Em 1844, americanos venderam tudo acreditando que Jesus voltaria

23/02/2023 às 11:003 min de leitura

Para muitos, a volta de Jesus Cristo deixou de ser uma esperança e passou a ser uma necessidade. Segundo essas pessoas, Ele seria o único que conseguiria mudar tudo de ruim que aconteceu no planeta desde sua partida, seja para deixar que os pecadores pereçam ou para levar os escolhidos para um suposto "Reino nos Céus".

Há 2 mil anos, a Segunda Vinda de Jesus é um acontecimento iminente para muitos cristãos. Um estudo feito pelo Pew Research Center indicou que, entre os evangélicos brancos nos Estados Unidos, 58% acreditam que o Cristo retornará à Terra até o ano de 2050.

(Fonte: Adventist/Reprodução)(Fonte: Adventist/Reprodução)

Em meados da década de 1970, ainda com o fantasma de uma Terceira Guerra Mundial que destruiria as nações para sempre, a prática e filosofia do sobrevivencialismo também cresceu em um viés de apocalipse bíblico cristão, que antecederia um arrebatamento divino ou a vinda de Jesus para o temido Julgamento Final. Com isso, pessoas foram para o subsolo, estocaram comida e armamento em verdadeiras tocas ou pagaram milhares de dólares para ter seu próprio refúgio. Muitas delas ainda habitam o subsolo, imaginando que o fim do mundo acontecerá a qualquer momento.

Mas essa não foi a primeira e nem será a última vez. Em 1844, alguns norte-americanos venderam tudo acreditando que Jesus estava voltando.

A culpa de Miller

(Fonte: Bibleinfo/Reprodução)(Fonte: Bibleinfo/Reprodução)

A culpa foi de William Miller. Nascido em 1782, em Massachusetts, o fazendeiro e miliciano se tornou líder local da comunidade de Low Hampton, em Nova York. Sua criação foi em um lar batista, porém começou a flertar com a crença religiosa deísta depois que sobreviveu milagrosamente à Guerra Anglo-Americana de 1812.

Estudando a Bíblia, Miller se interessou especialmente pela passagem de Daniel 8:14, que diz que depois de 2 mil e 300 dias, "o santuário será purificado". Supondo que a Terra era o santuário e que Cristo estava retornando para purificá-lo, foi assim que ele chegou à conclusão de que o nazareno voltaria em meados de 1844.

William Miller. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)William Miller. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)

Miller começou compartilhando suas conclusões com alguns amigos e colegas frequentadores da igreja. A princípio, nenhum deles deu importância. Sendo assim, desapontado, em 1832, ele começou a enviar vários artigos para um jornal local falando sobre a tão aguardada Segunda Vinda de Cristo. Isso deu certo.

O homem foi sufocado por questionamentos, comentários e perguntas; resultando na necessidade de Miller escrever um livro sobre suas convicções e enviar uma cópia para cada um que entrasse em contato. Mas tudo isso não teria passado de um mero clube de leitura se não fosse por Joshua Vaughan Himes.

Espalhando a palavra

Joshua Vaughan Himes. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)Joshua Vaughan Himes. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)

A pregação de Miller contaminou os interesses de Himes, um líder cristão, editor e promotor de inovadores intelectuais e reformistas sociais. Morador de Boston, ele foi se encontrar com Miller e não demorou muito para que se envolvesse com os seguidores do homem a ponto de se tornar um líder proeminente na Igreja Cristã do Advento.

No começo de 1840, Himes passou a publicar o periódico Sinal dos Tempos, que promovia as ideias "mileristas", como os críticos chamavam, reforçando a ideia de que Cristo estava prestes a voltar e que as pessoas precisavam se preparar para o dia.

Himes foi o grande responsável por tirar da bolha a palavra de Miller e popularizá-la, levando para vários lugares dos Estados Unidos, arrebanhando uma massa de fiéis cada vez maior. De repente, o hype pela volta de Cristo se tornou implacável. E não parou por aí. Apesar de a crença estar concentrada na América do Norte, chegou também na Noruega e no Chile.

No fatídico 1844, quando a profecia poderia acontecer a qualquer momento, Himes imprimiu mais de 5 milhões de cópias de suas publicações e mais de um milhão de norte-americanos leram sua palavra. Apesar disso, acredita-se que o homem não tenha tido mais do que 100 mil seguidores sérios e, inclusive, foram eles que começaram a questionar e pressionar Miller e Himes por resultados consistentes.

A Grande Frustração

(Fonte: Glencairn Museum/Reprodução)(Fonte: Glencairn Museum/Reprodução)

Para acalmá-los, Miller sugeriu que Jesus retornaria em 21 de março de 1844, mas quando a data passou sem incidentes, ele mudou o prazo para 18 de abril. Ainda havia um pouco de esperança assim que o dia chegou, porém, ela se extinguiu no momento em que o relógio passou da meia-noite e os seguidores não encontraram nenhuma luz no céu. Ali ficou claro que o movimento milerista não sobreviveria a um terceiro fracasso.

Como costuma acontecer em movimentos religiosos, a base se tornou mais extrema do que sua liderança e, durante uma reunião, um homem chamado Samuel S. Snow apresentou uma teoria "sólida" de que Cristo retornaria em 22 de outubro. As pessoas acreditaram de maneira tão ferrenha dessa vez que venderam tudo o que tinham, desde posses de terras até casas e bens materiais.

Em 22 de outubro, eles ocuparam casas, igrejas, montanhas e prados, olhando para o céu e esperando que Jesus descesse. Quando isso de novo não aconteceu, no que ficou conhecido como Grande Frustração, o movimento se desintegrou. Miller foi insultado, perseguido e ameaçado de morte por suas mentiras.

Muitos seguidores perderam a fé, sucumbiram à depressão ou tiraram a própria vida. Outros simplesmente recomeçaram, ainda que a duras penas, voltando às crenças ortodoxas de suas antigas igrejas.

Em meio a todo o caos, houve aqueles que resistiram, absortos na ideia de que seriam resgatados a qualquer momento, e assim permaneceram até o fim de seus dias.

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