Gênio vs Gênio #2: o combate atômico entre Oppenheimer e Edward Teller

30/01/2018 às 07:307 min de leitura

O segundo episódio da série Gênio vs Gênio vai trazer um combate atômico entre dois grandes cientistas que terminou de maneira triste, com um deles exilado nas Ilhas Virgens e o outro praticamente excluído da comunidade científica por divergências no campo da física no qual trabalhavam e até estranhas motivações políticas.

A luta aconteceu no contexto da Segunda Guerra Mundial e, mais ainda, durante a Guerra Fria, quando a corrida atômica estava em seu auge e a paranoia do comunismo dominava a cabeça do mundo Ocidental. Os dois cientistas – provavelmente os seres humanos que mais contribuíram para o desenvolvimento de armas nucleares – bateram de frente no laboratório e o que aconteceu você confere a seguir.

Veja aqui a luta anteriorGênio vs Gênio #1: a rivalidade elétrica entre Thomas Edison e Nikola Tesla

Que começem os jogos! (ou "iiiiiit's tiiiiiime!!!")

aTALE OF THE TAPE

Robert Oppenheimer era o cientista chefe do Laboratório de Los Alamos no projeto Manhattan, que durou de 1942 e 1946 e culminou com a produção de bombas atômicas

No corner esquerdo, Julius Robert Oppenheimer, famoso por ser ninguém menos que o líder do projeto Manhattan, aquele que desenvolveu a bomba atômica durante a Segunda Guerra Mundial e que culminou nos ataques a Hiroshima e Nagasaki, no Japão. Considerado o pai da bomba atômica, Oppenheimer fez estudos cruciais para o avanço da fissão nuclear, o tipo de reação que permitiu ao ser humano dominar a energia nos átomos.

No corner direito, Edward Teller, húngaro de família judia que fugiu do nazismo na Europa para ajudar os Estados Unidos a acabar com a guerra desenvolvendo armamento nuclear. Seus estudos em fusão nuclear – ao contrário da fissão que acontece na bomba atômica – foram a base para a criação da bomba H, ou bomba de hidrogênio, que viria a ter um potencial de destruição muito maior que as anteriores.

aRobert Oppenheimer (à esquerda) e Edward Teller (à direita): os combatentes de hoje

Round 1: um objetivo, meios diferentes

Robert Oppenheimer era o cientista chefe do Laboratório de Los Alamos no projeto Manhattan, que durou de 1942 e 1946 e culminou com a produção de bombas atômicas, que funcionavam com a fissão do núcleo de átomos de urânio e tinham um poder de destruição devastador. Foram essas bombas que destruíram por completo as cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, já em 1946, quando o fronte de guerra na Europa já havia sido extinguido.

Cientistas alemães também trabalhavam dia e noite atrás de dominar o átomo e os norte-americanos arrendavam quem fosse possível para ajudá-los

Durante esse período, houve uma corrida nuclear, da qual participaram os países envolvidos na Segunda Guerra Mundial e tinha como objetivo desenvolver com sucesso esse tipo de armamento para “acabar de uma vez por todas com a Guerra”. Cientistas alemães também trabalhavam dia e noite atrás de dominar o átomo e os norte-americanos arrendavam quem fosse possível para ajudá-los na árdua tarefa.

Foi assim que Edward Teller foi parar nos Estados Unidos: vindo de família judia, ele emigrou para o Novo Mundo ainda nos anos 1930 e já fez parte desde o início do projeto Manhattan, em 1942, com a intenção de ajudar os Aliados contra o Eixo na Guerra Mundial. Oppeinheimer era o cientista sênior do projeto e, portanto, superior a Teller, e seus problemas começaram quando suas ideias científicas entraram em rota de colisão.

aOppenheimer realiza cálculos científicos no Laboratório de Los Alamos

Round 2: os filhos do átomo

Durante o período inicial em que trabalharam juntos, Oppenheimer e Teller não tiveram problemas. Casa fazia sua parte do trabalho e desenvolviam juntos as tecnologias que tornaram possível a criação da bomba atômica. As coisas começaram a sair dos trilhos quando Teller descobriu a possibilidade de fundir átomos, o oposto do que acontecia no trabalho do projeto Manhattan.

