Estilo de vida
27/05/2022 às 08:00•3 min de leitura
Se o famoso museu de cera Madame Tussauds (Londres) se tornou um ponto turístico e parte da cultura britânica, foi porque Marie Tussaud, nascida em 1° de dezembro de 1761, em Estrasburgo (leste da França), não teve uma juventude comum.
Em vez de fazer aulas de piano e costura, como era a realidade de muitas jovens da idade dela, a moça preferiu passar seu tempo vendo o Dr. Philippe Curtius, um médico anatomista e ceramista para o qual sua mãe trabalhou como governanta e que praticamente a adotou, aprendendo técnicas de modelagem. Apesar de os boatos serem muitos, ninguém sabe ao certo se Tussaud era apenas uma pupila do homem ou se havia algum laço consanguíneo, fruto de um relacionamento às escuras com sua mãe.
De qualquer forma, parece que o talento com as mãos que Curtius tinha foi transferido para a garota, que viu vários cidadãos influentes de Paris entrarem e saírem da loja de cera do homem ao longo de toda a sua infância e juventude.
Aos 16 anos, Tussaud já ouvia do homem que seria o futuro da arte fazer esculturas, e ele estava certo, embora nem fizesse ideia que ela teria de enfrentar percalços perturbadores assim que consagrou o início de sua carreira com sua primeira escultura: o rosto do filósofo Voltaire.
(Fonte: Pinterest/Reprodução)
A tendência das estátuas de cera e a demanda por elas cresceram exponencialmente no século XVIII, e Tussaud passou todo o tempo produzindo o máximo de esculturas que conseguia, ansiosa para se destacar — o que não demorou muito.
Os membros da realeza ficaram maravilhados com o talento da mulher, a tal ponto de ela ter sido contratada pela princesa Elizabeth da França, irmã de Luís XVI, para ensiná-la a arte da cerâmica, assim se tornando sua conselheira e confidente. Mas o que deveria ser o começo de um estrelato, quase foi sua ruína.
Em 12 de julho de 1789, 2 dias antes de a queda da Bastilha iniciar a Revolução Francesa, várias figuras de cera representando aristocratas e membros da família real, feitas por Curtius, foram roubadas e carregadas pelas ruas de Paris durante protestos contra a monarquia.
Tussaud foi acusada de apoiar o monarquismo porque trabalhava para a realeza, sendo jogada em uma masmorra após ter a cabeça raspada como preparação para ser executada em uma guilhotina.
(Fonte: Pinterest/Reprodução)
Assim que soube do estado de Tussaud, Curtius convenceu os revolucionários de que ela era, na verdade, uma defensora de ideais liberais, mostrando algumas de suas figuras de cera guardadas que apoiavam essa alegação.
Tussaud não só foi libertada como empregada pelo novo regime para usar sua aptidão extraordinária na confecção de máscaras mortuárias daqueles que eram guilhotinados na revolução, expondo-as no salão de Curtius. Rapidamente, os manequins fantasiados com cabeças falsas se tornaram mais do que uma tendência, e sim um protesto político da época.
(Fonte: History Collection/Reprodução)
Além de o trabalho exigir atenção, habilidade artística e muita paciência, requeria da mulher "estômago" para pegar as cabeças, por vezes ainda quentes, logo que eram arrancadas dos corpos. O que ela fazia beirava o grotesco e, ironicamente, cruzava com sua árvore genealógica, visto que a maioria dos homens de sua família eram carrascos.
No livro Madame Tussaud and the History of Waxworks, a escritora Pamela Pilbeam detalha que a mulher se sentia suja com as cabeças ensanguentadas em seu colo para colher as expressões e os traços de quando a vida mal havia abandonado o corpo.
Até que, valendo-se da sua aptidão que todos a exaltavam e a tornava única, em 1802, aos 40 anos, ela decidiu buscar fazer fortuna fora da França, deixando para trás um marido esbanjador, 2 dos 3 filhos e o negócio dilapidado deixado por Curtius. Ela viajou por 20 anos entre a Inglaterra e Escócia, aproveitando todas as tendências e modas para criar modelos de cera como ninguém viu.
(Fonte: National Geographic/Reprodução)
Já com 74 anos, Tussaud decidiu se estabelecer em um local permanente, escolhendo a Baker Street, na Londres da década de 1830. Foi lá que ela encontrou o sucesso que sempre procurou, entrando para história com suas esculturas macabras, seus autorretratos e qualquer outro tipo de representação realística a ponto de as pessoas se questionarem de estarem olhando para algo vivo ou não.
Marie Tussaud faleceu em 1850, aos 88 anos.