na explicação da fé sugere que o milagre descrito em Fátima pode simplesmente ser um parélio (fenômeno causado pela refração da luz solar) ou ilusões de ótica causadas pelo tempo excessivo de exposição do olho ao sol.
Quanto aos "segredos de Fátima", eles ficaram muito bem guardados durante muitos anos. Francisco morreu em 1919 e Jacinta no ano seguinte, da gripe espanhola. Lúcia acabou revelando as duas primeiras partes do segredo em um livro, escrito em 1941, quando ela já tinha se tornado uma freira.
Em resumo, a primeira parte é, literalmente, uma visão do inferno, com muito fogo e sofrimento, além de um aviso de guerras e desgraças que viriam para a Terra. A segunda parte fala de perseguição aos cristãos e ao Papa, pede a Consagração da Rússia e diz que os cristãos devem rezar para evitar essas desgraças.
E o terceiro segredo? Esse Lúcia deixou bem guardado. Ela só escreveu em 1944, por ordem do Bispo de Leiria, e os papas da época tiveram acesso. O papa João Paulo II o revelou em 2000, durante uma visita a Portugal.
Imagem: Vatican News
Muita gente, inclusive católicos, acredita que o terceiro segredo de Fátima fala sobre o atentado sofrido pelo papa João Paulo II na Praça São Pedro, em 1981. Contudo, a visão dos três pastorinhos não especifica nada disso e a própria igreja afirma que o segredo é muito mais simbólico que uma profecia ao pé da letra.
O que a carta de Lúcia fala é que ela viu um papa (sem especificar qual) andando por uma cidade em ruínas, até ser morto a tiros por soldados, prostrado de joelhos. Para alguns, isso é uma alegoria geral à perseguição contra cristãos, especialmente pelo comunismo ateu. O que nos leva ao próximo ponto.
A aparição de Nossa Senhora em Fátima aconteceu em 1917, enquanto a Europa era destruída pela Primeira Guerra Mundial e ainda precisava enfrentar a gripe espanhola.
Mais ou menos nessa mesma época, a Rússia, diretamente citada nas mensagens, travava uma sangrenta batalha para derrubar sua monarquia e migrar para o socialismo.
Em Portugal a queda da monarquia também era recente, de 1910, com a Igreja perdendo parte de seus poderes, já que a República era laica. Aliás, havia quem enxergasse motivações políticas anti-republicanas nos relatos dos pastorinhos — essa foi uma das motivações para que eles fossem detidos, em agosto. Desse modo, há um forte aspecto político e histórico nas aparições de Nossa Senhora de Fátima.
Também há um forte aspecto turístico: milhões de peregrinos católicos se deslocam à pequena cidade portuguesa de Fátima, todos os anos, para visitar os locais onde Nossa Senhora teria aparecido para os três pastorinhos há pouco mais de 100 anos.
Imagem: Wikimedia Commons