A diferença de massa entre os reagentes e os produtos aparecem na reação como uma emissão de energia ainda maior que no caso da fissão

Para ficar um pouco mais claro, fissão e fusão nuclear são reações contrárias que utilizam átomos e que desprendem uma quantidade absurda de energia, sendo possível utilizá-la para fins destrutivos, como no caso das bombas, ou mesmo para a geração de energia elétrica. Na fissão, um átomo, como o do Urânio, recebe um disparo de nêutrons em seu núcleo, que explode e emite tanto partículas radioativas como uma energia gigantesca.

Já no caso da fusão – a flor dos olhos de Teller – dois átomos são atirados um contra o outro (no caso, átomos de hidrogênio). Seus núcleos se fundem e resultam em um novo elemento – nesse caso, o hélio – e partículas subatômicas também são emitidas. A diferença de massa entre os reagentes e os produtos aparecem na reação como uma emissão de energia ainda maior que no caso da fissão nuclear.

aDepoimento de Teller retirou Oppenheimer de sua vida científica

Round 3: paixão pela fusão

O problema é que no momento em que Teller passou a estudar a fusão nuclear, ele perdeu completamente o interesse pelo desenvolvimento da bomba atômica, que usa fissão. O húngaro se afastou tanto do trabalho na bomba atômica que Oppenheimer o afastou da equipe principal do projeto, mesmo sem tê-lo removido totalmente do empreendimento.

Com a bomba finalmente pronta e todos os testes devidamente realizados no deserto dos Estados Unidos, a bomba atômica foi utilizada em civis no Japão após o final da primeira guerra. Enquanto isso, Teller trabalhava em uma bomba que usaria fusão nuclear e seria muito mais poderosa que sua antecessora.

Teller seguiu com seu projeto de fusão para criar a famigerada bomba H e acabou se tornando rival de Oppenheimer dado que o mesmo órgão patrocinava o projeto de ambos

Oppenheimer claramente percebeu que a bomba não era brincadeira e que tinha consequências aterrorizantes tanto para pessoas quanto para a natureza, desistindo de focar no desenvolvimento de armas e voltando-se para criar modelos menores de fissão atômica que poderiam ser benéficos para a humanidade, como a geração de energia elétrica, ainda sem saber que mesmo isso poderia ser danoso, ou de explosivos menores para o uso no mercado da construção.

Teller seguiu com seu projeto de fusão para criar a famigerada bomba H e acabou se tornando rival de Oppenheimer dado que o mesmo órgão patrocinava o projeto de ambos. Ninguém sabia o que daria mais certo em termos de recepção de financiamento: a bomba ainda maior e mais poderosa ou menores e mais focadas em tarefas construtivas?

aOppenheimer conversa com Albert Einstein

Round 4: acusação e traição

Foi nesse ponto crucial do combate que algo aconteceu e mudou completamente o rumo da história da ciência: Robert Oppenheimer foi formalmente acusado pelo governo norte-americano de ligação com o comunismo e teve todas as suas autorizações de segurança canceladas pela Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos. Ele necessitava dessas permissões para acessar o laboratório onde trabalhava e, obviamente, continuar tocando seus projetos.

Eu discordava completamente dele em inúmeras questões e suas ações, francamente, me pareceram confusas e complicadas

Impedido de trabalhar, Oppenheimer teria que ser submetido a um julgamento especial, que ficou conhecido como “audiência de segurança de Oppenheimer”, que aconteceu em 1954. A paranoia em torno das acusações sobre comunismo estava em seu auge, assim como a Guerra Fria, e o planeta tremia a cada declaração dos governos norte-americano e soviético.

