Ciência
04/07/2023 às 06:30•3 min de leitura
Situada no Oceano Pacífico entre o Havaí e as ilhas Filipinas, as Ilhas Marshall são uma nação insular bastante curiosa. Porém, o que chama mais atenção nesse lugar é uma enorme cúpula de concreto localizada entre seus coqueiros e águas cristalinas: o Runit Dome, uma estrutura que deriva do passado da nação como um local para testes nucleares.
Entre 1946 e 1958, os Estados Unidos detonaram 67 bombas nucleares e atmosféricas no Atol de Enewetak e no Atol de Bikini, nas Ilhas Marshall. O objetivo era que tais testes fornecessem algum tipo de vantagem sobre a União Soviética na Guerra Fria. Porém, para que isso fosse possível, era preciso a construção de um "lixão nuclear". Entenda mais sobre o caso!
(Fonte: Wikimedia Commons)
A história do Runit Dome começa na década de 1940, quando os EUA identificaram nas Ilhas Marshall um local adequado para conduzir testes nucleares. Segundo a imprensa norte-americana, esse cálculo foi feito com base na baixa população do país e na distância para outros países — assim como as rotas marítimas que passavam por ali.
Por quase duas décadas, os Estados Unidos usaram a nação insular como local de testes não apenas para bombas nucleares, mas também para armas biológicas. A primeira bomba lançada na ilha foi em 1946. Nos cinco anos seguintes, mais oito testes foram feitos, variando de 23 a 225 quilotons de potência.
Com o passar do tempo, o governo norte-americano decidiu testar armas cada vez maiores. Isso incluiria a bomba Castle Bravo, que seria mil vezes mais poderosa do que as bombas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki. Com o Tratado de Proibição Limitada de Testes assinado pelo país em 1963, os EUA deram uma freada nos testes nucleares, mas continuaram testando dezenas de armas biológicas nos anos seguintes.
(Fonte: Wikimedia Commons)
Na década de 1970, no entanto, as coisas começaram a mudar. Os EUA haviam esgotado sua necessidade de testar armas nas Ilhas Marshall e outras prioridades surgiram para a Guerra Fria. Contudo, as décadas de explosão na região devastaram toda a paisagem que um dia fora maravilhosa, deixando para trás enormes crateras e toneladas de lixo radioativo.
O governo norte-americano, então, concordou em ajudar a limpar a nação insular, tendo a ideia de criar uma "tumba" de concreto na Ilha Runit, a qual seria apelidada de Runit Dome. O problema é que os 11 testes nucleares conduzidos no Atol de Enewetak causaram uma "alta contaminação do subsolo", com os isótopos radioativos apresentando meia-vida de 24 mil anos.
Logo, a Ilha Runit sempre seria tóxica para os humanos. Então, a Comissão de Energia Atômica e o Departamento de Defesa dos EUA criaram um plano para coletar detritos radioativos da região e despejá-los no Runit Dome, cobrindo tudo com uma cúpula de concreto. Entre 1977 e 1980, cerca de 4 mil militares trabalharam para jogar 35 piscinas olímpicas de solo contaminado e detritos na cratera. Os dejetos foram misturados com concreto e posteriormente selados com outra camada de concreto de 45 centímetros de espessura.
(Fonte: Wikimedia Commons)
Embora algumas medidas de segurança tenham sido implementadas para a construção do Runit Dome, diversos problemas surgiram ao longo do caminho. Em primeiro lugar, o atol estava quente demais para o uso de trajes de proteção e os amostradores de ar para monitorar a entrada de plutônio rapidamente quebraram.
Com isso, centenas de soldados que participaram do projeto acabaram sofrendo de câncer, problemas ósseos e até causaram defeitos congênitos em seus filhos anos depois. O governo dos EUA, por sua vez, recusou-se a pagar pelos cuidados médicos.
Para piorar a situação, a situação atual do Runit Dome é precária. O concreto utilizado para tampar o túmulo nuclear começou a envelhecer e apresenta pequenas rachaduras — o que pode criar grandes vazamentos no futuro e prejudicar ainda mais a vida das pessoas que moram nessa região.
Em 2019, os norte-americanos anunciaram que pretendiam estender um acordo com as Ilhas Marshall para fornecer ajuda em troca de privilégios militares no território. No entanto, o Runit Dome segue sendo uma ferida aberta nessa relação.