Ciência
04/12/2024 às 09:00•2 min de leituraAtualizado em 04/12/2024 às 09:00
Por décadas, as pinturas rupestres da Caverna Chauvet, na França, intrigaram cientistas com imagens de rinocerontes-lanosos ostentando corcovas imponentes nas costas. Essa representação era vista com ceticismo, já que nenhum fóssil ou espécime mumificado da espécie, extinta há cerca de 10 mil anos, apresentava tal característica.
Porém, a recente descoberta de um jovem rinoceronte-lanoso no permafrost siberiano, com uma protuberância gordurosa claramente visível, finalmente trouxe uma resposta: os artistas da Era Glacial estavam certos.
A múmia, descoberta em 2020 no Rio Tirekhtyakh, Yakutia, estava excepcionalmente preservada, permitindo um estudo detalhado. O jovem rinoceronte, com cerca de quatro anos, apresentava uma corcova de 13 centímetros composta de gordura branca, usada para armazenar energia e enfrentar o frio extremo.
A descoberta não apenas valida as representações feitas por humanos pré-históricos, mas também lança luz sobre as adaptações únicas dos rinocerontes-lanosos às condições extremas da Era Glacial.
Da mesma maneira como os camelos acumulam gordura em suas corcovas para sobreviver em ambientes áridos, acredita-se que a protuberância do rinoceronte-lanoso tenha desempenhado um papel crucial na termorregulação e no armazenamento de nutrientes, especialmente durante os longos e rigorosos invernos.
Essa característica anatômica inusitada também reforça uma comparação interessante com o rinoceronte-branco, seu parente distante e único rinoceronte moderno com uma corcova. Contudo, enquanto no rinoceronte-branco a protuberância é composta por músculos e ligamentos, a do rinoceronte-lanoso era um verdadeiro “estoque de energia”, mostrando que as duas espécies desenvolveram estruturas semelhantes de forma independente — aquilo que os cientistas chamam de homoplasia.
A precisão das pinturas rupestres ganha ainda mais destaque à luz dessa descoberta. As imagens da Caverna Chauvet, feitas há mais de 35.000 anos, capturam detalhes anatômicos com uma fidelidade impressionante, desafiando a ideia de que esses artistas da Pré-História “exageravam” em suas representações. Na verdade, suas obras parecem ser um testemunho direto do que observaram na natureza ao seu redor.
Porém, as pinturas não revelam a função exata e o porquê da permanência dessa corcova ao longo da vida dos rinocerontes-lanosos. Alguns pesquisadores acreditam que ela poderia ser uma característica transitória, presente apenas em jovens para ajudá-los a sobreviver ao frio antes de atingirem um tamanho corporal que permitisse reter calor de forma mais eficiente.
Outros cientistas, no entanto, apontam para as pinturas rupestres de animais adultos com corcovas, sugerindo que a estrutura era uma característica vitalícia. Também há perguntas sobre se o tamanho da protuberância variava com as estações ou com a disponibilidade de alimentos.
Apesar dessas questões em aberto, a descoberta marca um avanço significativo no estudo da megafauna da Era Glacial. A corcova do rinoceronte-lanoso agora se junta ao mamute-lanoso como mais uma adaptação singular que permitiu a esses gigantes sobreviverem a um dos climas mais extremos da história da Terra.
E, enquanto os cientistas continuam investigando, uma coisa é certa: nossos ancestrais paleolíticos não só eram artistas talentosos, mas também observadores incrivelmente atentos do mundo natural.