Por que a China usa pandas como ferramenta diplomática?

30/12/2023 às 14:003 min de leitura

Grande parte do século XX foi marcado por relações distantes e até hostis entre os Estados Unidos e a China, sobretudo durante a Guerra Fria, em que a potência americana sustentava uma campanha de perseguição e criminalização do comunismo ao tentar combater seu pior inimigo, a União Soviética.

Exatamente por essa campanha de “ameaça comunista” que os EUA sempre estiveram do lado dos nacionalistas chineses, que buscavam um Estado unificado sob o governo do Kuomintang. O governo americano chegou a fornecer apoio significativo por meio do fornecimento de armamento, treinamento militar e assistência financeira ao ex-presidente Chiang Kai-shek na luta contra a ocupação japonesa na China durante a Segunda Guerra Mundial.

Richard Nixon. (Fonte: GettyImages/Reprodução)Richard Nixon. (Fonte: GettyImages/Reprodução)

Isso aumentou as tensões entre os nacionalistas e os comunistas mesmo durante esse período delicado na China, chegando ao seu pico em 1945, quando as negociações de paz entre ambos falharam miseravelmente, resultando no reinício da Guerra Civil Chinesa, que fez os comunistas emergirem vitoriosos sob a liderança de Mao Tsé-Tung, que proclamou a fundação da República Popular da China.

Em 1972, a visita do então presidente dos EUA Richard Nixon à China desempenhou um papel crucial no processo de estabelecimento das relações diplomáticas formais entre as duas potências. Depois que a ex-primeira-dama Pat Nixon comentou sobre seu amor pelos pandas, a China enviou alguns desses animais para os EUA pela primeira vezem 1972, como forma de acordo de paz. 

Fragmentos de uma tradição

Imperatriz Wu Zetian. (Fonte: YouYi/Reprodução)Imperatriz Wu Zetian. (Fonte: YouYi/Reprodução)

Nativos da região central da China, os pandas nutrem uma relação que data de vários séculos com o povo chinês, apesar de terem caído no conhecimento do Ocidente apenas em meados do século XX. Os animais sempre foram associados a valores como gentileza, harmonia e expressão de amizade e cooperação, por isso marcaram presença em eventos diplomáticos contemporâneos e se tornaram verdadeiros "presentes".

Muito se fala que a diplomacia do panda começou com a Imperatriz Wu Zetian, no século VII, mas não há evidências históricas claras que comprovem que isso realmente acontecia. O que existe, no entanto, é que a dinastia Tang, da qual a imperatriz fazia parte, tinha o costume de enviar presentes exóticos e raridades como parte das relações diplomáticas, e os pandas podem ter sido inclusos nessa lista.

Oficialmente, a tradição de usar pandas como embaixadores diplomáticos começou na década de 1950, sob o governo de Mao Tsé-Tung, quando passou a emprestar os animais para zoológicos estrangeiros durante a Guerra Fria. O ato de emprestar um panda aos EUA em 1972, não só estabeleceu os laços de proximidade com a China, como renovou o caso de amor americano com essas criaturas, que não eram vistas no país há mais de 20 anos.

O fim das relações?

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Em 1984, à medida que a China foi se tornando cada vez mais "capitalista", os pandas se transformaram em ferramentas econômicas. Sendo assim, eles não eram mais apresentados como presentes, mas sim emprestados por um período de 10 anos, que poderia ser prorrogado. 

Essa mudança permitiu que a China continuasse promovendo sua imagem no exterior e também construísse confiança, uma promoção de parcerias mútuas entre os chineses e os países beneficiários. Para isso, os anfitriões precisariam pagar uma taxa anual de cerca de US$ 1 milhão por urso, sendo que os filhotes de panda nascidos no exterior teriam que ser devolvidos à China antes de seu quarto aniversário.

Em meio a um período de forte tensão, o contrato de empréstimo dos EUA termina em dezembro, e os três ursos em solo americano serão devolvidos à China. Se não houver a prorrogação do acordo, como manutenção da diplomacia entre as potências, será a primeira vez em cinco décadas que os EUA ficarão sem pandas.

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

“Dado ao teor atual das relações entre EUA e China, não seria surpreendente que as autoridades chinesas permitam que os contratos de pandas com zoológicos dos EUA expirem”, disse Kurt Tong, analista de consultoria da Asia Group e ex-diplomata, à France-Presse.

Afinal, os EUA possuem fortes acordos comerciais com Taiwan e continuam a vender equipamentos de defesa para seus militares, um comportamento que deixa os chineses cada vez mais insatisfeitos. O retorno dos pandas pode resultar na deterioração total das relações entre os países.

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