Durante a audiência que decidiria se Oppenheimer realmente poderia ser um espião a mando da União Soviética (mesmo após anos e anos de trabalho a favor da ciência e dos Estados Unidos), diversas pessoas deram depoimentos e opinaram sobre as autorizações do cientista serem realmente canceladas ou se seriam devolvidas a ele.

aEdward Teller, já idoso, é recebido pelo presidente norte-americano Ronald Reagan na Casa Branca

Chegada a vez de Teller, o cientista deu uma declaração extremamente confusa que deixou a audiência se perguntando se ele estava aliviando para Oppenheimer de uma maneira meio duvidosa ou se tentava incriminá-lo de um jeito mais discreto. A resposta não ficou mais clara com seu voto para que o norte-americano não mais tivesse sua permissão de acesso especial.

O que Teller disse foi mais ou menos o seguinte: “Em um grande número de casos, vi o Dr. Oppenheimer agir – eu entendo que o Dr. Oppenheimer agiu – de uma maneira que, para mim, era extremamente difícil de entender. Eu discordava completamente dele em inúmeras questões e suas ações, francamente, me pareceram confusas e complicadas. Dessa maneira, sinto que gostaria de ver os interesses vitais deste país em mãos que eu compreenda melhor e, portanto, confie mais”.

aO hábito de fumar causou câncer de pulmão e matou Oppenheimer em seu exílio

Round 5: o fim dos gênios

Acho que vale afirmar que quem mais perdeu nessa luta foi a ciência. Ou talvez tenhamos nos livrado de alguém que pretendia levar a energia nuclear até as últimas consequências. Após o ocorrido na audiência, Oppenheimer se desiludiu completamente e exilou-se nas Ilhas Virgens. Ele abandou por completo o estudo científico que praticava para fazer parte de movimentos contra a proliferação de armas nucleares. Quem melhor que um próprio pai para conhecer o potencial negativo do filho?

O pai da bomba de hidrogênio – e esse sim, orgulhoso do título – não ligava muito para o potencial perigo que esse tipo de tecnologia representava para a natureza

Oppenheimer viveu seus últimos anos em uma casa simples na beira de uma das praias mais bonitas do mundo navegando com sua esposa e sua filha até morrer em 1967 em decorrência de um câncer de pulmão que adquiriu por seu hábito de fumar efusivamente. Ficou lembrado na história – para seu próprio desgosto – como o pai da bomba atômica, contra a qual lutou até o fim de sua vida.

Edward Teller ganhou uma reputação extremamente negativo por sua atitude na audiência de Oppenheimer e acabou sofrendo, também, uma espécie de exílio, mas este, acadêmico. Apesar de ter continuado na carreira e desenvolvendo suas pesquisas por algum tempo, o cientista era mal visto por seus colegas, muitos dos quais boicotavam seu trabalho e ignoravam seus estudos.

O pai da bomba de hidrogênio – e esse sim, orgulhoso do título – não ligava muito para o potencial perigo que esse tipo de tecnologia representava para a natureza. Ao contrário de Oppenheimer, ele queria usar sua criação para realizar tarefas que, hoje em dia, qualquer pessoa em sã consciência diria ser arriscado – como a criação de um porto artificial no Alasca que seria explodido com suas bombas. Imagine as consequências disso.

aTeller já nos últimos anos de sua vida: cientista morreu em 2003

Resultado final

No fim das contas, uma espécie de sabotagem científica para ganhar espaço, notoriedade e um pouco mais de dinheiro – para não dizer impor uma opinião “clubista” sobre um colega de laboratório – acabou levando Teller a acusar Oppenheimer de algo que muito provavelmente não era real e que acabou afundando a carreira não apenas de um, mas de ambos.

Ainda assim, muito do que eles criaram e descobriram é de importância sem tamanho para a humanidade, seja para se beneficiar com isso da melhor maneira possível, seja para evitar o que pode se tornar uma grande catástrofe para os homens e para a natureza.

Agora é a sua vez: quem você acha que ganha esse combate: Robert Oppenheimer, o o pai da bomba atômico e posterior inimigo delas, ou o criador da bomba H Edward Teller, que achava que sua fusão nuclear resolveria os problemas do mundo? Deixe sua opinião aí nos comentários!

Gênio vs Gênio #2: o combate atômico entre Oppenheimer e Edward Teller via TecMundo

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